O Observa BR da sexta-feira, 4 de dezembro, ouviu especialistas para iluminar os caminhos da possível segunda onda da Covid. Com um enfrentamento sem coordenação federal e problemas decorrentes do desmonte praticado desde o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, Aparecida Linhares Pimenta, médica sanitarista, doutora em Saúde Coletiva, secretária executiva do Conselho de Secretários de Saúde do Estado de São Paulo; Fábio Vilas Boas, secretário de Saúde do Estado da Bahia; e Wildo Navegantes de Araújo, médico veterinário, professor de epidemiologia da Universidade de Brasília (UnB), discutiram se o Brasil está entrando em uma segunda onda da Covid. A mediação foi de Vivian Farias, diretora da Fundação Perseu Abramo.

Wildo Araujo optou por abordar a segunda onda, que para ele tem maior magnitude do que a do começo do ano no Brasil, relembrando também que apesar da fortaleza e importância do SUS neste momento, poderá ter um efeito muito pior para o país.

“Os números agora estão muito altos, e no Brasil temos um problema gravíssimo de comunicação oficial. O meu receio é que não façamos lição de casa antiga e isso faça a gente cometer erros estratégicos importantes, como não dar suporte aos gestores, não estarmos discutido todas as vacinas possíveis, as salas de vacinas brasileiras que não têm condição de armazenar tanta vacina e a métrica que não pode ser financeira. Temos que definir políticas públicas mediadas pelos estados e municípios, e se não fossem eles estaríamos muito mal”.

Wildo lembrou que é trágico que o “Brasil perca milhões de testes laboratoriais, um fenômeno que mostra problemas na logística, na organização, no planejamento, mostrando as fragilidades para esta nova onda que já chegou ao Sul e Espírito Santo. Parece que esta nova onda vai recomeçar por outros estados”, alertou.

O secretário de Saúde da Bahia, Fabio Vilas-Boas, acredita que vivemos o maior problema de saúde pública do Brasil neste século e que “mesmo com suas dificuldades e assimetrias está se saindo muito melhor do que poderia estar se não tivéssemos o SUS”. Segundo ele, caso contrário, teríamos um desastre sanitário e o SUS sai mais fortalecido do que entrou. Apesar de uma gestão ministerial desastrosa. O ex-ministro Mandetta tentou passar a ideia de que era progressista mas foi a pior gestão possível para uma pandemia, relembrou Fábio.

A má gestão do Ministério da Saúde causou graves prejuízos. “Dificuldades de distribuir equipamentos, respiradores, ausência de testes, sistemas de informática, tudo falhou. Tivemos um apagão tecnológico no ministério e o começo da pandemia foi muito dificultado pela má gestão. Mas apesar disso, os governadores e prefeitos que se contrapuseram ao governo federal conseguiram limitar a taxa de letalidade dentro do país. Nossa taxa foi menor do que alguns países da Europa, fruto de ações descentralizadas, tomadas independes de uma coordenação do ministério da saúde”, contou Fabio, que acredita que entramos na segunda onda com uma taxa de letalidade baixa.

Para a médica Aparecida Linhares Pimenta, a pandemia foi um susto para os gestores municipais. “Em abril o epicentro foi em São Paulo, os municípios tentando dar conta do recado, aumento de óbitos e UTIs insuficientes. O que nos salvou foi a existência do SUS, porque esses trinta anos de construção deste sistema único tem papel de inclusão social, política capilarizada”.

Para ela, a “resposta seria melhor se o governo federal tivesse feito seu papel. Vamos enfrentar essa segunda onda com a mesma falta de coordenação nacional. Não há planejamento nem coordenação e caberá novamente aos estados e municípios fazer o enfrentamento sem contar um ente importante”.

Para o professor Wildo estamos vivendo um maremoto: “o que vivemos é muito maior do que uma onda. Não só na perspectiva de número de óbitos. Para ele, é preciso “aparelhagem, entrar pesado com atenção primária, rastreamento de contatos, valorização das experiências regionais, discutir protocolos com evidências científicas e novamente caberá aos estados e municípios tomar decisões com a pandemia em andamento. Temos uma agenda pesada que inclui também a pandemia”.

O enfrentamento nos municípios tem a diversidade como fator determinante, explicou Aparecida. “No caso de São Paulo há diferenças entre as respostas na capital e nas demais cidades do interior. É aí que entra o papel das secretarias municipais de saúde n construção das referências regionais e apoio técnico que o governo federal deveria estar dando e não deu. Aqui em São Paulo foi muito importante a ampliação da capacidade das unidades básicas de saúde e de pronto atendimento, ampliando serviços e lutando com a inexistência da ação do governo federal”, disse.

O panorama para 2021 é a continuidade da pandemia, com uma quantidade grande casos e óbitos. O manejo clínico está mais preparado, mas teremos a pandemia e toda a demanda de situações crônicas que os municípios foram obrigados a deixar para segundo plano e uma vacinação que será um dos maiores enfrentamentos da saúde pública brasileira, lembrando que ainda não temos um plano de vacinação federal.

A íntegra do programa pode ser assistido aqui.

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O programa é transmitido ao vivo nas noites de quarta e sexta-feira, às 21h, no canal da Fundação Perseu Abramo no YouTube, em sua página no Facebook e perfil no Twitter.