Polarização faz com que cada um dos grupos continue a dialogar apenas com seus integrantes, formando clusters próprios

Ano 1 – nº 06 – Agosto 2016

A Imprensa alternativa nas manifestações de 31 de julho

A análise da influência dos sites da imprensa alternativa à grande mídia deve necessariamente considerar o comportamento das redes sociais, pois elas constituem as principais plataformas de acesso e disseminação do conteúdo que é publicado. Assim, a equipe responsável pelas redes sociais da Fundação Perseu Abramo monitorou o Twitter durante as manifestações realizadas no dia 31 de julho por todo Brasil. Foram capturadas 4631 contas, e o grafo gerado com as interações e a modularidade desses atores é o seguinte:

A parte azul do grafo é formada por páginas de direita, como o implicante_org, AvancaMaconsBR, VillaMarcovilla, gnatalini, entre outros. O cluster rosa, localizado na parte inferior esquerda do grafo também é um grande influenciador de rede (joaquintdasilva) entre os usuários que eram contra as manifestações. No meio do grafo há alguns clusters que são formados por grupos de mídia, como G1, Globo News, jornais O Globo e O Estado de S.Paulo, Globo Política, Jornal do Brasil e UOL Notícias. Já o cluster laranja é formado por usuários que defenderam e apoiaram as manifestações de domingo contra o presidente interino, Michel Temer. Confira esse cluster especificamente:

O cluster tem como principais influenciadores de rede políticos de esquerda e usuários de imprensa alternativa, como Brasil 247, Revista Fórum, Rede Brasil Atual e Mídia Ninja. São usuários que, dentro do cluster progressista, disputam a narrativa com canais de informação da grande mídia.

Seja pela cobertura focada nas manifestações contra o golpe ou pela ausência de uma cobertura imparcial da grande mídia sobre as manifestações, os usuários desse cluster preferem e encontram nesses canais de imprensa alternativa uma fonte de informações em tempo real para as ações que ocorreram no Brasil inteiro.
Por fim, observamos uma polarização que é analisada por especialistas desde as eleições de 2014, que até hoje não se dissolveu e dificilmente o fará. Tal polarização faz com que cada um dos grupos continue a dialogar apenas consigo mesmo, formando clusters próprios.

Mapa indica que direita é mobilizada nas redes sociais

O estudo Mapa das redes de mobilização no Facebook, realizado pelos professores Esther Solano (Unifesp), Pablo Ortellado (USP) e Marcio Moretto (USP), concluiu que a direita está muito mais ativa nesta plataforma do que o campo progressista. Os resultados são preliminares, pois a pesquisa ainda está em curso.

Os autores monitoraram as páginas do Facebook com conteúdo social e político com mais de 50 mil curtidas, distinguindo clusters denominados direita, esquerda e evangélicos, que, por manterem atividade intensa e específica, formam um grupo próprio. A observação foi feita entre 11 e 25 de junho na rede social que possui no Brasil 99 milhões de usuários ativos mensais. Segundo o critério adotado, a direita engloba os antipetistas, conservadores, defensores de atitudes autoritárias e punitivistas.

Uma reportagem publicada sobre o estudo na revista Carta Capital (29/7) destaca em números o crescimento da direita: “Quando se analisam as cinco páginas que tiveram mais curtidas únicas (número de usuários que curtiram pelo menos uma postagem) no período considerado, observa-se no topo do ranking o Partido Anti-PT (456 mil curtidas), o MBL (376 mil), o Movimento Contra a Corrupção (301 mil), o Vem Pra Rua (251 mil), e o Revoltados Online (217 mil). No outro espectro, está em primeiro o Deboas na Revolução (246 mil), seguido por Feministas Revolucionárias (174 mil), Geledés (99 mil), Esquerda Revolucionária (55 mil) e por último a página Verdade sem manipulação (54 mil).

Se o critério for o número de curtidas na própria página, o ranking fica da seguinte forma: Movimento Contra a Corrupção (2,5 milhões), Revoltados Online (1,7 milhão), Partido anti-PT (1,4 milhões), AnonymousBrasil e Vem Pra Rua (com 1,4 milhão cada). Do lado que se intitula progressista vem o Deboas na Revolução (871 mil), Direitos Humanos Brasil (816 mil), Geledés (490 mil), Passe Livre São Paulo (335 mil) e SP Invisível (325 mil).”

