O Coronavírus se alastra rapidamente pelo mundo. Estudiosos e estatísticas apontam que, na prática, milhões de pessoas já foram infectadas. No Brasil, no momento deste estudo, cerca de 10% das cidades brasileiras apresentaram oficialmente casos de contaminação pelo Covid-19. É também sabido que quanto antes as localidades se preparam para a possível chegada do vírus, melhor é o seu desempenho no combate a ele e menores são os números de óbitos decorrentes.

É importante salientar que este estudo não foca em indicar um possível caos na estrutura de atendimento de saúde das cidades ou fazer projeções do número de casos de contaminados. Para este fim já existem diversos outros estudos e projeções.

Índice de Vulnerabilidade

O Índice de Vulnerabilidade Municipal ao alastramento do Coronavírus (IVC) procura identificar o quão vulnerável cada município brasileiro está a um maior alastramento do surto. Para isso foram utilizadas dezoito distintas informações oficiais, o mais atualizadas possível, para os 5570 municípios brasileiros. Estas informações foram agregadas em cinco dimensões de vulnerabilidades: densidade demográfica, faixa etária, infraestrutura sanitária, saúde e mercado de trabalho.
Fazendo uso da mesma metodologia de cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), da Organização das Nações Unidas (ONU), onde os resultados mais próximos do valor 1 indicam as melhores condições e os mais próximos de 0 as piores, foram criados subíndices para cada dimensão que, por fim, geraram o índice síntese final, o IVC. Toda esta composição está mais detalhada na seção metodologia, ao final deste texto, assim como o link para download da planilha completa, inclusos os mapas.

Espacialização dos resultados
Os municípios destacados no Mapa 1 com a cor vermelha são os com maior risco de alastramento do contágio pelo Coronavírus no país. Além dos grandes centros urbanos, que contemplam menos de 10% das cidades brasileiras, muitos municípios do interior das regiões Norte e Nordeste, dos estados do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul e norte de Minas Gerais se destacam negativamente por também apresentar mais risco. No Nordeste, 46,4% dos municípios estão nesta faixa vermelha, ao passo que para a região Norte este número é de 33,6%. Nas demais regiões do país esta proporção é bem inferior, cerca de 13,7% no Sudeste, 11,8% no Sul e 3% no Centro-Oeste. No entanto, ainda existem outros 1.410 municípios, de perfil geográfico similar aos mais críticos, destacados na cor laranja, que também merecem grande atenção.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A sequência de mapas a seguir permite perceber quais fatores influenciam para a maior criticidade de alguns municípios e regiões.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Mapas dos subíndices de composição do IVC

O aspecto da densidade demográfica, que também contabiliza a proporção de moradores residentes em favelas, demonstra maior concentração na região Sudeste, em praticamente todo o litoral brasileiro e em algumas poucas cidades da região Norte do país.

Já o mapa que foca na população em faixa etária mais vulnerável ao Covid-19, demonstra maior concentração desta população em regiões sublitorâneas e que adentram o interior do país, sobretudo nas regiões Nordeste, Sudeste e Sul.
O mapa do subíndice de infraestrutura sanitária e elétrica mostra o grande risco que esta precariedade oferece principalmente às regiões Norte e Nordeste, mas também à região Centro-Oeste e interior da região Sul.

O subíndice de saúde apresenta o maior risco que este fator aufere principalmente às cidades das regiões Sul e Sudeste do país, mas também a algumas do interior das regiões Centro-Oeste e Nordeste.

O subíndice mercado de trabalho também acentua o risco que o mercado de trabalho informal e autônomo oferece às pessoas residentes predominantemente nos municípios das regiões Norte, Nordeste e em Minas Gerais.

As cidades mais vulneráveis
Pode-se observar no quadro 1 que o município de São João do Meriti, no Rio de Janeiro, com ICV de 0,437, é a cidade mais vulnerável ao alastramento do Coronavírus do país. Apesar de possuir subíndice de saúde da população e de infraestrutura sanitária acima da média brasileira, seus indicadores de alta densidade demográfica e de precárias condições no mercado de trabalho local a colocaram nesta situação de maior risco.

Quadro 1 – As 30 cidades com maior risco de alastramento de casos pelo Coronavírus (IVC)

Fonte: Elaboração Fundação Perseu Abramo a partir dos microdados do Datasus (2015-2019), RAIS (2018), Estimativa populacional IBGE (2015-2019) e Censo Demográfico/IBGE (2010).
Obs. Quanto mais próximo de 0, mais grave é a situação do indicador para o risco de alastramento do Covid-19.

Cidades de alto adensamento populacional como Taboão da Serra (SP), Carapicuíba (SP), Nilópolis (RJ), Diadema (SP) e Osasco (SP), de piores índices de exclusão social, como Ipixuna (AM), de melhores, como São Caetano do Sul (SP), ou ainda, por exemplo, a capital cearense, Fortaleza, devido à diferentes características de fragilidade captadas pelo IVC, também constam da lista das cidades mais vulneráveis do país ao alastramento do Coronavírus. Destas trinta cidades constantes do Quadro 1, sete são do Estado de São Paulo, cinco do Rio de Janeiro e do Amazonas, quatro do Ceará, três de Minas Gerais, duas do Pará e uma do Acre, Paraíba e Pernambuco.

