Hamilton Pereira: Considerações sobre o governo Cunha (4)
Primeiro Ministro oculto do Governo de Michel Interino Temer deixou de ser funcional para os objetivos golpistas e torna-se um estorvo
Por: Pedro Tierra*
Principal condutor do Golpe, ao congregar em torno de si a escória que produziu a sessão de 17 de abril e abriu caminho para afastar a Presidente eleita Dilma Rousseff, o Primeiro Ministro oculto do Governo de Michel Interino Temer deixou de ser funcional para os objetivos golpistas e passou a tornar-se um estorvo. Trata-se agora, para o cartel da mídia familiar, de higienizar o golpe. Cassar o mandato de Eduardo Cunha, apagar do noticiário sua participação decisiva na sedição, para conferir aos usurpadores um mínimo de respeitabilidade e esgrimir o discurso do “normal funcionamento das instituições”.
Eis aí uma tarefa não isenta de dificuldades nesta república em que foi rompido o “equilíbrio de poderes” sonhado pelo barão de Montesquieu. O Judiciário – associado ao cartel da mídia familiar – se sobrepôs aos demais poderes e age como uma espécie auto-outorgada de Poder Tutelar sobre o Estado e a Sociedade, chamando para si a agenda política da nação. Liquidou, portanto, a dita “normalidade democrática” ao abolir a validade do seu fundamento: o voto popular. O país foi, dessa forma, precipitado numa espiral regressiva de arbítrio – por um poder que só presta contas a si mesmo – e que pode nos levar ao colapso, já não da Carta Constitucional violada pelo Golpe de abril/maio de 2016, mas do conjunto das instituições por ela criadas e cujo funcionamento codificava.
A provável cassação de Eduardo Cunha, pode provocar turbulências na travessia da interinidade para a consumação do Golpe, com o impedimento definitivo de Dilma Rousseff e a efetivação do governo usurpador de Michel Temer. A remoção do primeiro-ministro oculto produzirá, conforme a tática que vier a adotar depois de consumada, um cenário de sérias dificuldades para a governabilidade no parlamento, considerando que o perfil do deposto não recomenda ilusões sobre cordura e que, mesmo afastado, Cunha permanece sendo o maior partido na Câmara Federal.
A vertiginosa deterioração da imagem do governo usurpador, em pouco mais de um mês, ante os olhos pasmos da sociedade – em particular daquela parcela que foi às ruas clamar pelo impedimento da Presidente eleita em nome do combate à corrupção – exige um esforço de reposicionamento do cartel da mídia frente à sucessão de escândalos que envolvem círculos cada vez mais próximos de Michel Interino Temer.
Depois da queda do Ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, os alvos da mídia familiar, mais que cúmplice, sócia do Golpe, são os Ministros da Educação, Mendonça Filho e da Casa Civil, o notório Eliseu Padilha, que acaba de ser alvo de um pedido de bloqueio de bens por parte do Ministério Público Federal. Em suma, a cassação de Eduardo Cunha pode vir a ser o prefácio da queda de Michel Temer a partir do momento em que sua permanência à frente do governo se tornar incompatível com os objetivos reais do Golpe.
O país vai-se encaminhando para um calendário intenso que inclui uma crescente mobilização dos movimentos populares de denúncia do Golpe e repúdio ao governo antinacional e antipopular; realização das Olimpíadas que atrairá a atenção do mundo para um governo isolado internacionalmente; votação do mérito do impedimento da Presidente no Senado Federal; abertura de delações das grandes empreiteiras que podem por a pique a composição atual do Parlamento nas duas casas e dos executivos em diferentes Estados do país; eleições municipais com novas regras que vedam o financiamento privado de campanhas; e fim do prazo legal para eleições diretas para a conclusão do mandato presidencial que expira em 2018. A partir daí a substituição dos eleitos em 2104 será indireta. Via Congresso, portanto.
A estratégia dos golpistas vai-se desenhando com nitidez: a) concluir o impedimento de Dilma Rousseff no Senado e concluir o Terceiro Turno das Eleições de 2014, consumando o Golpe; b) apoiar Temer mas mantê-lo sob pressão permanente para cumprir o programa neoliberal de demolição dos direitos dos trabalhadores e privatização do patrimônio público; e, c) depois de dezembro, sem ter que enfrentar eleições diretas, substituí-lo com os votos desse mesmo Congresso Nacional fruto do sistema político que entrou em colapso.
Os setores populares mobilizam forças cada vez mais expressivas na sociedade em torno da bandeira “Fora Temer”, incorporando novos protagonistas, particularmente movimentos da juventude, mulheres, MST, MTST, negros, movimentos culturais, LGBT e outros segmentos que alcançaram conquistas no plano dos direitos individuais e coletivos durante os governos Lula e Dilma. Encontram dificuldades para envolver o movimento operário – que ainda não sentiu as graves consequências das politicas de desmonte iniciadas pelo governo golpista – na definição do próximo passo: Plebiscito para consultar os cidadãos sobre: Eleições exclusivas para Presidente? Eleições Gerais? Constituinte?
Os setores populares têm contra si a velocidade vertiginosa dessa agenda que se prenuncia para o segundo semestre de 2016, diante da desenvoltura do governo de pilhagem instalado a partir de 12 de maio, que literalmente, ignorou seu caráter interino, carente da legitimidade do voto, para pôr em prática o programa neoliberal selvagem que foi rejeitado pelos cidadãos em quatro eleições sucessivas.
Está posto o desafio de, num tempo extremamente curto, os partidos e movimentos de esquerda que apoiam o “Fora Temer”, constituírem o núcleo dirigente capaz de unificar sua estratégia para produzir uma alternativa de saída da crise que não signifique tão somente a demolição dos direitos dos trabalhadores. Consolidar rapidamente as ações das Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo e preparar-se para uma jornada de resistência que pode se encaminhar para um desfecho rápido ou nos remeter, lutando sob um governo ilegítimo, até o pleito de 2018 ou até mais adiante.
*Pedro Tierra (Hamilton Pereira) – É Presidente do Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo.