“Temos de demonstrar a importância do nosso campo político. Fazemos uma política que cuida das pessoas”, sintetizou Txema Guijarro, o representante do Podemos, da Espanha, durante debate sobre as respostas que os setores democráticos e progressistas podem e devem dar à escalada da extrema direita e do autoritarismo.

Para Isabel Moreira, deputada do Partido Socialista de Portugal, isso significaria a reconstrução de direitos sociais que foram ou serão derrubados por governos conservadores e de extrema-direita. Citando o exemplo da coalizão progressista de que faz parte, a deputada destacou bandeiras programáticas lá adotadas: “Subida do salário mínimo, direito a férias, retomar o direito das mulheres a interromper gravidez”. Logo em seguida, Isabel frisou que a garantia pública do amplo direito ao aborto foi o “projeto número um” da frente que governa Portugal.

Na opinião do uruguaio Javier Miranda, que também participou do debate As Respostas Democráticas e Progressistas, realizado na tarde desta segunda, 10 de dezembro, como parte da Conferência Internacional em Defesa da Democracia, esses direitos são, em essência, os valores da família: “O tema família é um tema nosso: que futuro queremos para nossos filhos? Um futuro com trabalho, com educação, saúde”, disse ele, em provocação à pauta conservadora adotada pela campanha eleitoral que levou Bolsonaro à Presidência.

Até mesmo nas propostas conservadoras ditas nacionalistas, os democratas e progressistas têm na defesa do bem-estar do povo e do país as melhores respostas e ação. Segundo Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores do governo Lula e um dos debatedores, “aqui o nacionalismo da extrema-direita é o das bandeiras, dos hinos”. Tomando como exemplo as privatizações, criticou: “Não vou falar nem dos direitos do povo, mas dos interesses do próprio empresariado. Aqui privatização é desnacionalização. Não há nenhum empresário brasileiro disposto comprar o patrimônio púbico – talvez queiram comprar o bondinho do Pão de Açúcar. Nem no governo FHC houve disposição para a desnacionalização como o anunciado neste governo”.

Forma e conteúdo
Se não há dúvidas quanto às bandeiras a se defender como contraponto ao avanço autoritário e conservador, a forma de dialogar com a sociedade ainda traz sobressaltos, em função do discurso mitificador usado pelo bloco que venceu a eleição presidencial.

Para além das novas ferramentas tecnológicas que tiveram grande influência no resultado, os debatedores criticaram a ausência de racionalidade no discurso autoritário.

“O espantoso é a vulnerabilidade das pessoas às fakenews. Isso é preciso entender, não para fazer o mesmo, mas temos de entender. Esse discurso se dirige somente à emoção. O conservadorismo tradicional recorre à razão, então a luta era contrapor um argumento a outro. Agora não é mais concordar ou não, e sim acreditar ou não acreditar. Há uma regressão ao argumento da autoridade, que não é necessariamente quem está no governo. Pode ser o tio, o líder religioso”, comentou Amorim.

Na opinião do ex-ministro, a defesa da democracia pode ser um contraponto a esse método de comunicação baseado na palavra da autoridade tão somente. “O argumento racional é intrínseco à democracia”, disse.

Para a deputada portuguesa Isabel Moreira, a esquerda não deve se constranger na defesa da chamada pauta identitária, e sim explicitá-la. Segundo ela, temas como os direitos dos LGBT’s e dos negros foram amplamente divulgados na campanha eleitoral que levou a coalizão progressista ao poder naquele país, e o esforço para cumprir essa agenda, um fator essencial para a boa aceitação popular ao governo.

Outro ponto foi colocar as diferenças de lado para poder dizer explicitamente à sociedade o que pretendiam fazer. “A esquerda sentou-se à mesa e disse: temos de esquecer nossas diferenças e lutar contra essa política punitiva aos pobres. Tínhamos como meta acabar com aquela austeridade e pusemos em curso a agenda progressista”.

Javier Miranda apontou a “irracionalidade, a apelação, a simplificação, que criam falsos deuses que transmitem segurança. O que há é uma população que vive seus medos e incertezas e que talvez a gente não tenha conseguido dialogar”. Para ele, a esquerda e os democratas em geral não devem temer assuntos para os quais têm propostas, como a área de segurança pública e o combate à corrupção. “Não se pode deixar que a direita monopolize esses temas”.

Por fim, o uruguaio disse que a defesa da democracia deve ser feita em todas as suas dimensões. “Não há liberdade com o estômago roncando. Não há direitos políticos sem alimentação e sem educação política”. Para além do discurso, ele relembrou práticas que não podem jamais ser deixadas de lado. “Reafirmar nossos princípios é adotar uma postura que nos faz agir com honestidade e humildade, com autocrítica. Estrategicamente, a unidade é um princípio. Brigamos muito, mas conseguimos construir unidade. Brigamos porque somos movidos a paixão”, disse o representante da Frente Única, coalizão de partidos e movimentos que completa quase cinquenta anos e que governa o Uruguai desde 2005.