Boletim de Análise da Conjuntura Econômica 3
Ano 1 – nº 03 – Maio 2016
Nível de atividade
Os indicadores divulgados mês de maio sobre o índice de atividade apontam para a continuidade da recessão brasileira. O IBC-Br, espécie de prévia do PIB calculado pelo Banco Central, apresentou queda de 0,36% no mês de março, após ter caído 0,33% em fevereiro. Com este resultado, o indicador soma uma retração de 1,44% no primeiro trimestre de 2016, com uma queda de 5,26% no acumulado nos últimos doze meses. Este foi décimo quinto recuo consecutivo do indicador, o que aponta para a profundidade da recessão que o país enfrenta.
Essa mesma retração pode ser observada no setor de serviços, que, de acordo com a Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apresentou queda em março, totalizando uma redução de 5,7% na comparação com igual mês de 2015. Essa queda, no entanto, é menos acentuada que a retração de 6,4% registrada em novembro de 2015, o que leva analistas do Instituto a acreditarem que talvez a retração continuada da atividade tenha chegado ao “fundo do poço”, podendo recuperar-se nos próximos meses. A expectativa de alguns economistas é que o volume de serviços prestados no Brasil apresente queda de aproximadamente 4% em 2016, contra uma retração de 3,6% ao final de 2015.
Diante deste cenário de continuidade da recessão, o governo interino assume com o grande desafio de reverter a tendência de queda ao mesmo tempo que promove o prometido ajuste fiscal. Há evidentes indícios, tanto nos indicadores de atividade setorial (como a do setor de serviços) quanto nas pesquisas de confiança empresarial, de que o momento mais agudo da crise está ficando para trás, independente da mudança de governo. O problema é que, neste momento de frágil recuperação, políticas fiscais e monetárias recessivas podem aprofundar a queda da atividade, reduzindo ainda mais o volume de emprego e renda. A aposta de que cortes de gastos irão dinamizar a economia se baseia em teorias superadas, o que não quer dizer que não haverá uma recuperação econômica gradual apesar das políticas recessivas. O que está em jogo, portanto, não é a capacidade da política econômica liberal de retomar o crescimento econômico, uma vez que essa retomada cíclica já é esperada; o que está em questão é quando isso ocorrerá, com qual intensidade e qual o tipo de sociedade que surgirá após esta recuperação: ao invés do crescimento econômico que promova o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e inclusiva, devemos ver uma recuperação do crescimento que sirva para a construção de uma sociedade crescentemente desigual e sem direitos.
Setor externo
De acordo com dados divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), as contas externas do país têm sofrido um forte ajuste, melhorando consideravelmente seus resultados. Com uma pronunciada queda das importações e recuperação das exportações, fruto da desvalorização cambial, a balança comercial brasileira registrou o melhor abril da história e fechou o mês com um superávit de US$ 4,861 bilhões. Em abril, as exportações alcançaram o montante de US$ 15,374 bilhões, crescimento de 1,4% a mais do que em abril do ano passado. Já as importações totalizaram US$ 10,513 bilhões. Em comparação com o mesmo período do ano anterior, as importações registraram queda de 28,3% e se mantiveram estáveis sobre março de 2016.
Gráfico 1 – Balança Comercial (Em US$ bilhões)
Números referentes aos quatro primeiros meses do ano mostram que o saldo comercial acumulou superávit de US$ 13,249 bilhões, revertendo o déficit alcançado no mesmo período de 2015, de US$ 5,059 bilhões. As importações tiveram queda expressiva nos setores de combustíveis e lubrificantes (38,1%), de bens de capital (36,8%), de bens de consumo (27,5%) e de bens intermediários (24,4%). O recuo das importações ocorre diante de um ambiente recessivo no país e de apreciação do dólar perante a moeda brasileira, o que eleva o preço dos produtos importados em comparação com os produtos brasileiros.
Quanto às exportações, cabe ressaltar que os produtos semimanufaturados encabeçaram o aumento das exportações (incremento de 6,9%), com principal destaque para catodos de cobre (370,3%) e açúcar em bruto (78,3%). No caso de produtos básicos, as exportações cresceram 2,5%, ou seja, US$ 7,739 bilhões. Tais números foram puxados especialmente pelo aumento das exportações de milho em grão (81,4%), soja em grão (39,4%) e carne suína (16,9%).
A despeito de taxa de câmbio mais favorável às exportações, a alta volatilidade do câmbio no mês de abril provocou resultados adversos à retomada do setor de manufaturados, que caiu 1,3% em abril e registrou US$ 5,433 bilhões. Neste grupo, as quedas mais expressivas foram motores e geradores, que caíram 27,3%, autopeças, com uma retração de 26,5%, óxidos e hidróxidos de alumínio, uma queda de 24,2%, e motores para veículos e partes, que registrou uma queda de 23,1%. Já as altas mais significativas para os manufaturados se deu nas exportações de torneiras e válvulas em 221,2% e automóveis de passageiro, com aumento de 67,6%.
Ademais, mais uma vez a economia brasileira tem se mostrado estruturalmente dependente do setor primário. Mesmo com queda dos preços da soja, esse setor registrou recorde no volume exportado. Embarques de soja em grãos no mês em abril foram os mais expressivos da história do país, chegando a um total de 10,1 milhões de toneladas. De fato, o país tem mostrado dificuldade de apresentar resultados positivos na pauta de exportações para além do setor primário da economia, que congrega menor valor agregado e dinamismo quando comparado à indústria manufatureira. Uma reversão deste quadro só será possível se houver uma articulação entre a politica macroeconômica (particularmente câmbio e juros) com a política microeconômica, em um ambiente estável e de planejamento de longo prazo. A melhoria do cenário da economia global, que até o momento permanece em recessão, assim como fortalecimento do comércio com nossos parceiros comerciais que demandam nossos produtos manufaturados (em particular os países latino-americanos), também é fundamental para melhorar os resultados da balança comercial e diversificar nossas exportações.
O governo Temer, no entanto, parece propor o caminho da valorização cambial (como instrumento de combate à inflação) e acordos comerciais com as grandes potências do Norte, que apenas demandam nossos produtos básicos. Neste cenário, o avanço das exportações deve perder fôlego, prejudicando a estratégia atual de retomada do crescimento econômico e se concentrando cada vez mais em produtos de baixo valor agregado.
Inflação e Politica Monetária
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), após desacelerar por dois meses, a inflação do mês de abril mensurada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou alta de 0,61%. No mês anterior a alta havia sido de 0,43%. Apesar disso, quando comparada com o ano de 2015 (abril com alta de 0,71%), a inflação do mês de abril de 2016 perde força. Além disso, embora o resultado tenha vindo acima do esperado pelo mercado, tal alta da inflação de abril é a menor para este mês desde 2013.
Gráfico 2 – IPCA Mensal (Variação Percentual)
No acumulado de 2016, os quatro primeiro meses apresentam uma alta de 3,25%. Em 2015, o acumulado para o mesmo período era de 4,56%. Em uma ótica de 12 meses (até abril), a inflação atingiu 9,28%. Este resultado é inferior ao acumulado de 12 meses do ano anterior, quando a inflação chegou a 9,39%.
Em uma análise setorial, medicamentos e alimentos foram os principais setores que puxaram a alta da inflação. Medicamentos registraram alta de 6,26% no IPCA, adicionando 0,20 pontos percentuais a taxa de 0,61% do mês de abril. A alta dos medicamentos impactou fortemente o grupo saúde e cuidados pessoais que teve uma significante aceleração da alta de 0,78% em março para 2,33% em abril. Alimentos, embora tenha registrado queda 1,24% para 1,09%, foi outro setor que teve significante impacto na inflação do mês, correspondendo a 0,28 pontos percentuais na composição do IPCA de abril. A tabela a seguir mostra o resultado de todos os grupos de produtos e serviços pesquisados.
Tabela 1 – Resultados dos grupos de produtos e serviços pesquisados
Conectando os dados aqui expostos com uma análise da política monetária adotada pelo Banco Central (BC), é esperado um viés de baixa da Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Na última reunião, em abril, a autoridade monetária havia optado em manter os juros básicos da economia estáveis em 14,25% ao ano. Embora passível de muitas críticas, o BC tem procurado “circunscrever” o IPCA aos limites estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em 2016. Esta diretiva visa trazer a inflação para um patamar abaixo de 6,5% e, também, convergir ao centro da meta de 4,5%, em 2017. Para forçar a inflação para dentro da meta, é possível que o novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, adote uma estratégia de cortes de gastos ainda mais acentuados (reduzindo assim a demanda pública e aprofundando a recessão) e combine com o Banco Central uma manutenção de uma taxa de câmbio mais apreciada, com o objetivo de reduzir mais rapidamente a inflação, apesar dos impactos negativos no crescimento e nas exportações já apontados no item anterior.
Indústria
De acordo com a Pesquisa Industrial Mensal (PIM) do IBGE, em março a produção da indústria nacional apresentou alta de 1,4% na comparação com fevereiro. Tal resultado mensal é o melhor em pouco mais de dois anos. A despeito da notícia positiva, a crise política e econômica ainda sobrepuja a economia brasileira. Neste cenário, em uma ótica trimestral, a produção industrial registrou queda acentuada. No trimestre passado este número retraiu 11,7%, pior resultado desde o primeiro trimestre de 2009 (-14,2%). Na comparação com o ano anterior, março apontou uma queda similar, de 11,4%, chegando à 25ª taxa negativa nessa base de comparação.
Dentre os setores divulgados pelo IBGE, a categoria de Bens de Consumo foi a que exibiu a maior alta no mês de março, ou seja, 3,2% sobre o mês anterior, porém fechando o primeiro trimestre com perdas acumuladas 9,8%. Já Bens de Capital, devido, sobretudo, à queda de 28,6% na fabricação de bens para equipamentos de transporte em março, expôs alta de 2,2%, encerrando os três primeiros meses com retração de 28,9%. Dos 24 ramos pesquisados, 12 registraram aumento em março.
A despeito de resultados díspares na comparação das bases mensal e trimestral, em perspectiva de tendência, a economia brasileira pode estar ensejando uma recuperação. Ou pelo menos perda da agudização da recessão. No entanto, em um cenário político e econômico (tanto doméstico quanto externo) extremamente adverso, são necessárias ações por parte do governo que sinalizem estabilidade da política econômica e um direcionamento no qual os preços relativos (câmbio e juros) possam ser utilizados para além do controle da inflação. Em outras palavras, torna-se imperativa a redução das taxas de juros e a manutenção de um câmbio favorável (depreciado) e menos volátil para competitividade da indústria nacional em mercados internacionais.
Conclusões
Este breve boletim de conjuntura buscou apontar a tendência de algumas das principais variáveis econômicas no último mês, assim como as perspectivas para os meses vindouros. Evidentemente a construção de cenários futuros é passível de grande incerteza, em particular em um momento em que assume um governo interino com as características do atual. Os desafios de retomada do crescimento e do emprego, queda da inflação, recuperação do tecido industrial e melhoria das finanças públicas não são compatíveis dentro de um modelo de desenvolvimento liberalizante, que exige um aprofundamento do ajuste fiscal (com efeitos deletérios sobre o crescimento e o emprego), o combate imediato à inflação (para o que deve se valer de uma taxa de câmbio mais apreciada, com efeitos negativos sobre as exportações e os investimentos produtivos) e a privatização de ativos públicos para empresas estrangeiras, retirando qualquer possibilidade de estratégia de desenvolvimento nacional autônomo.
Caso o governo Temer insista em apostar nesta estratégia, ilegítima e impopular, é necessário questionar quais seus efeitos na opinião pública nacional e no ambiente político, particularmente considerando estarmos atravessando um ano eleitoral. Do ponto de vista da economia, é necessário esperar para saber se a melhoria das expectativas do mercado financeiro, alinhada à estratégia de desenvolvimento liberal, será suficiente para levar os empresários a retomarem seus investimentos, ou apenas positiva no curto prazo para aqueles que possuem ações das empresas listadas em Bolsa. Ademais, mesmo sem uma recuperação das expectativas, é preciso se ressaltar que alguns indicadores econômicos já se mostram mais positivos no horizonte visível, o que é o caso evidente da inflação e do setor externo: qualquer melhoria continuada destes indicadores não terá relação direta com o novo governo, mas sim com as medidas já tomadas pelo governo Dilma, originalmente eleito.