Promessa de campanha do Primeiro Ministro David Cameron no ano passado, a votação está marcada para o dia 23 de junho

Ano 3 – nº 41 – 9 de março de 2016
 

União Europeia e o referendo sobre a permanência do Reino Unido

Começou nas últimas semanas a campanha para o referendo sobre a permanência ou a saída do Reino Unido da União Europeia. Promessa de campanha do Primeiro Ministro David Cameron no ano passado, a votação está marcada para o dia 23 de junho. Após condicionar sua posição na campanha do referendo à negociação de um status especial para o Reino Unido na União Europeia, obtido em parte no mês passado, Cameron tem defendido a permanência do país na UE. Mas o partido conservador liberou o voto de suas lideranças, de modo que o gabinete de Cameron está dividido entre ministros contrários e favoráveis à permanência..

Durante as duas primeiras semanas, os debates foram dominados por temas relativos à segurança, emprego e crescimento econômico; pesquisas de intenção de voto apontam que 55% votariam pela permanência na UE, frente aos 45% que votariam pela saída.

A convocação do referendo pelos conservadores britânicos acontece num cenário de crescimento eleitoral do Partido pela Independência do Reino Unido (UKIP), com posturas de ultradireita que têm conquistado votos de críticos à imigração e à UE, que votam tradicionalmente nos conservadores.

Ocorre ainda num momento difícil para o processo de integração, com aumento de expressões de xenofobia em toda a Europa, com crescentes restrições à livre circulação de pessoas (um do pilares do projeto europeu), com crescimento eleitoral de partidos de direita e extrema-direita e com as dificuldades econômicas que persistem na região, sobretudo nos países do sul da Europa.

Para completar este quadro, desde o início do ano notícias apontam preocupações com bancos europeus. Após a explosão da crise econômica, a Europa criou novos produtos financeiros, espécies de derivativo que a princípio seriam destinados a absorver as perdas em caso de falência de instituições bancárias, de modo a evitar um colapso sistêmico. Os chamados títulos conversíveis contingentes são títulos convencionais de dívida dos bancos até que sejam chamados a compor o capital de uma determinada instituição bancária para absorver perdas que levariam à falência. Só em 2016 estes papeis perderam cerca de 20% de seu valor, dentre os quais títulos do Deutsch Bank, o que tem sido interpretado como temor de que os bancos não possam pagar os elevados juros atrelados a estes títulos.

Eleições primárias nos EUA

O processo de eleições primárias nos EUA para a nomeação dos candidatos presidenciais que ocorrerá nas convenções partidárias de julho tem sido destaque no noticiário internacional no último mês.

No campo republicano, a corrida pela indicação começou com 17 pré-candidatos e conta atualmente com quatro postulantes. Destaca-se entre as desistências a renúncia do governador da Flórida, Jeb Bush, cuja candidatura não decolou, apesar do nome de família, das volumosas doações de campanha e do favoritismo pré-campanha.

Os resultados das primárias simultâneas realizadas em onze Estados na Super Terça (1o. de março) consolidaram Trump num confortável primeiro lugar, contra as expectativas de desidratação de sua candidatura alimentadas pela máquina do partido republicano e por uma grande parte dos analistas. Contudo, nas últimas cinco eleições, realizadas no final de semana, a candidatura do segundo colocado, Ted Cruz, deu indícios de recuperação.

No momento, das vinte primárias realizadas, Trump venceu doze (conta com 384 delegados atualmente); Cruz venceu seis (300 delegados); e Marco Rubio, senador da Flórida e principal aposta dos republicanos tradicionais após a saída de Bush, venceu apenas duas (151 delegados). A rodada do dia 15 de março, com eleições em Ohio e na Flórida, será fundamental para consolidar o quadro republicano por dois motivos: nestas duas eleições o vencedor leva todos os delegados e estes são os estados de Rubio (Senador pela Flórida) e John Kasich (governador de Ohio, que não venceu nenhuma das primárias até agora).

