Há cerca de duas semanas, vem ocorrendo o maior retrocesso que o país já viveu

Ano 1 – nº 09 – 25 de maio de 2016

O país vive, desde o dia 12 de maio, uma nova situação política, social e econômica, com o governo golpista de Temer. Há cerca de duas semanas, vem ocorrendo o maior retrocesso que o país já viveu. O programa do golpe tem como principais objetivos o desmonte do setor público e do Estado em prol do mercado e dos empresários, além da supressão de diretos previstos na Constituição de 1988 e a reversão das conquistas dos últimos 13 anos, com impactos catastróficos para a maioria da população. Não obstante, o governo golpista já passa pela sua primeira crise política, em um prazo muito menor do que o esperado, demonstrando a fragilidade da composição da nova coalizão de forças.

Vazamento de delação derruba ministro Romero Jucá, há menos de 15 dias no cargo

O início da segunda semana de mandato do governo ilegítimo revela a faceta golpista do impeachment. No início da semana de 23 a 29 de maio, a Folha de S.Paulo divulgou gravações de conversa entre o então ministro do Planejamento, Romero Jucá (PMDB-RR), e o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Machado temia que as apurações contra ele fossem enviadas ao juiz Sergio Moro, em Curitiba. Na sua visão, o envio do seu caso para Curitiba era uma estratégia para que ele delatasse e incriminasse líderes do PMDB.
As gravações da conversa de Sérgio Machado com Romero Jucá indicam que a queda de Dilma Rousseff era essencial para conter os avanços da Lava Jato e revelam um acordo em que a mudança de governo poderia parar as investigações da Operação. Segundo eles, a saída de Dilma promoveria o fim das pressões da imprensa e de outros setores pela continuidade das investigações da Lava Jato.

Em trechos da gravação, Jucá, um dos articuladores do impeachment de Dilma, e Machado deixam claro o golpe. Jucá diz que “Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria.”, ao que Machado responde que “a solução mais fácil era botar o Michel [Temer]… É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional”. Jucá acrescentou que um eventual governo Michel Temer deveria construir um pacto nacional “com o Supremo, com tudo”, por que “aí parava tudo”. “Delimitava onde está, pronto”, respondeu Jucá, a respeito das investigações. Com o que Machado concorda: “O Michel forma um governo de união nacional, faz um grande acordo, protege o Lula, protege todo mundo. Esse país volta à calma, ninguém aguenta mais.”

Além dos detalhes revelados entre Jucá e Machado, estão envolvidos Renan Calheiros e José Sarney, do PMDB, Aécio Neves, Aloysio Nunes, Tasso Jereissati e José Serra, do PSDB, os militares (que garantiriam o golpe e monitorariam o MST), o STF e o próprio Temer.

Jucá também é acusado, em outro inquérito no STF derivado da Lava Jato, de recebimento de propina da UTC, no valor de R$ 1,5 milhão, para viabilizar a campanha de seu filho, candidato a vice-governador de Roraima. No passado recente, Jucá teve uma “passagem relâmpago” no ministério da Previdência Social, de 22 de março a 21 de julho de 2005, durante o primeiro mandato de Lula. Na época, ele deixou o cargo devido a denúncias de fraudes relacionadas ao Banco da Amazônia. No começo da tarde, de 2ª feira, 23 de maio, o ministro do Planejamento e senador licenciado Romero Jucá (PMDB-RR), pediu licença do cargo e negou qualquer pacto para inviabilizar a Lava Jato. Jucá foi exonerado do cargo de ministro, após 12 dias de governo interino de Michel Temer.

Machado, foi indicado pelo PMDB para presidir a Transpetro, subsidiária da Petrobras, e o fez durante mais de dez anos (2003-2014). No STF, responde a inquérito sobre pagamentos a Renan Calheiros e Paulo Roberto Costa, no valor de R$ 500 mil.

A posição da base aliada e oposição perante as denúncias

O líder do PSDB na Câmara, deputado Antonio Imbassahy (BA), afirma que um dos itens para o PSDB dar seu apoio integral ao governo Michel Temer era a continuidade da operação Lava Jato, que não deveria ser parada sob hipótese alguma. Alega que o conteúdo da denúncia na gravação é preocupante, mas não é bombástico. Quanto à citação de líderes do PSDB, diz que é uma tentativa fracassada de envolver o PSDB (já citado inúmeras vezes em delações) na Lava Jato. Avalia que a investigação na operação não pode ser considerada um atestado de culpa.

O deputado Alberto Fraga (DEM-DF) considerou grave o conteúdo da denúncia, mas disse que não acredita em interferências no processo de impeachment. O líder do DEM no Senado Federal, Ronaldo Caiado (GO), afirmou que o povo saiu às ruas contra a corrupção, apoiando a Lava Jato em busca de um novo governo, e defendeu o afastamento de Jucá.

