Conselho Permanente da OEA aprovou declaração mais conciliatória com a Venezuela, a partir de uma iniciativa argentina

Ano 3 – nº 47 – 03 de junho de 2016
 

Venezuela e as disputas na OEA

Um dia após o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, subir o tom contra o governo do presidente Nicolas Maduro, o Conselho Permanente da OEA aprovou, nesta quarta-feira, uma declaração mais conciliatória com a Venezuela, a partir de uma iniciativa argentina.

No último final de semana, representantes do governo e da oposição venezuelana haviam mantido encontros separadamente com o ex-primeiro ministro espanhol, José Luis Zapatero, e com os ex-presidentes Martin Torrijos (Panamá) e Leonel Fernández (República Dominicana), em uma iniciativa de mediação proposta pelo secretário-geral da Unasul, Ernesto Samper.

Apesar da tentativa de diálogo em andamento, na terça-feira, o secretário-geral da OEA acirrou os ânimos ao solicitar a convocação de um Conselho Permanente Extraordinário da organização para considerar a situação na Venezuela. Com base na Carta Democrática Interamericana, Luis Almagro divulgou um informe de 132 páginas, no qual pediu que o Conselho Permanente avalie a “alteração da ordem constitucional e como a mesma afeta a ordem democrática”. A medida contou com apoio da oposição venezuelana, reunida na Mesa de Unidade Democrática (MUD). Em resposta, o presidente Nicolas Maduro acusou o intervencionismo e fez duras críticas a Almagro e à oposição. No informe, Almagro também listou oito recomendações para a Venezuela superar a crise, que se assemelham às reivindicações da oposição, entre as quais: realizar o referendo revogatório do mandato de Nicolas Maduro ainda em 2016; libertar presos por motivos políticos; e criar um mecanismo independente de combate à corrupção integrado por especialistas internacionais apoiados pela ONU e/ou OEA.

A iniciativa do secretário-geral somou-se às tensões que já vinham se acumulando nas semanas anteriores, a partir da visita de deputados da oposição a Almagro em Washington e das disputas entre o Conselho Nacional Eleitoral e a MUD em torno dos procedimentos para a convocação do referendo (à oposição interessa finalizar a consulta antes do dia 17 de janeiro de 2017, pois, caso o resultado seja negativo para o governo Maduro, a lei prevê a convocação de novas eleições; após esta data, o vice-presidente assumiria o governo até o fim do mandato em 2019).

Contudo, nesta quarta-feira, uma declaração mais conciliatória, patrocinada pela Argentina (com diversas menções à não intervenção e respeito à soberania), foi aprovada por todos os membros da organização, inclusive pela Venezuela. Apesar de também ter votado a favor, a delegação paraguaia marcou posição contra o tom conciliador do texto. A declaração oferece ajuda da OEA para que governo e oposição encontrem uma solução por meio de um diálogo inclusivo e apoia a iniciativa de mediação de Zapatero, Torrijos e Fernández.

A iniciativa argentina chama a atenção ao lembrarmos que em um de seus primeiros pronunciamentos, ainda como presidente eleito, Macri afirmava que pediria a suspensão da Venezuela do Mercosul com base na cláusula democrática. Nesta quarta, a ministra das Relações Exteriores da Argentina, Susana Malcorra, afirmou que o apelo à Carta Democrática feito por Almagro é apressado.  Segundo o site Vértice, a manobra argentina pode ser entendida à luz da candidatura da chanceler ao cargo de secretária-geral da ONU (antes de assumir o ministério, Malcorra era chefe de gabinete do atual secretário, Ban Ki-Moon). Ainda segundo a notícia, a própria iniciativa de Almagro teria sido uma antecipação à declaração conciliatória proposta pela Argentina, que já era negociada nos bastidores da OEA e, uma vez aprovada, dificultaria a posição mais dura de apelo à Carta Democrática. Com efeito, a reunião extraordinária da OEA convocada por Almagro ainda deve acontecer entre 10 e 20 de junho, mas sua posição neste momento está mais enfraquecida. Ainda assim, a instabilidade política na Venezuela e a fragilidade da tentativa de mediação continuam, uma vez que setores da oposição jogam contra o diálogo.

Eleições no Peru

No próximo domingo, o Peru realiza o segundo turno das eleições presidenciais. Segundo pesquisas de intenção de voto, a candidata Keiko Fujimori tem cerca de 6% de vantagem sobre o candidato Pedro Paulo Kuczynski (economista de renome internacional nos círculos neoliberais, ex-funcionário do Banco Mundial e ministro durante do governo de Alejandro Toledo)

Será uma disputa entre o fujimorismo e o antifujimorismo, mas ambos pela direita. Após amenizar seu discurso na campanha para o primeiro turno (com promessas de respeito à democracia e aos direitos humanos), Fujimori mudou a estratégia e assumiu um tom mais conservador, que inclui apoio de lideranças homofóbicas e a promessa de flexibilizar a mineração clandestina. Analistas comentam também possíveis vinculações com o narcotráfico, frente à investigação de denúncias de envolvimento por parte de deputados de seu partido e assessores da campanha.

