Pauta Brasil: legados da Semana de 22 e tarefas para a geração atual
O programa Pauta Brasil desta sexta-feira (18) discutiu o Centenário da Semana de 22 e o Brasil de hoje. Com a participação do escritor e secretário de Cultura do Ceará, Fabiano dos Santos Piúba, e da atriz e vereadora de Salvador (BA) Maria Marighella, que falaram sobre as relações entre as atividades da Semana de Arte Moderna e o país que vivemos hoje, o programa foi mediado pelo historiador Márcio Tavares, que é Secretário Nacional de Cultura do PT.
Fabiano afirmou que a semana de 1922 lhe traz como reflexão muito mais do que o momento em si, que trouxe alguns legados importantes, como Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Anita Malfatti e Tarsila, uma linguagem diversa nas literatura artes visuais, com exposições de obras, recitais, mas também uma arte mais brasileira. Provocou outra maneira de fluir e sentir as artes, além de rupturas com o academicismo e formalismos. “Isso que ela nos ofertou são heranças importantes, experimentações estéticas e liberdades de temáticas, mais nacionalistas e que mostram o cotidiano brasileiro”, afirmou.
Disse ainda que o próprio Mario de Andrade fez a crítica ao afirmar que a geração dele era aristocrática e não captou bem a realidade brasileira naquele momento. “Isso é muito contundente, mas o que a semana traz como legado é o que reverberou depois, nas próprias obras dos modernistas. O que provocou e inspirou: poesia concreta, tropicalismo, Zé Celso, e que continua a reverberar”, disse.
Para ele, as ausências correspondem ao que o movimento não teve a capacidade de colocar devido a sua marca burguesa e aristocrática. “Nós temos essa tarefa de capturar a realidade e a diversidade brasileira nesse momento, particularmente a dimensão afro-indígena. Na perspectiva das políticas públicas, muitas vezes não conseguimos perceber a centralidade da cultura e da arte em nossas vidas. Ela tem uma função muito vital e orgânica de reencantamento do Brasil, que passa pelas artes e compreende uma ancestralidade, concluiu.
Segundo Marcio Tavares observou que o legado do modernismo foi muitas vezes deglutido, às vezes também indo da periferia pro centro. “João Gilberto deglutiu Villa Lobos e pariu uma bossa-nova, Caetano deglutiu o conjunto do que o Oswald propunha e pariu o tropicalismo. E, de alguma maneira, o PT foi deglutindo essa história e abriu espaço para o Gilberto Gil reconstituir as bases das políticas de cultura para o Brasil atual”, observou.
A vereadora Maria Marighella disse que aprendeu desde criança, por causa dos processos políticos e por ter ouvido de seu pai, Carlos Mariguella, que história sempre nos cobra por aquilo que não fizemos, já que os erros são próprios da trajetória. “Eu fico com aquilo que está por fazer. Foram muitas leituras e críticas, muito foi escrito e dito sobre a Semana, mas gosto de reconhecer o que fica como tarefa para as próximas gerações”, afirmou.
“Um aspecto que tenho tentado trazer para o centro do debate quando a gente fala que a Semana de Arte Moderna é que havia uma espécie de exortação da subestimação do país, uma supervalorização das coisas que havia ali enquanto outras eram ocultadas programadamente. Mas isso não está conta dos artistas e do movimento, eu coloco na conta de um projeto de concentração da atenção política e econômica que era decorrente de um projeto de nação. Disso vem sua feição sudestinizada”, pontuou.
Maria recordou que nos anos 2000 nos comprometemos com a descentralização, reorganização e desconcentração, com outros trânsitos, e nos abrimos para o desconhecido da cultura do ponto de vista das políticas públicas, e foi então que as instituições começam a se organizar de outro modo. “Estamos exatamente neste momento de tensão. Que Brasil é esse que precisamo revelar? Tenho provocado o sentido de que precisamos promover uma espécie de justiça, e verificar o fundo das feridas que atravessam o Brasil”.
Segundo ela, a cultura foi o meio pelo qual povos sistematicamente escravizados e vilipendiados puderam se afirmar no Brasil, e isso tem um valor inestimável. “Por isso nosso partido e as instituições precisam compreender a cultura além dos programas e orçamentos, com a empatia dos que querem transformar e têm compromisso com a justiça social. A gente precisa colocar a cultura nesse lugar do imenso, de fonte inesgotável de riqueza”, concluiu.
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