Na ditadura de 64, cassaram o direito de falar. Na ditadura de 2016, cassaram o dever de ouvir.  O dia do julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula no Supremo Tribunal Federal  será marcado como um daqueles em que mais uma vez interromperam a frágil democracia brasileira.

Como se não bastasse o golpe, a retirada de uma presidenta legitimamente eleita do poder, agora cassam o direito de liberdade do principal candidato para as próximas eleições. Em qualquer circunstância, em qualquer democracia do mundo, a frase acima seria tida como um absurdo, uma lesão à democracia.

Dessa vez, aqui no Brasil, não é. Primeiro porque as pessoas que discordam das palavras desse texto nem sequer saberão da sua existência. E se souberem da sua existência não lerão. E, se lerem, não entenderão. E, se entenderem, vão agredir de alguma forma seu escritor e o canal que o transmite.

Porque essa ditadura não é aquela que cala. É aquela que ensurdece. Muito mais eficiente, diga-se de passagem. As democracias não pressupõem apenas o direito de se expressar, mas elas impõem a necessidade do diálogo, dos pactos sociais, dos consensos. E em qualquer noção básica de comunicação, o diálogo necessita de um emissor, um receptor e um canal.

Se antes impediam o emissor, agora bloqueiam o canal. E não há diálogo. Seja entre classes sociais, seja entre instituições, seja entre as mídias. Aquelas, que deveriam por dever de ofício ser as principais defensoras dessa singela definição mãe da comunicação.}

Bloquearam o canal da mídia. Bloquearam o canal dos governos. Agora bloquearam o canal do povo. Lula é a única força popular capaz de constituir um canal para o povo. Prender Lula significa inviabilizar qualquer construção social que tenha povo em sua essência.

O próximo canal a bloquearem é o voto. A menos que o voto diga, por qualquer meio necessário justificado pelo fim puro do interesse da elite do atraso, aquilo que queiram ouvir. As democracias pressupõem, portanto, que as pessoas, as classes, e as instituições, têm o dever de ouvir, principalmente aquilo que não querem, sem represálias ou violências.

Numa nação de uma elite tacanha, mimada e birrenta, cassaram o dever de ouvir. E agora punem, com prisão e morte, aqueles que escolhem músicas diferentes de quem paga a banda.

Não nos enganemos, em alguma medida, ontem, ensurdecemos.

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