O senador Alvaro Dias (PV-PR) anunciou, na tarde de 2ª feira, 23, que o Partido Verde deixa a base do governo. Disse que a decisão de permanência de Zequinha Sarney no Ministério do Meio Ambiente tem caráter pessoal e pedirá que o filho do ex-presidente Sarney se licencie do partido.

O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), disse que Jucá deveria se afastar do cargo para a continuidade das investigações. O líder do PPS, deputado Rubens Bueno (PR), defendeu o afastamento do governo de todos os envolvidos na Operação Lava Jato, porque retira a crise do governo federal. Já o senador Cristovam Buarque, que também foi favorável à admissibilidade do impeachment, deu sinais de que poderá rever sua decisão sobre o impeachment mais adiante.

O líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), quer ouvir as explicações de Jucá para esclarecer esta questão. E afirma que a preocupação é trabalhar para que este fato não contamine o processo de votações tanto na Câmara quanto no Senado, para manter a agenda que é importante para o país.
A senadora Ana Amélia (PP-RS) afirmou que a Lava Jato deve ser defendida sempre, não é aceitável que o governo tente abafar a Lava Jato.

O senador João Capiberibe (PSB-AP) alega que o Brasil está contaminado pela corrupção e o governo Temer não tem legitimidade para fazer os ajustes necessários. O presidente interino não deveria sequer ter nomeado Romero Jucá e agora deve exonerá-lo imediatamente. Para ele, Temer deve procurar a presidenta afastada, Dilma Rousseff, e propor uma negociação, que passa pela realização de novas eleições em outubro para presidente, vice-presidente e também para o Congresso Nacional.

O vice-líder do PT na Câmara, deputado Paulo Pimenta (RS), acusou Jucá de oferecer a parlamentares a proteção das investigações em troca de uma mudança do governo. O líder do PT na Câmara, Afonso Florence, avaliou que o conteúdo “não surpreende” porque a “dimensão conspirativa do golpe era nítida”, a gravação fez a máscara do golpe cair. Atesta que há crimes de obstrução da justiça e ataque à democracia, mas que o ministro deve ter o direito de defesa. O senador Humberto Costa (PT-PE) afirma que a gravação é uma confissão, que esse golpe foi articulado para obstruir a justiça. Para Paulo Paim, senador (PT-RS), o processo de impeachment contra a presidenta foi uma operação abafa à Lava Jato.

A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) afirma que “Não foi preciso mais do que uma semana para a população brasileira ver o que está acontecendo no país e quais os verdadeiros objetivos do impeachment “.
O senador Telmário Mota (PDT-RR) considera que o procedimento do senador Jucá foi igual ao do senador Delcídio do Amaral, de obstruir as investigações. Na 3ª feira, 24, o PDT entrou com representação no Conselho de Ética do Senado para investigar suposta quebra de decoro do senador Romero Jucá (PMDB-RR).
O PSOL vai apresentar uma representação junto à Procuradoria-Geral da República pedindo à prisão de Romero Jucá por obstrução da Justiça. Segundo o líder do Psol na Câmara, Ivan Valente (SP), o processo de Romero Jucá deve ser análogo ao de Delcídio do Amaral e querem a prisão do primeiro, como aconteceu com o segundo.

Por fim, além de Jucá, o fato compromete também a Procuradoria Geral da República e o Supremo Tribunal Federal, colocando-os sob suspeita na condução da Lava Jato, uma vez que a gravação, feita em março e com duração de mais de 1h15min, estava em poder da Procuradoria Geral da República e do Supremo Tribunal Federal (STF) desde antes da semana que antecedeu a votação do impeachment na Câmara, em abril. Rodrigo Janot, além de ter conhecimento da gravação, que mostra como a corrupção atinge todo o sistema político, também conhecia a intenção do golpe e não tomou nenhuma providência sobre o desvio de finalidade do processo de impeachment, que culminou com o afastamento da presidenta eleita, Dilma Rousseff, do cargo. Se divulgadas antes, poderiam interferir no processo de impeachment e em seus desdobramentos.

Agora, mais do que nunca, está público que o golpe foi uma conspiração com o objetivo de destituir a presidenta eleita e também de obstruir as investigações sobre corrupção no Brasil, mostrando que o afastamento de Dilma foi feito para aplicar o programa de ajuste mais duro da história, com quebra das conquistas sociais, da Constituição de 1988 e dos direitos garantidos por ela.

* As opiniões aqui expressas são de inteira responsabilidade de sua autora,
não representando necessariamente a visão da FPA ou de seus dirigentes.

 

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