Já em 2017, o governo do golpista Michel Temer adotou medidas hostis contra a Venezuela ao promover a suspensão deste país como membro pleno do Mercosul. Pouco depois o Brasil integrou-se ao Grupo de Lima, que vem reunindo periodicamente vários países do hemisfério que questionam a legitimidade do governo de Nicolás Maduro, apesar de ele ter sido escolhido pela maioria dos eleitores venezuelanos.

O governo Bolsonaro, em coordenação com o governo dos Estados Unidos, ampliou essas hostilidades e provocações, inicialmente reconhecendo o presidente auto proclamado da Venezuela, Juan Guaidó, que atualmente ninguém leva a sério, pois perdeu até o respaldo de seus pares da direita no parlamento venezuelano. Depois foi a intenção de participar da intervenção direta que o Grupo de Lima, a Organização dos Estados Americanos (OEA), Colômbia e os EUA tentaram organizar por meio da criação de um suposto “corredor humanitário”, em março de 2019, que pretendia invadir a Venezuela para entregar alimentos e material hospitalar à população. A participação do Brasil dar-se-ia por meio do envio de duas camionetes com estes produtos.

As medidas mais recentes foram a remoção dos diplomatas e funcionários da embaixada e consulados brasileiros da Venezuela no mês de março de 2020 e o encerramento da embaixada no mês seguinte. A derradeira hostilidade veio agora, com a intimação feita pelo Itamaraty para que os 34 funcionários e diplomatas deixem o território brasileiro até o dia 2 de maio. Este pessoal está alocado na embaixada venezuelana em Brasília e nos consulados de Belém, Boa Vista, Manaus, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo.

Todas estas atitudes nada mais são que novos gestos de subserviência desses governos, Temer e, principalmente, Bolsonaro, à política externa dos EUA, que tem interesse no petróleo da Venezuela e nunca aceitou a política externa independente implementada na Venezuela desde a eleição de Hugo Chávez, pois antes os governos locais lhes eram mais fiéis. Não há um histórico de contenciosos relevantes entre Brasil e Venezuela que pudesse fundamentar a atual hostilidade gratuita contra um país vizinho e soberano. Uma segunda razão para esta atitude é a polarização dos bolsonaristas com a esquerda brasileira que, por sua vez, é solidária com a Venezuela e contra o bloqueio praticado pelos Estados Unidos e pelo Grupo de Lima.

Apesar das alegações que o atual regime venezuelano não seria democrático, o que não corresponde à realidade, isso não pode nortear a escolha de quais países nos relacionaremos, pois se isso fosse um critério válido teríamos que romper relações com a Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Catar, entre outros países do Golfo Pérsico, do Leste Europeu e de outras regiões. Cabe lembrar que um dos princípios da política externa brasileira que consta da Constituição é o respeito à autodeterminação dos povos e isso deveria ser aplicado nas nossas relações com a Venezuela.

Kjeld Jakobsen é consultor do Grupo de Análise da Conjuntura da Fundação Perseu Abramo. O texto não reflete necessariamente a posição da instituição.

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