Na segunda parte do trabalho, foi constituído um Monitor de debate político e digital, com as informações mais compartilhadas na semana no Facebook, a fim de medir a qualidade da informação política e os boatos como estratégia de informação. Novamente a conclusão é que os meios de direita se sobressaem no compartilhamento na rede social, com alto impacto de boatos e notícias falsas que desqualificam a oposição política. Em muitas ocasiões os meios de direita são responsáveis por mais da metade do conteúdo compartilhado no Facebook.

Internacional

As manifestações ocorridas nos últimos meses, em vários países e, principalmente, no Brasil, para denunciar que existe um golpe de Estado em curso, vêm gerando reflexões importantes de agentes internacionais que decidiram se pronunciar contra o processo de impeachment que pode destituir Dilma Rousseff. Vinte e oito senadores e deputados franceses publicaram um manifesto no jornal Le Monde, no dia 13 de julho, no qual denunciam o golpe no Brasil e afirmam que é o terceiro que acontece de maneira parecida na América Latina nos últimos anos. Os outros dois foram no Paraguai e em Honduras. Os parlamentares, que classificam o processo como “uma baixa manobra parlamentar”, vão além e pedem que o presidente François Hollande não dialogue e não reconheça o governo de Michel Temer. Solicitam ainda que toda a comunidade internacional faça o mesmo.

Doze dias depois dessa publicação, quarenta membros do Congresso dos EUA, do Partido Democrata, redigiram um manifesto em que expressam “profunda preocupação” com as ameaças à democracia no Brasil. Os congressistas endereçaram a carta ao secretário de Estado John Kerry, insistindo para que ele “exerça a máxima precaução no trato com autoridades interinas do Brasil” e que se abstenha “de declarações ou ações que possam ser interpretadas como apoio à campanha do impeachment lançado contra Dilma”. O documento também afirma que “o processo de impeachment se tornou suspeito por irregularidades processuais, corrupção e motivações políticas desde o início”.

Em 8 de agosto, Bernie Sanders foi mais contundente. O senador diz que “está muito preocupado” com o “processo de impeachment que se parece muito com um golpe de Estado”. Ele ainda afirma que o governo dos EUA não pode ficar em silêncio sobre a situação no Brasil. Por último, o senador diz que os estadunidenses “devem se levantar pelas famílias de trabalhadores do Brasil e requisitar que essa disputa seja resolvida com eleições democráticas”.

Ainda não está claro de que maneira esses posicionamentos podem influenciar o processo brasileiro. Além disso, e tão importante quanto, é saber se as manifestações que defendem a saída de Michel Temer vão continuar. É evidente que esses protestos deram credibilidade à denúncia de que existe um golpe de estado em curso. Antes, a imprensa internacional apenas reproduzia o que a mídia brasileira noticiava. Depois, praticamente todos os grandes jornais do mundo colocaram o processo de impeachment sob suspeita e não voltaram atrás. Prova disso, é que tanto Lula como Dilma têm dado entrevistas para esses veículos em defesa de seus posicionamentos.

Dilma Rousseff falou ao LA Times que não acredita que o governo Obama esteja por trás da crise política no Brasil. Ao jornal El Mundo, da Espanha, ela disse que “o presidente interino não é só um traidor, mas um conspirador.” O ex-presidente Lula concedeu entrevista ao jornal francês Libération na qual fez críticas aos países ricos, reconheceu que Dilma cometeu erros na condução da economia, afirmou que o Brasil precisa aprender que os pobres são a solução para os problemas econômicos e explicou que o PT várias vezes tentou propor reformas, mas a classe política sempre as recusou.

No momento, os órgãos de imprensa internacionais estão voltados para as Olimpíadas e atentos aos protestos contra Michel Temer. Sobre a abertura dos Jogos, todos noticiaram que Temer estava com medo de ser vaiado, por isso nem sequer foi anunciado e, mesmo assim, em um rápido discurso protocolar, ouviu as temidas vaias. A manchete do jornal alemão Süddeutsche Zeitung foi “Michel Temer: a controversa abertura olímpica”.

 

 
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