Ao dar o tom antifujimorista, Kuczynski tem reunido apoios diversos, inclusive da candidata de esquerda Veronika Mendoza, terceira colocada no primeiro turno, que na última terça declarou seu voto no candidato e prometeu fazer uma oposição fiscalizadora caso Kuczynski seja eleito. Na última terça, uma marcha contra Keiko reuniu milhares de pessoas em Lima.

Manifestações e greves contra reformas trabalhistas paralisam a França

Uma série de greves e mobilizações, convocadas pelos principais sindicatos da França, paralisa o país frente à reforma trabalhista imposta pelo governo de François Hollande.  Os protestos começaram no dia 31 de março, a partir da ocupação da Praça da República, por um movimento de jovens conhecido por #NuitDebout (com traços semelhantes ao movimento dos indignados espanhóis que deu origem ao Podemos). As ocupações e vigílias rapidamente se espalharam para outras cidades do país. Nos últimos dez dias, as ações dos sindicatos, organizados na CGT, expandiram-se e ganharam corpo com a paralisação geral e a presença de centenas de milhares de pessoas nas ruas, na última quinta-feira, 26 de maio.

O ponto mais sensível da reforma é o artigo que altera a forma de negociação coletiva, que dará primazia aos acordos por empresa e não mais por ramo de atividade econômica, o que fragiliza a posição negociadora dos trabalhadores. Além disso, a reforma facilita demissões sem justa causa, ao limitar o valor das indenizações, e reduz o pagamento de horas extras. Um dossiê completo da CGT pode ser acessado aqui (em francês).

O projeto do governo Hollande conta com o apoio de setores de seu partido (PS), do empresariado e de instituições como a União Europeia e o FMI. Pesquisas indicam que cerca de 70% da população são contra a reforma trabalhista e 60% apoiam os protestos e greves. A taxa de aprovação do governo Hollande está hoje em 15%.

A maior central sindical francesa (CGT) que reúne majoritariamente os sindicatos do setor público, está na linha de frente dos protestos. A segunda maior central, a CFDT, é favorável à reforma com algumas alterações.

No dia 26, inúmeros setores aderiram à convocatória de greve geral, com destaque para os caminhoneiros, ferroviários, controladores e empregados do setor de energia. As ações incluíram o bloqueio de portos, estradas e refinarias, o que gerou falta de combustível nos postos, problemas de abastecimento nos aeroportos, decretos de racionamento em vários municípios e obrigaram o governo a usar a reserva de emergência. Os trabalhadores também paralisaram a maioria das centrais nucleares do país, que são responsáveis por 75% da energia elétrica na França. Em diversos locais houve forte repressão policial e mais de uma centena de pessoas presas em Paris. Ainda no dia 26, os trabalhadores bloquearam a circulação de jornais que não publicaram o comunicado público da CGT (apenas o L’Humanité, tradicional jornal do Partido Comunista, circulou pelas bancas do país).

A partir desta semana, os sindicatos prometem aumentar as mobilizações diante da realização do torneio  Eurocopa, que começa no dia 10 de junho. Na quarta, teve início a greve dos ferroviários (linhas de longa distância e alta velocidade devem ser as mais afetadas), e, novamente, uma paralisação dos trabalhadores do setor elétrico. Nesta quinta, deve começar a greve do metrô e ônibus metropolitanos, e, na sexta, os controladores aéreos prometem uma paralisação de três dias.

O momento é de medição de forças. O Partido Socialista está dividido entre uma posição mais dura, liderada pelo primeiro ministro Manuel Valls (que ameaçava se demitir se o governo cedesse, mas começa a aceitar alguma mudança), uma segunda posição que defende uma negociação (um exemplo neste caso é o líder no Parlamento, Bruno Le Roux) e ainda um setor mais à esquerda, mais próximo aos sindicatos (no dia 12 de maio, 24 deputados da base socialista votaram a favor de uma moção de censura ao governo). O maior sindicato patronal afirma retirar seu apoio caso o governo faça concessões, e a CGT, por sua vez, demanda a retirada completa da reforma.

* As opiniões aqui expressas são de inteira responsabilidade de sua autora,
não representando necessariamente a visão da FPA ou de seus dirigentes.

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