Ano 2 – nº 12 – Março 2017

O 8 de março nas redes sociais online

De 6 a 9 de março, acompanhamos, coletamos e processamos as principais hashtags envolvidas com o #8M, entre elas: #ParadaBrasileiraDeMulheres, #8MBrasil, #GreveInternacionaldeMulheres, #8M, #ParoInternacionalDeMulheres, #8DeMarco, #WomensStrike, #MujeresEnHuelga, #WomenStrike, #womenstrikeus, #march8strike, entre outras. O objetivo foi capturar menções de diversos lugares do mundo, buscando analisar como um todo a luta das mulheres e as manifestações que ocorreram nesse dia 8 de março.

O principal agrupamento na cobertura mundial de atos e paralisações envolvendo a data foi sulamericano. Comandado por perfis argentinos e com forte participação de perfis chilenos, contando também com perfis uruguaios. O fato de o cluster formar-se por meio das redes latino-americanas – Argentina, Chile, Bolívia, Equador, Uruguai, por exemplo – traz consigo o peso das lutas feministas presentes nesse continente, como a luta pela legalização do aborto em alguns países e um posicionamento sobre o momento político da região, muito mais forte do que em outros clusters, tendo em vista o delicado momento político que muitos países latino-americanos vivem.

O segundo maior agrupamento da rede capturada é formado principalmente por usuários espanhóis, como o usuário oficial do Podemos!, por exemplo. Um ponto interessante e de distinção entre os dois maiores clusters é o tema do aborto. Enquanto a palavra [aborto] é muito debatida no cluster da América Latina, o tema praticamente inexiste no cluster europeu..

O cluster com usuários brasileiros é nitidamente separado de clusters por uma barreira linguística. Conta com perfis historicamente engajados com a luta feminista no Brasil e perfis de imprensa progressista/independente. A oposição à data no Brasil não apresentou resultado significativo nas redes.

Muitos usuários mexicanos aparecem no quinto maior agrupamento da rede, como o Instituto Simone Beauvoir. A atenção ao dia das mulheres se divide com manifestações que buscam relembrar os desaparecidos de Ayotzinapa. Aqui chama atenção o enfoque dado ao assassinato e desaparecimento de mulheres mexicanas, bem como a conexão com entidades e comissões de direitos humanos.

É interessante observar como a análise nos ajuda a interpretar as particularidades de uma ação que à primeira vista pode parecer homogênea. Assim como o próprio feminismo e suas diferentes vertentes, é possível observar diferenças nítidas entre as manifestações realizadas nas avenidas de Buenos Aires, nas praças mexicanas ou nas ruas de Madrid. Enquanto a luta feminista caminha muito próxima à instabilidade política e de perda de direitos que marca a América Latina, na América do Norte o inimigo tem cara, ID e atende pelo nome de Donald Trump.

A maior recessão da história nos editoriais

A responsabilidade da política econômica do atual governo sobre a queda do Produto Interno Bruto de 3,6% em relação a 2015, que confirma uma tendência de aprofundamento da recessão, foi suavizada pela grande mídia. Em editorial publicado em 9/3, o jornal O Estado de S.Paulo reconhece o empobrecimento da população no geral e ainda que os efeitos da crise foram piores para os mais pobres. Mas aproveita para elogiar a rápida atuação do presidente golpista Michel Temer e seus ministros diante do anúncio do recuo do PIB. “Enquanto o público examinava os números divulgados na terça-feira de manhã pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o presidente Michel Temer e ministros conversavam com empresários no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Sem fugir do assunto e sem ficar lamentando a crise, o presidente e o ministro da Fazenda falaram sobre pontos fracos da economia e sobre o caminho para uma expansão duradoura. A agenda governamental, em boa parte antecipada no Estado de terça-feira, inclui ações de efeito rápido, como a retomada, com mudanças, do programa de concessões de infraestrutura.”

A Folha de S.Paulo, menos otimista, publicou editorial no dia 8/3 no qual associa a possibilidade de recuperação do país à capacidade do governo de efetuar as reformas em andamento, em particular a da Previdência Social. “…correntes relevantes da opinião pública ainda não se deram conta da gravidade dos problemas e do risco de encarar reformas como mero lobby de grupos conservadores, tal como se observa no debate sobre as mudanças cruciais na Previdência. Vislumbram-se sinais de recuperação, mas não está afastado o risco de recaída —de reprise de uma regressão tão profunda e duradoura quanto a dos anos 1980. Nesta hipótese, o drama do retrocesso seria também social e político.”

O Valor Econômico publicou em editorial da edição de 9/3 que a economia caminha para uma tímida expansão em 2017. “O fundo do poço da economia foi atingido no primeiro semestre de 2015. Depois, os indicadores de desempenho passaram a ser um pouco menos ruins a cada trimestre, por qualquer comparação, exceto uma: na margem, no último trimestre de 2016, houve a maior queda do ano, de 0,9%, e não a menor, como se esperava.”

Na mesma linha vai a análise de Cássia Almeida publicada no jornal O Globo em 7/3: “A recessão, que se agravava a cada divulgação dos resultados trimestrais até junho do ano passado, começou a ficar mais suave. Até o meio do ano, a recessão era de 4,8%. Fechamos 2016 com a atividade econômica 3,6% menor. A comparação entre os semestres também mostra a situação um pouco menos pior. A recessão foi de 4,5% nos seis primeiros meses do ano e caiu a 2,7% no segundo semestre.”

