O governo Bolsonaro teria alguma chance de melhorar os indicadores econômicos de forma suficiente para ajudá-lo nas eleições futuras? No fundo, era essa a questão embutida no tema A Economia em Reviravolta, que guiou a edição da última quarta-feira do programa Pauta Brasil, produzido pela Fundação Perseu Abramo.

As análises dos economistas Ricardo Carneiro e Ligia Toneto, convidados do programa, asseveram que não. Isso não significa que Bolsonaro não esteja fazendo movimentos neste sentido, porém não serão suficientes e tampouco poderão suplantar escolhas econômicas feitas anteriormente, todas em sentido contrário ao crescimento.

Para Carneiro, professor do Instituto de Economia da Unicamp, a suspensão do pagamento de precatórios e a criação do Auxílio Brasil, tentativas de aquecer a economia por meio do que chamou “bondades” eleitorais, além de pouco para uma retomada consistente, vão esbarrar em obstáculos muito grandes, alguns criados pelo próprio governo.

“O governo percebeu que não controla a política de juros, por isso recorre à política fiscal”, afirmou Carneiro. “Por isso o Bolsonaro, e isso apareceu na imprensa, disse que se pudesse voltar atrás, não aprovaria a independência do Banco Central”. Esse arrependimento vem do fato de que o BC elevou fortemente a taxa básica de juros e sinaliza que continuará fazendo, com previsão de chegar a 8% até o final do ano.

“A inflação, que está em torno de 6% agora, cairá para 3% em 2022, mas a taxa de juros não, porque a sinalização do Banco Central gera expectativas no mercado. E o mercado internalizou também a ideia de risco fiscal, motivada pelas falas do presidente do banco – que fala sobre coisas que não deveria, como insistir no risco fiscal”, completou o economista.

Por isso, a tentativa de romper o teto oficial de gastos, disfarçadamente feita por intermédio da suspensão dos precatórios e o encaixe do Auxílio Brasil em seu lugar, além de provocarem reversão de expectativas no mercado, dificilmente passarão dessas duas manobras.

Há outras pedras no caminho das bondades eleitorais do presidente. O mercado de trabalho arrasado, sem previsão de reorganização no médio prazo, a desaceleração da China e dos Estados Unidos, causada especialmente pelo desequilíbrio das cadeias globais de insumos, o cada vez mais provável racionamento de energia causado pela crise hídrica e o fim do ciclo de crescimento da indústria nacional de construção civil residencial são algumas delas.

Sem falar na crise política e institucional. Um crescimento mais robusto que aumentasse a popularidade do presidente exigiria uma política fiscal mais expansionista, movida por mais gastos que furassem o teto. “E o Bolsonaro não tem credibilidade”, afirmou Ligia Toneto, economista pela USP e integrante do coletivo Desajuste, Economia Fora da Curva. “Ele tem dificuldades no pacto que fechou com o mercado e sua base ideológica não tem na economia seu principal ponto de interesse”, avaliou.

Para Carneiro, uma outra tentativa de Bolsonaro para ampliar os gastos pode se dar com a apresentação de uma peça orçamentária para o próximo ano que subestime a inflação. “Se romper o teto, eles vão usar o argumento de que isso ocorre porque a inflação não estava prevista, e assim vai rompendo o teto a conta-gotas. Mas isso vai gerar pouco crescimento. Arrebentar o teto ele não vai fazer, o mercado vai reagir”, previu.

Na opinião dele, o crescimento neste e no próximo ano atingirá entre 1,5% e 2%. Ele desacredita por completo a previsão de crescimento em torno de 5%. “Isso não existe. Os 3,5% que estão incluindo nesta conta aconteceram lá atrás”, explicou. E esse crescimento do PIB, além de duvidoso, não é sentido pela população, destacou Ligia: “A sensação térmica do PIB não é a mesma sensação térmica do povo”.

Ao final do programa, provocados pelo mediador Guilherme Mello, professor do Instituto de Economia da Unicamp e ex-aluno de Carneiro, os dois convidados apontaram quais as primeiras medidas que sugeririam a um futuro presidente Lula.

“A primeira medida diz respeito ao mercado de trabalho e emprego: frentes de trabalho, mobilização com sindicatos e municípios, porque a situação é muito grave. Programas de transferência de renda. O resto vai se vendo depois”, afirmou o economista. “A primeira medida seria o rompimento oficial e de fato do teto de gastos. A segunda medida seriam programas emergenciais de combate à fome”, disse Ligia.

Para assistir o debate, clique aqui.

 

`