Lançamento de manifesto pela democracia vira ato de resistência
Um grande ato contra o autoritarismo que ameaça novamente o Brasil marcou ontem (13/12) o lançamento do manifesto em defesa da democracia, realizado no dia em que se completaram cinquenta anos da edição do Ato Institucional nº 5, quando o governo militar fechou o Congresso e suspendeu as garantias constitucionais.
Dezenas de intelectuais, artistas, lideranças populares, empresários e profissionais de diferentes áreas que assinaram o documento lotaram o auditório da Faculdade de Direto da USP, no Largo São Francisco. O ato começou com um minuto de silêncio em homenagem a Eunice Paiva, a viúva de Rubens Paiva que foi símbolo da luta contra a ditadura e faleceu ontem, aos mortos e desaparecidos naquele período, a jovens negros e negras vítimas da violência cotidiana e a Mestre Moa e Marielle Franco, também mortos neste ano em decorrência da intolerância que causa grande apreensão aos defensores das liberdades democráticas.
Durante o evento, grande parte dos oradores falou sobre a importância de libertar o ex-presidente Lula para sair do Estado de exceção instaurado com o golpe de 2016 e defendeu a formação de uma frente de resistência aos retrocessos sociais e políticos que têm ocorrido desde então. O anfitrião, vice-diretor da faculdade, Celso Fernandades Campilongo, disse que devemos valorizar atos de repúdio ao autoritarismo em um país como o nosso, “onde se celebram torturadores”.
O jurista Fábio Konder Comparato disse que quando eleito para o Conselho da Ordem dos Advogados do Brasil, em 2008, propôs à OAB que ingressasse contra a Lei de Anistia, pois o país era e continua a ser até hoje o único da América Latina que não julgou nem puniu os torturadores. Segundo ele, a Lei da Anistia não deveria ser aplicada a órgãos públicos que praticaram tortura, sequestro, assassinato e ocultação de cadáver. ‘Espero que os jovens retomem esta luta em respeito à dignidadade”, afirmou.
A psicanalista Maria Rita Kehl, integrante da Comissão da Verdade, disse que o Brasil foi o único país a anistiar os dois lados e isso estimulou uma crença de que ambos cometeram crimes, o que é muito grave. “Não eram dois lados em uma luta, dessa maneira simples. Era um lado que era o Estado, que deveria proteger o cidadão, mesmo sob custódia, respeitando os seus direitos. Do outro, pessoas lutando contra um regime ilegítimo e autoritário. O Estado brasileiro deveria ter respeitado os direitos dos presos políticos, ainda que em regime de exceção”.
O representante do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra e da Frente Brasil Popular, João Paulo Rodrigues, dedicou sua fala aos dois militantes do MST assassinados na Paraíba no início desta semana. “Esta oportunidade é importante pra refletirmos sobre cinquenta anos atrás e também sobre como nossa geração ajudará a defender os direitos dos trabalhadores e do povo. Cabe a nós, lutadores, construir alianças para fazer a resistência e proteger a democracia, a livre organização sindical e lutar por Lula Livre”, disse.
A secretária de Direitos Humanos da CUT, Jandira Uehara, afirmou que até hoje o AI-5 contamina o sistema de Justiça e a segurança pública. Por esse motivo ambos baseiam-se na repressão e violência. “Tortura ainda é prática cotidiana nos aparatos policiais e a cultura de extermínio tem levado ao assassinato de várias lideranças populares”.
A presidenta do Centro Acadêmico XI de Agosto, Laura Arantes Quintino dos Santos, destacou que a atual direção foi eleita para fazer da São Francisco uma trincheira na luta democrática. E Carmem Silva, da Frente de Luta por Moradia, destacou que ter democracia significa também que cada pessoa tenha onde morar.