Por Jaime Cabral*

A pesquisa de Márcio Galvão que dá origem ao livro Sim, Senhor! Não, Senhor!: Discutindo o Relacionamento Social Militar procura compreender o Regulamento de Continências, Honras, Sinais de Respeito e Cerimonial Militar das Forças Armadas (R-CONT), que também é aplicado às polícias militares de todo o Brasil. Amparado pelas contribuições de Norbert Elias, principalmente constantes da obra O processo civilizador, Márcio Galvão analisa como determinados rituais de etiquetas, próprios da vida cortesã, foram reproduzidos nos regulamentos militares. Atuando há mais de vinte anos na Polícia Militar de Minas Gerais, o autor conta com ponto de vista privilegiado para tratar da temática.

Proporciona ao leitor externo à corporação conhecimentos sobre aspectos internos insuspeitos, especialmente de diferenciação entre o ser policial e o ser militar. A diferença se dá entre aqueles policiais que participam de atividades de policiamento ostensivo e os que exercem atividades administrativas. Assim, enquanto o policial que está nas “ruas” possui uma preocupação menor com os rituais de continência e com o cerimonial militar, pois está efetuando prisões, correndo riscos e executando outras atividades nas quais o poder de polícia é evidenciado, os policiais dos setores administrativos são “militares”, no sentido de que estão mais vinculados aos regulamentos e valores institucionais, envolvidos com burocracias estatais e com questões políticas e, o que é visto de forma negativa, fiscalizam a atividade dos “verdadeiros policiais”.

Outro elemento interessante na obra de Márcio Galvão é o questionamento sobre os códigos e rituais do R-CONT. No capítulo “R-cont: ritos de convivência ou de subordinação?”, partindo da ótica dos próprios militares, o autor demostra o dia a dia no interior dos quartéis, identificando que na prática do cotidiano os rituais e regulamentos são cumpridos de formas diferentes entre subordinados e superiores. Nesse capítulo, narra alguns fatos que ilustram bem como os ritos de convivência são utilizados para reforçar o poder do superior hierárquico.

Num momento da conjuntura em que parte da população está cansada da criminalidade e acha que o armamento civil é a solução, no qual também cresce o apelo por saídas antidemocráticas, o livro de Márcio Galvão joga luz sobre a possibilidade de transformação da própria estrutura militar, com participação democrática, onde exista diálogo e troca de conhecimentos.

* Jaime Cabral é Analista de Difusão do Conhecimento no Centro Sérgio Buarque de Holanda da Fundação Perseu Abramo.

Livro: Sim, Senhor! Não, Senhor!: Discutindo o Relacionamento Social Militar

Autor: Márcio Galvão

Curitiba: Editora Appris, 2016. 169 p.

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