O Brasil na imprensa internacional

É interessante a maneira como a mídia internacional retrata o Brasil. Em Portugal, em 28/2, o Diário de Notícias publicou a reportagem “Economia melhora e política piora nos primeiros nove meses de Temer”, que faz uma análise do governo a partir do que a grande mídia brasileira publica. O texto diz que é como se fossem dois países dentro dos mesmos jornais porque os cadernos de economia anunciam melhoras e os cadernos de política deixam claro como o establishment está cada vez mais manchado por escândalos de corrupção.

Hoje, talvez, os escândalos de corrupção sejam o assunto mais tratado pela mídia internacional ao falar sobre o Brasil. O francês Le Monde, além de publicar uma reportagem sobre uma possível compra de votos na eleição do Rio de Janeiro como cidade sede das Olimpíadas de 2016, produziu outra, antes da que tratou das Olimpíadas, com o título “No Brasil, o reino da impunidade”. Essa reportagem inicia apresentando aos leitores a expressão brasileira que explica o reino da impunidade, “tudo acaba em pizza” e segundo a repórter, ouvindo os cínicos, pode-se dizer que Michel Temer está preparando uma “quatro queijos”. A reportagem foi produzida a partir do anúncio feito por Temer de quais seriam as regras para o afastamento de ministros envolvidos em corrupção. A repórter chama atenção para atitudes controversas de Temer e abre espaço para questionar o MBL em função da convocação de um protesto para o dia 26 de março. O texto diz que Kim Kataguiri mudou o tom com relação a suspeitas de corrupção no atual governo, já não é tão combativo. O cientista político Carlos Melo afirma que agora será possível saber se as manifestações passadas visavam somente se livrar de Dilma Rousseff e do PT ou se havia uma verdadeira cólera contra a corrupção.

Baseados em publicações da grande imprensa brasileira, jornais estrangeiros publicaram outras reportagens sobre possíveis casos de corrupção sugeridos por vazamentos seletivos das delações que ainda não se tornaram públicas. Fato é que a marca de país corrupto fica cada vez mais forte quando se fala em Brasil.

Chamou a atenção dos jornais estrangeiros, principalmente, do New York Times e do Le Monde, as manifestações políticas contra o governo Temer durante as festas de carnaval. O francês utilizou a manchete “No carnaval do Rio, a política se convida para festa”, já o nova-iorquino intitulou “Foliões do carnaval do Brasil canalizam raiva contra o presidente”. Ao fim do carnaval, o NY Times noticiou que os brasileiros voltariam à “realidade de crise política”.

Ainda tratando da política brasileira e focando nas suas enormes contradições, o NY Times publicou em 3/3 a reportagem “Líderes do Brasil defendem a austeridade (mas não para eles)” que aborda a defesa de uma austeridade no Brasil ao mesmo estilo da que foi aplicada na Grécia, porém, a reportagem denuncia as controvérsias com aumentos de salários e jantares caríssimos promovidos pela presidência da República e, principalmente, pela falta de impostos que taxem os mais ricos. O texto defende que a política de Temer protege os privilégios dos ricos e ataca os pobres.

O governo Michel Temer não foi destaque apenas pela sua relação controversa com a corrupção ou pelas medidas econômicas que só farão aumentar a desigualdade social do país. Temer foi alvo de notícias em diferentes países em função do discurso que realizou no Dia Internacional da Mulher: em Portugal, “Temer elogia capacidade da mulher ‘no supermercado’ e no lar”; na Espanha, “O presidente do Brasil destaca o papel da mulher em casa e no supermercado; nos Estados Unidos, “Temer irrita mulheres com elogio à habilidade no supermercado”.

Enquanto Michel Temer é motivo de constrangimento internacional por proferir um discurso retrógrado, Dilma Rousseff, a mulher que deveria estar na presidência da República, aparece em alguns órgãos da imprensa europeia em função da sua participação no Festival de Cinema e no Fórum Internacional sobre Direitos Humanos que ocorre em Genebra, na Suíça. O jornal português Diário de Notícias publicou trechos de uma entrevista de Dilma em que ela afirma, “nunca pedi subornos, nem recebi subornos”. Dilma foi questionada sobre as informações de que ex-executivos da Odebrecht que agora são delatores teriam afirmado que pagaram propina para a campanha presidencial dela, ao que a atual presidenta do conselho curador da Fundação Perseu Abramo respondeu “eu sou uma pessoa que necessita de ver as provas. Se acusam de algo, isso tem de ser sustentado, não bastam afirmações”.

Além da política, chamou a atenção dos jornais Le Monde e NY Times, a violência contra pessoas transgêneras no Brasil. O NY Times publicou a reportagem “Tortura e assassinato de mulher transgênera atordoa o Brasil” sobre a violenta morte de Dandara, no Ceará. A publicação ouve entidades, cita números alarmantes de assassinatos de pessoas transgêneras e coloca Jair Bolsonaro como uma das figuras que legitima esse tipo de violência. Já o Le Monde, fez uma reportagem sobre a modelo transgênera brasileira, Valentina Sampaio. A publicação diz que Valentina é um caso raro porque o Brasil é um país altamente intolerante onde mais ocorrem assassinatos e casos de violência por transfobia.

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