Embora seu discurso violento contra os imigrantes dialogue com uma base política crescentemente radicalizada, Trump não é o candidato da máquina partidária republicana e tem apoio de pouquíssimos parlamentares e de apenas dois governadores. Os resultados das próximas primárias devem dar mais elementos para a estratégia republicana. Até o momento, o único consenso entre os opositores republicanos de Trump é evitar que ele alcance os 1.237 delegados necessários para a nomeação na convenção. Mas não está definido se para isso o caminho será fortalecer uma única candidatura ou fomentar a fragmentação de votos para que a disputa seja decidida na convenção.

No campo democrata, desde o anúncio no ano passado, a candidatura do Senador Bernie Sanders, com pautas bastante à esquerda da média democrata, tem sido menosprezada pela imprensa e só ganhou repercussão com o virtual empate na eleição no Estado de Iowa (que abriu a temporada de primárias) e a vitória significativa em New Hampshire. A maior parte da mídia narrou a Super Terça (quando onze estados estavam em disputa) como uma vitória acachapante de Hillary. Embora seja muito provável que a Senadora Clinton será de fato a indicada na convenção de julho, o espaço conquistado pela candidatura de Sanders é inédito, se consideradas suas posições políticas.

A convenção democrata é composta por delegados eleitos nas primárias e por “super delegados” (congressistas e lideranças partidárias). Estes delegados da máquina partidária têm liberdade de voto na convenção. Somando as duas categorias o total é de 4.763 votos, sendo necessários 2.383 votos para a indicação.

Até o momento, Clinton venceu doze das vinte primárias (conquistando 671 delegados) e Sanders venceu oito (476 delegados). Se somados aos super delegados que já declaram voto, Clinton alcançaria 1.129 votos frente a 498 de Sanders. Mas segundo algumas análises somar desde já os super delegados seria um viés pró-Hillary da cobertura jornalística, já que vários deles ainda não se comprometeram com nenhum candidato e mesmo aqueles que já o fizeram teriam liberdade, pelo menos segundo as regras, para mudar o voto.

É necessário também chamar atenção ao fato de que as tradicionais bases políticas dos democratas não são tão homogêneas, quanto a maioria das notícias supõem. No caso dos afro-americanos, por exemplo, embora Hillary tenha um apoio importante das mães do movimento Black Lives Matter (que tiveram seus filhos assassinados em casos diversos de violência policial), notícias indicam que entre os jovens negros o apoio a Sanders é maior. Intelectuais negros também tem se engajado na campanha do Senador e criticado a tendência de tratar os afro-americanos como uma comunidade monolítica. O mesmo vale para a questão de gênero, que tem suscitado amplos debates entre correntes feministas, como o feminismo liberal e o interseccional, com destaque aqui também para maior apoio a Sanders entre as mulheres jovens. Mesmo entre as mais fieis bases sindicais há fragmentação. Enquanto as lideranças sindicais e as centrais nacionais em sua grande maioria já declararam apoio à Senadora Hillary Clinton, muitos sindicalistas de base votam no Senador Bernie Sanders.

Há algum tempo, as eleições nos EUA têm apontado para uma crescente radicalização da base republicana, para um aumento do conservadorismo e mesmo para o crescimento de um perfil autoritário entre estes eleitores. No campo republicano a novidade é que um candidato fora do establishment, o bilionário Donald Trump, têm capturado estes votos. Pelo lado democrata, pesquisas recentes apontam que o Senador de Vermont venceria qualquer candidato republicano por uma margem maior que Clinton. Apesar disto, é muito provável que a Senadora Hillary Clinton consolide sua vantagens nas primárias nos próximos meses e obtenha a indicação oficial. Contudo, a novidade é o significativo espaço conquistado por uma candidatura com posições mais à esquerda que a média do partido (próximas às posições mais tradicionais da social-democracia), indicando que a polarização – até então mais visível no campo conservador – também está se fortalecendo entre o eleitorado mais progressista, sobretudo os jovens, ecoando movimentos recentes como o Occupy Wall Street e movimentos de jovens negros contra a violência policial.

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