Por Victor Baez Mosqueira, Secretário Geral da Confederação Sindical das Américas (CSA) 

Essa semana, algumas das pessoas mais ricas e poderosas do mundo viajaram para a pitoresca cidade de Davos para o Fórum Econômico Mundial (FEM) desse ano. O foco dessa edição é “criando um futuro compartilhado em um mundo fraturado”.

Como tudo começou?
Em 1971 o alemão Klaus Schwab organizou o primeiro encontro do FEM nos Alpes Suíços, perto de onde Thomas Mann ambientou sua obra prima A Montanha Mágica, de 1924, em uma Europa doente em um ambiente rarefeito a caminho da Primeira Guerra Mundial. O trabalho de Schwab se ambientou nos anos 1970, seus personagens são CEOs* de grandes corporações e suas motivações são a expansão de seus negócios.

Desde então o Fórum se desenvolveu como um lugar para os CEOs discutirem seus planos futuros com os líderes mundiais. Sua origem coincide com o desmoronamento da ordem mundial estabelecida ao fim da Segunda Guerra Mundial, quando os Estados Unidos abandonaram o padrão fixo dólar-ouro e as políticas econômicas keynesianas falharam em combater a “estagflação” (estagnação combinada com inflação).

Naquele momento, o neoliberalismo estava en vogue e a liberalização dos fluxos de capital e comércio eram professados como dogmas para a boa governança global. Schwab acreditava que empresas eram a chave para o progresso e ele desejava fomentar uma atmosfera de confiança entre governos e investidores.

Os apoiadores do Fórum acreditavam que a economia era importante demais para deixar a mercê dos caprichos das democracias. Políticos decidiram que, nas palavras de Margaret Thatcher, “não (havia) alternativa” para as regras financeiras determinadas pelos investidores.

A influência que apenas o dinheiro pode comprar
Um grupo de instituições não-eleitas – incluindo bancos centrais independentes, o Fundo Monetário Internacional, agências de classificação de risco de crédito e a Organização Mundial do Comércio – iriam agora cuidar das nossas políticas econômicas.

De pessoas comuns que trabalham para pagar suas despesas cotidianas, e exercer seu poder político na urna, agora era esperado que acreditassem que os problemas econômicos derivavam de fatores que não estavam ao alcance do controle democrático.

E os homens de terno em Davos atingiram esse objetivo. CEOs começaram a governar de acordo com o humor dos seus investidores. Mesmo o colapso da empresa de gestão de hedge fund Long Term Capital Management (LTCM) em 1998 não abalou em nada seus poderes.

LCTM era dirigida por Robert C. Merton (Harvard) e Myron S. Scholes (Stanford), que haviam ganhado o Prêmio Nobel da Economia no ano anterior pelos seus modelos econométricos que verificavam a “racionalidade” do sistema financeiro de derivativos.

Poderia haver um exemplo mais adequado para a força imparável do capitalismo, quando a LTCM foi à falência e quase mergulhou o mundo em uma crise global? Merton e Scholes nem ao menos tiveram a decência de devolver o Prêmio e Davos não fez nada para parar a febre ideológica que prevaleceu… até a crise financeira de 2007/2008.

Realidade alternativa
Desde 1999 pessoas comuns têm se reunido em frente aos portões do FEM para protestar contra tudo que esse encontro representa. Esse é o outro lado de Davos.

Em 2001, céticos organizaram um encontro separado na cidade brasileira de Porto Alegre – o Fórum Social Mundial – para discutir alternativas ao tipo de capitalismo promovido por Davos. A resposta do FEM foi convidar representantes dos movimentos alter-globalização para suas discussões.

Políticos democraticamente eleitos também compareceram a encontros do Fórum Econômico Mundial, incluindo o presidente Lula da Silva, do Brasil, em 2003.

Então, o que fez Davos com as propostas de Lula para limitar o livre movimento de capitais, eliminar os paraísos fiscais e criar um fundo global para combater a pobreza? Nada. O problema com Davos é o mesmo desde 1971: quer que as empresas dirijam a sociedade e controlem as decisões políticas.

O FEM carrega parte da responsabilidade por criar o “mundo fraturado” do qual ele tanto teme. Ele espera que o mundo entre na linha com as falsas “expectativas racionais” dos CEOs e corporações sob a pretensão que “não há alternativa”.

Ascensão da extrema-direita
Mas Donald Trump, Brexit, a ascensão da extrema-direita na Europa e em outros lugares do mundo e o aumento da turbulência geopolítica sugerem que os remédios do FEM são ineficazes.

Políticos autoritários estão ganhando terreno. Eles se alimentam do medo de imigrantes, países estrangeiros e dos pobres. Porém, o crescimento da extrema-direita é, na verdade, resultado da ideologia perversa abraçada pelos empresários e políticos que agora querem ignorar o que criaram.

Como o Prêmio Nobel da Economia Joseph Stiglitz disse, a agenda da globalização “foi formulada atrás de portas fechadas, por corporações. Foi uma agenda escrita por, e para, grandes corporações multinacionais, às custas dos trabalhadores e cidadãos comuns de toda parte”.
Foram os trabalhadores que sofreram desde o início. Sindicatos têm uma forma simples e direta para consertar o “mundo fraturado” descrito pela panelinha de Davos. Nós temos que reestruturar a vida política e econômica, sob a orientação da inclusão social e convivência.

Mas isso só pode ser alcançado em uma democracia se nós reconquistarmos a soberania sobre a economia. E isto depende de sociedades elegendo democraticamente quais instituições multilaterais deveriam definir as regras do jogo global. O primeiro desafio é abrir a “caixa-preta” de uma economia dominada por finanças descontroladas, geridas pela turma dos CEOs de Davos. Podemos colocar isso na agenda do Fórum Econômico Mundial?

*CEO é a pessoa com maior autoridade na hierarquia operacional de uma organização. É o responsável pelas estratégias e pela visão da empresa.

Versão traduzida por Iuri Codas deste site

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