A renúncia de Cunha, ao mesmo tempo que é impactada pelo governo golpista, também tem impacto sobre ele

Notas FPA Política e Opinião Pública 15

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Ano 1 – nº 15 – 15 de julho de 2016

A renúncia de Eduardo Cunha

Na última quinta-feira, dia (7/7), o então presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, renunciou à presidência da casa. Afastado em maio pelo Supremo Tribunal Federal (STF), tendo inclusive seu mandato suspenso, Cunha é investigado na Lava-Jato e réu no STF pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, sob acusação de ter recebido US$ 5 milhões em propina. Além disso, já foi denunciado por esquema de corrupção na Caixa Econômica Federal, investigação que também inclui os nomes de Fábio Cleto, ex-vice-presidente do banco, e do ex-ministro e ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves. Cunha já teve relatório a favor de sua cassação aprovado no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, mas tenta recorrer e manobrar na Comissão de Constituição e Justiça para anular a votação. Além de si próprio, o deputado afastado também encara uma série de delações e denúncias envolvendo sua esposa e sua filha, que teriam se beneficiado das propinas recebidas por ele. Sua esposa, Cláudia Cruz, é ré na Lava Jato, e, por não ter foro privilegiado, tem sua denúncia nas mãos de Sérgio Moro.

A renúncia de Cunha, ao mesmo tempo que é impactada pelo governo golpista, também tem impacto sobre ele. Sendo um dos principais articuladores políticos em Brasília, como um dos líderes do golpe e possuidor de uma bancada própria de deputados cujas campanhas ajudou a financiar, teve sua situação acompanhada de perto pelo Planalto nas últimas semanas. Sua influência no Legislativo ainda é grande, e o estado de paralisia visto na Câmara nos últimos meses, com poucas sessões sendo abertas e um ritmo de votações bem menor do que tinha antes, é pouco produtivo para o governo Temer, que deseja passar cada vez mais pautas entreguistas e neoliberais devido ao seu caráter provisório. Preocupava ao Planalto o risco de retaliação da bancada de Cunha, cuja maioria pertence ao “centrão”, bloco que reúne deputados conservadores de diversos partidos que integram bancadas como a ruralista, evangélica e da bala. Tal vingança poderia causar atraso e danos na aplicação da agenda do golpe, sacrificando a governabilidade do usurpador Temer.

Além da ameaça de represália dentro do Legislativo, preocupava ainda mais ao Planalto, como veiculado na imprensa nas últimas semanas, a possibilidade de Cunha fazer delações e expor diretamente Temer e seus comparsas à Justiça e à mídia. Tal risco se deve ao fato de que, ao perder seu cargo, mandato e podendo ser preso e ver sua família indo pelo mesmo caminho, Cunha se considerasse abandonado após liderar o golpe na Câmara, levando Dilma ao afastamento e alçando Temer à presidência. Com isso, passou a ser mais interessante e essencial para o governo ilegítimo tentar salvar a pele de Cunha do que abandoná-lo. Segundo a imprensa, há uma tentativa de acordo em curso, que envolve a renúncia, para destravar a Câmara, e a preservação do mandato parlamentar do ex-presidente da Câmara, para manter seu foro privilegiado. Dessa forma, o governo ilegítimo segue com a agenda neoliberal do golpe, e Cunha tenta adiar sua prisão, que ficaria nas mãos do STF.

A eleição para a presidência da Câmara

Na quarta-feira, dia 13/7, a Câmara dos Deputados decidiu em nova eleição que Rodrigo Maia (DEM-RJ) terminará o mandato de Cunha como presidente, até fevereiro de 2017. Foi uma disputa pulverizada, com  13 candidatos, sendo os mais votados no primeiro turno: Rodrigo Maia (DEM, 120 votos), Rogerio Rosso(PSD, 106 votos), Marcelo Castro (PMDB, 70 votos) e Giacobo (PR, 59 votos). Embora o Planalto tenha tentado trabalhar por um nome de consenso entre o “centrão” e a antiga oposição (PSDB, DEM, PPS e PSB), a disputa entre ambos deu o tom da eleição.  No “centrão”, foram sete candidatos, enquanto a antiga oposição fechou matéria em torno do candidato do DEM. Embora Rogério Rosso (PSD-DF), nome forte do “centrão” que presidiu a Comissão Especial do Impeachment na Câmara tenha sido considerado favorito, no segundo turno foi derrotado de maneira acachapante. O resultado da disputa entre os dois golpistas foi de 285 votos para o candidato do DEM e 170 para Rosso, uma diferença de mais de 100 votos.

O PT, em reunião realizada entre a bancada e a Direção Nacional, definiu que nenhum voto seria dado para deputados que votaram a favor do golpe, contrariando os boatos veiculados na imprensa de que apoiaria o candidato do DEM para enfraquecer o Centrão. Fechou matéria, portanto, em torno do candidato oficial do PMDB e ex-ministro da Saúde do governo Dilma, Marcelo Castro (PMDB-PI), que contrariou as alas golpistas de seu partido e não votou pelo impeachment, sendo um dos 140 que tentaram barrar o golpe. Desafeto de Cunha e de Temer, Marcelo foi o terceiro colocado no pleito. No segundo turno, a bancada petista foi liberada para votar sem orientação partidária ao passo que a ausência de uma candidatura democrática e contrária o golpe não se fazia presente. A fragmentação vista na esquerda também foi decisiva para o resultado da eleição, ao passo que os 3 candidatos apoiados por PT, PCdoB e PSOL, se somados, garantiriam o segundo-turno e a derrota do Centrão logo no primeiro pleito.

A vitória de Rodrigo Maia representa a derrota do “centrão” e de Cunha, que demonstraram ter um poder de fogo menor do que o esperado e uma fragmentação excessiva, expressa no número de candidatos e na dificuldade de fechar a posição em torno do candidato mais forte. No entanto, também coloca a Câmara dos Deputados nas mãos de um dos partidos mais conservadores do período republicano, oriundo da Arena, partido do regime militar, e do PFL, partido das grandes oligarquias por todo o Brasil.

Embora qualquer derrota de Eduardo Cunha e seu grupo político seja bem vinda, o poder de pautar uma Casa Legislativa nas mãos do partido mais à direita coloca ainda mais força sobre a agenda do golpe, colocando em risco o Estado brasileiro e a população, com a implementação de medidas entreguistas, neoliberais e que colocam cada vez mais sob ameaça o legado de melhoria das condições materiais das classes populares vista nos governos petistas de Lula e Dilma.

* As opiniões aqui expressas são de inteira responsabilidade de sua autora,
não representando necessariamente a visão da FPA ou de seus dirigentes.

 
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