O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra da Silva Martins Filho, em entrevista publicada no dia 6 de novembro pelo jornal Folha de São Paulo, defende a Reforma Trabalhista, que entra em vigor no dia 11 próximo.

O jurista defende, em geral, o ponto de vista dos empregadores de poderem dispor da força de trabalho a custos diretos e indiretos mais baixos, em detrimento dos trabalhadores. Em primeiro lugar, defende que a Reforma prestigia a negociação coletiva, mas não aponta que a mesma enfraquece bruscamente uma das partes fundamentais para a negociação coletiva, qual seja, os sindicatos. Também defende que a Reforma traria segurança jurídica, mas não discute que, além de ilegítima, ela foi realizada a toque de caixa e sem discussão pública, o que a faz repleta de incongruências que deverão ser resolvidas agora pelos magistrados do trabalho encarregados de interpretar e aplicar a lei.

Ao contrário da frase que foi escolhida como título da entrevista (“É preciso flexibilizar direitos sociais para haver emprego”), diversos estudos mostram que o que gera emprego segundo a experiência internacional é crescimento econômico e não flexibilização: não há correlação positiva entre a adoção de reformas que reduzam direitos e a redução do desemprego. Pelo contrário, há estudos que mostram que a redução de direitos em momento de crise leva, no curto prazo, ao aumento do desemprego. O jurista também esquece que o Brasil passou por um momento de quase pleno emprego – momento esse revertido com a adoção do ajuste fiscal em 2015 – com as mesmas leis que, anos depois, viriam a dizer que impediam a geração de postos de trabalho. Em outras palavras, não houve nos anos 2000 – período de grandes melhorias no mercado de trabalho – redução significativa de direitos sociais e trabalhistas que apoiem o argumento do presidente do TST de que seria necessário cortar direitos sociais para gerar empregos.

Ives Gandra Filho ainda afirma que “se você passa cinquenta anos crescendo salário e direito, termina ganhando R$ 50 mil por jornada de cinco horas. Não há empresa ou país que suporte”. Tal afirmação dá a entender que estaríamos próximos dessa realidade no Brasil. Mas segundo os últimos dados da Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar Contínua, no trimestre abril-maio-junho de 2017, o rendimento real habitual do trabalhador brasileiro foi de R$ 2.115, bastante distante dos tais R$ 50 mil (talvez menos incomuns no Judiciário). Por outro lado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 77% dos trabalhadores brasileiros tinham jornada semanal de quarenta horas semanais ou mais em 2016, também muito distante da jornada de cinco horas caracterizada pelo presidente do TST.

O presidente do TST cita ainda como exemplo positivo a Espanha, país que realizou uma profunda reforma no mercado de trabalho após a crise de 2008, pressionada pelo Banco Central Europeu (BCE) e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Recentemente, Mario Draghi, do BCE, declarou que a precariedade do mercado de trabalho, efeito das reformas trabalhistas aplicadas na Europa no pós crise, explica boa parte da medíocre recuperação do crescimento europeu pela falta de demanda.

A Reforma Trabalhista parece ser negativa não só para os trabalhadores brasileiros – maioria da população – mas também pode ser um empecilho para a retomada do crescimento econômico pela falta de demanda. Se não é importante buscar um modelo de desenvolvimento em que todos os brasileiros possam ter direitos trabalhistas e sociais mínimos simplesmente por razões humanitárias, aqueles que defendem a Reforma deveriam preocupar-se ao menos com o fato de a experiência internacional mostrar que ela pode ser na verdade prejudicial ao crescimento econômico.

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