Debate analisa processos políticos de 1992 e 2016 e aponta perspectivas
Debatedores defenderam a importância da unidade na resistência ao golpe para construir novo projeto para o país
Por: Rose Silva
Fotos: Marcelo Vinci
O presidente da Fundação Perseu Abramo, Marcio Pochmann, participou da mesa redonda “O impeachment de 1992 e o golpe de 2016”, realizada no dia 2 de junho, durante o II Salão do Livro Político, em São Paulo. Também participaram como debatedores o professor da faculdade de direito da Universidade de São Paulo, Alysson Leandro Mascaro, a presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Carina Vitral, e o político e professor Ciro Gomes. O debate foi transmitido ao vivo pela tevêFPA e está disponível no Youtube.
Em sua exposição, Ciro Gomes destacou que ocorre hoje uma revogação da Constituição de 1988, em seus fundamentos, que nos devolve ao colonialismo pós-guerra enquanto somos distraídos pela “picaretagem mais vulgar”. Crítico às últimas medidas aprovadas na Câmara dos Deputados com o aval do governo golpista de Michel Temer, Ciro apontou o que terá de ser enfrentado pelos brasileiros para evitar o retrocesso. “Ontem à noite, os canalhas aprovaram uma Desvinculação de Receitas da União (DRU) de 30%, criaram 14 mil cargos de livre provimento e aumentaram o salário do Judiciário. Isso é o que interessa, e não vamos enfrentar a situação sem uma consciência cidadã poderosa”, afirmou.
Ele pontuou ainda as diferenças em relação ao processo de impeachment ocorrido em 1992 e o atual. “Hoje vejo com mais clareza o que houve com Collor. Na época houve um consenso absoluto entre o Brasil reacionário e o Brasil progressista. O impeachment foi apresentado por um conjunto de organizações da sociedade civil: a Associação Brasileira de Imprensa, a OAB, a UNE, e estava clara a individualização da responsabilização do presidente Fernando Collor. Mas ele não caiu porque a sociedade foi às ruas, e sim porque o consenso alcançou a plutocracia. Já o consenso contra Dilma não se estabeleceu, embora a insatisfação com ela tenha alcançado uma grande parcela da população”, disse.
Para Pochmann, três alterações profundas ocorridas no Brasil foram determinantes para a situação atual. A primeira delas é que o capitalismo brasileiro está em uma fase de descenso e não existe um projeto hegemônico para o país. Um segundo ponto é que a sociedade não se vê representada nas instituições tradicionais, como os partidos políticos e os sindicatos. Por último, houve um esgotamento da Nova República, que foi uma espécie de acordo pelo alto, e há mais de trinta anos não ocorre nenhuma reforma no Brasil.
Sobre a crise de legitimidade e de projeto para o país, Pochmann acrescenta que não conseguimos uma maioria política estável desde 1985, por isso instalou-se na política o “toma-lá-dá-cá”. “Temos um sistema partidário que é uma excrecência do regime militar e um modelo de governabilidade que se sustenta em conciliação de classes. Em 2014, a eleição não resolveu, para os derrotados, a possibilidade de continuidade da democracia. A UDN moderna perdeu quatro eleições consecutivas e sabia que pelo voto não teria condições de vencer. Então passamos a viver o terceiro turno. Temos um governo dos sem votos, formado exclusivamente por homens brancos ricos, como no século 19, que coloca em xeque parte da Constituição”, afirmou. “O que precisamos fazer é lutar pelo Fora Temer e trazer de volta a Dilma, mas com outra política econômica”, concluiu.
A presidenta da UNE, Carina Vitral, destacou que na disputa eleitoral de 2014 ficou evidente a escolha do povo brasileiro pela manutenção das conquistas sociais e do novo Brasil que estava surgindo após os legados de Lula e Dilma. “Existe um movimento real que resiste ao golpe até hoje e inclui setores que estavam insatisfeitos com o governo, mas sabiam que há uma disputa política muito maior. Por isso, formou-se uma coalizão em defesa da democracia ”, avaliou.
Em sua opinião, as ruas tiveram papel essencial nos processos de impeachment ocorridos em 1992 e 2016. “Em 1992, como havia consenso da sociedade, a juventude, principal motor de mudanças no Brasil, foi às ruas em peso. E o movimento foi protagonizado pelos secundaristas, os mesmos que hoje ocupam escolas para salvar a educação pública. Já em 2016, nós, que nos posicionamos contra o golpe, vencemos nas ruas em um segundo momento”, disse.
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