Marilena Chauí está determinada a não fugir do tema. Ou, nas palavras da própria filósofa, convidada desta segunda (12) para a série de debates preparatórios ao 7º Congresso Nacional do PT “a não abrir parênteses” durante a sua análise sobre democracia, neoliberalismo e a onda de extrema-direita que volta ao cenário político global com a força motriz da opressão e submissa aos interesses do mercado.

Não demorou, no entanto, mais que um punhado de minutos para que uma das vozes mais altivas e práticas da academia negligenciasse a sua própria promessa durante o evento realizado na Fundação Perseu Abramo em São Paulo. “É difícil falar de tudo o que está acontecendo sem ter de abrir novos temas, sem ampliar a discussão para outros caminhos “, desculpou-se, tão logo passou a explicar as razões que fazem do desgoverno Bolsonaro um exemplo claro do que acontece de maneira preocupante em várias partes do mundo.

“O neoliberalismo não é apenas uma mutação histórica do capitalismo. Ele é a nova forma do totalitarismo. Nós estamos acostumados a encarar o totalitarismo na figura de um líder de massas, o autocrata. Eles desapareceram. O discurso do ódio agora está sob controle do próprio sistema que rege esses governos (…) A eficácia desse novo totalitarismo é a sua invisibilidade”, explica.

Mas e a figura odiosa, anti-intelectualizada, subserviente e regida por conservadorismo extremo e combate a ideais humanitários do atual mandatário da República não seria exatamente a figura do autocrata? Para Marilena, o ex-deputado e representante máximo da velha política é apenas o fantoche de uma dominação muito maior, que tem como líder supremo o mercado.

“Não foi de repente que a extrema direita chegou ao poder. Donald Trump (EUA), Viktor Orbán (Hungria), Recep Erdogan (Turquia) e Bolsonaro governam pelo medo, fazem ameaças e oferecem proteção. Eles operam sem mediação institucional, eles colocam em dúvida os poderes e transformam todos os adversários como corruptos. Querem promover uma profunda limpeza ideológica, social e política, sempre recorrendo a teorias da conspiração de esquerda”, ilustra.

A fala serena e cativante só muda de tom quando (em mais um parêntese feito ao tema inicial) discorre sobre a aberração instituída em forma de governo que chegou ao poder no Brasil. “Quando um chanceler diz que não existe aquecimento global porque esteve em Roma e não sentiu frio, o que a gente faz?”, critica, com risos nervosos, tentando buscar uma resposta nos cânones do pensamento mundial algo que ao menos dê uma luz para o caminho de trevas trilhado pelo Brasil de Bolsonaro.
A nova classe trabalhadora

A conversa mudou de rumo quando o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino levantou a seguinte questão: como a esquerda deve lidar com estes novos rumos de opressão e autoritarismo conduzidos pela política neoliberal de Bolsonaro? Eis a resposta: “Uma política socialista precisa encontrar onde está a nova classe trabalhadora, quais são os seus anseios, o que move os seus sonhos (…) É nesse quadro que o PT tem a obrigação de compreender as operações imperialistas. Estamos focando muito nas empresas estatais. Não dá para falar em soberania nacional sem entender os novos rumos do imperialismo”.

Além de entender de fato o que está acontecendo é preciso que os partidos do campo progressista, sobretudo o PT, voltem para as bases e expliquem o que significa a prisão política de Lula. “ Lula livre não basta. Temos que estar nas ruas para dizer o que significa ele preso. Foi feito um trabalho, uma lavagem cerebral totalitária para manchar a imagem de Lula. Não temos apenas que dizer que ele tem de estar livre. Temos que explicar por que ele está preso!”, reitera.

O ex-ministro Luiz Dulci, incumbido de intermediar o debate, é certeiro ao resumir o que significa a prisão política de Lula: “Não dá para falar em democracia plena com Lula preso injustamente. É isso o que precisamos deixar claro para as pessoas”.

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