No outro extremo do índice, a pequena cidade de Gavião Peixoto, em São Paulo, apresenta o melhor ICV do país, se destacando positivamente, neste aspecto do risco ao Coronavírus, em todos os índices. Outras cidades mais conhecidas como Rio Quente (GO), Fernando de Noronha (PE), Holambra (SP), Jaguariúna (SP) e Confins (MG) possuem melhores condições para evitar o alastramento da Covid-19, caso os procedimentos recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) sejam seguidos.

Independentemente da posição no ranking do índice síntese ICV, e respeitando o conhecimento local acumulado em cada cidade, a análise destes indicadores em separado também permite identificar fragilidades e efetuar uma estratégia de ação adequada e específica de combate à propagação do coronavírus. Vale também prestar atenção ao fato de que mesmo que uma cidade possua um bom ICV, a não adoção de medidas protetivas ao vírus, ou ainda de forma tardia, aumenta naturalmente a probabilidade de que a Covid-19 se espalhe.

Metodologia
O IVC buscou abranger, de acordo com informações municipais oficiais disponíveis, diferentes aspectos que demonstrassem a vulnerabilidade da população de um município ao alastramento do vírus Covid-19. Para cada informação foram utilizados os dados mais recentes disponíveis, que variaram temporalmente de 2019 para dados de saúde a 2010 para dados originários do último Censo Demográfico do IBGE. Em virtude da defasagem temporal desta última fonte, optou-se por extrair-se dela apenas dados estruturais, que se modificam lentamente ao longo dos anos, como infraestrutura sanitária e estrutura etária/familiar da população, ou ainda levantamentos raros de abrangência nacional, como as moradias em favelas, captadas por esta fonte no perfil de uma informação proxy dos setores de aglomerados subnormais.

Isto posto, e em complemento à listagem de variáveis constantes do Quadro 2, cabe ressaltar sucintamente algumas informações sobre cada dimensão:

Para este estudo, a dimensão “Densidade demográfica” foi considerada como a maior propiciadora de um eventual alastramento da Covid-19. Em consequência ela recebeu um peso (3) no cálculo final do índice maior do que as demais dimensões (peso 1). Nela, buscou-se também mensurar a proporção da população municipal residente em favelas, com o entendimento de que o seu maior adensamento populacional e condições precárias de infraestrutura sanitária, habitacional e de inserção no mercado de trabalho, uma vez contando com poucos casos de pessoas contaminadas por este vírus, já oferecem terreno fértil para o alastramento desta doença.

Devido ao fato de que quanto mais idosa a pessoa é, maior é incidência de contágio manifestado, além da maior taxa de mortalidade, a dimensão faixa etária dividiu este público em dois grupos, os de 60 a 79 anos e os com 80 anos ou mais. Este último grupo é muito numeroso em muitos municípios das regiões Sul e Sudeste e em pequenas cidades do país. Além disso, foram mensurados os idosos que residem na mesma moradia que crianças e adolescentes em idade escolar.

A partir da ciência de que a falta de higiene é um dos principais disseminadores da doença, e de que uma precária infraestrutura sanitária dificulta esta primeira ação, a dimensão homônima buscou contabilizar esta precariedade.
O aspecto da saúde da população de uma cidade também demonstra o maior risco de alastramento e letalidade deste vírus. Desta forma mensurou-se o número de internações de saúde para doenças pré-existentes agravantes da Covid-19 nos últimos cinco anos (2015 a 2019) para cada cidade. Devido à baixa incidência de casos de tuberculose, especialmente em municípios pequenos, optou-se por contabilizar, para este aspecto, o número efetivo de casos contabilizados, este mais numeroso.

A natural demanda de sustento econômico é o fator que mais dificulta o cumprimento de medidas restritivas, como a quarentena, por exemplo, para pessoas de baixa renda ou que desempenham atividades informais ou por conta própria. Como não há informação municipal recente sobre a informalidade para todos os municípios brasileiros, optou-se aqui, por mensurar os municípios com menor proporção de trabalhadores formais frente à sua população, e sua respectiva renda, no mercado de trabalho de cada uma das cidades, com base nos registros da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2018 da Secretaria do Trabalho do Ministério da Economia.

Quadro 2 – Composição do Índice de Vulnerabilidade Municipal ao Alastramento do Coronavírus (IVC)

Fonte: Elaboração Fundação Perseu Abramo.

A padronização dos dezoito indicadores dessas cinco dimensões em índices foi elaborada por meio da técnica desenvolvida por Amartya Sen e aplicada no cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), que transforma os indicadores em variáveis contínuas com variação entre zero e um. Assim, optou-se em aplicar para todas as variáveis investigadas a seguinte fórmula: Xi,p = ((Xi – MIN(Xi)) / (MAX(Xi) – MIN(Xi)))
Onde:
X: é valor do indicador utilizado no cálculo
i: identifica a unidade de análise (municípios)
p: identifica qual indicador está em estudo
MIN(X): valor mínimo encontrado na distribuição do indicador
MAX (X): valor máximo encontrado na distribuição do indicador
O download da planilha com o ranking municipal do IVC, seus subíndices e mapas pode ser realizado no seguinte link: https://bit.ly/34kcedC

 

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