Em 1917, na primeira Greve Geral do Brasil, um grupo de mulheres lançou um manifesto advertindo as forças de repressão a não serem usadas por patrões.

Há cem anos, enquanto ocorria em São Paulo e em outras cidades do Brasil aquela que é considerada pela historiografia nossa primeira greve geral, um grupo de mulheres, operárias e grevistas, lançou um manifesto em que pediam aos integrantes das forças policiais que não atacassem mais os trabalhadores e trabalhadoras, já que todos eram irmãos na miséria e na exploração.

O manifesto, intitulado “Apelo aos Soldados”, circulou de mão em mão por vários dias, antes de ser publicado no principal jornal operário de São Paulo, A Plebe, no dia 29 de julho de 1917. Assinado pelo autodenominado “Um Grupo de Mulheres Grevistas”, o manifesto tinha forte inspiração na Revolução Russa que ocorria do outro lado do mundo, em que as forças armadas já entendiam sua posição como exploradas do regime que se desfazia.

Reproduzimos esse manifesto justamente às vésperas de mais uma Greve geral no Brasil , assim como no último dia 28 de abril. E, mais uma vez, como ocorreu recentemente em Brasília e em Curitiba, os governos – golpista ou eleitos – podem nos fazer de alvo de forte repressão policial. Por isso, até mesmo como forma de advertir a sociedade de que a onda conservadora que quer tomar conta do Brasil pretende nos fazer retroceder no tempo, jogando-nos numa era de treva e extinção dos direitos individuais e coletivos, trazemos o histórico texto de volta.

Segundo relatos de historiadores, houve soldados que se recusaram a atirar ou atingir com a espada nos dias que se seguiram.

O manifesto, além de ter este impacto sobre os soldados, registra nitidamente o peso da organização e participação das mulheres à frente deste marco histórico do movimento sindical brasileiro . E evidencia a permanência da luta de classes.

Leia o manifesto:

Soldados! Não deveis perseguir os nossos irmãos de miséria. Vós também sois da grande massa popular, e, se hoje vestis fardas, voltareis amanhã os camponeses que cultivam a terra, ou os operários explorados das fábricas e oficinas.

A fome reina em nossos lares e nossos filhos nos pedem pão! Os perniciosos patrões contam, para sufocar as nossas reclamações, com armas que os armaram.

Soldados! Estas armas vo-las deram para garantir o seu direito de esfomear o povo! Mas, soldados, não vos presteis a fazer o jogo dos grandes patrões, que não têm pátria!

Lembrai-vos de que o soldado brasileiro recusa-se, no Rio, em 91, a atirar sobre o povo quando protestava contra o imposto do vintém e até o dia 13 de maio de 1888 recusava-se a ir contra os escravos que se rebelavam, fugindo ao cativeiro!

Que belo exemplo a imitar! Não vos prestei, soldados, a servir de instrumento da opressão dos Crespi, Matarazzo, Gamba, Hoffmann etc, os capitalistas que levam a fome ao lar dos pobres!

Soldados! Cumpri vosso dever de homens! Os grevistas são vossos irmãos na miséria e no sofrimento. Os grevistas morrem de fome, enquanto os patrões morrem de indigestão!

Soldados recusai-vos ao papel de carrascos!

São Paulo, junho de 1917.

Um grupo de mulheres grevistas”

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