I Reunião Ministerial do Fórum Celac-China
Há uma semana ocorreu em Pequim a I Reunião dos Ministros das Relações Exteriores do Fórum Celac-China, que foi lançado em julho do ano passado, durante a Cúpula de Brasília, após a reunião dos BRICS.
As relações comerciais entre a América Latina e Caribe e a China cresceram significativamente na última década: a corrente de comércio entre a região e o parceiro asiático passou de US$ 29 bilhões em 2003 para US$ 259,6 bilhões em 2013. A China também aumentou substancialmente seu investimento direto na América Latina e no Caribe.
O Plano de Cooperação 2015-2019 aprovado durante esta primeira reunião ministerial prevê o desenvolvimento de ações em 14 áreas. Dentre as várias medidas propostas neste plano de cooperação, destacam-se: a colaboração em temas relativos à governança da internet e segurança cibernética; a promoção de programas de treinamento para técnicos no gerenciamento e desenvolvimento de energias renováveis; a cooperação em agricultura familiar; iniciativas para a construção conjunta de parques industriais e zonas econômicas especiais; expansão da cooperação na área da indústria da informação; fortalecimento do diálogo intergovernamental sobre ciência e tecnologia; cooperação entre autoridades de aviação civil e a discussão de novas rotas aéreas; intercâmbios educacionais e o ensino de espanhol, inglês, português e mandarim; cooperação na área de mudanças climáticas dentro do arcabouço de cooperação sul-sul; colaboração nas áreas de proteção à biodiversidade, conservação das águas e combate à desertificação; compartilhamento de práticas na área de assistência social e combate à fome e à pobreza.
O mecanismo possui um caráter plurilateral, ou seja, as ações de cooperação podem envolver poucos países ou a totalidade dos membros da Celac. Conforme afirmou o ministro Mauro Vieira, o fórum é o primeiro mecanismo formal de interlocução da Celac com um país em desenvolvimento.
A formalização de um mecanismo regional pode potencialmente aumentar o peso da América Latina nas relações com o parceiro asiático. Isso porque, apesar da crescente presença chinesa na região, boa parte da cooperação vem sendo feita em âmbito bilateral.
Em termos políticos mais amplos, se consolidada, a iniciativa deve contribuir para as transformações rumo a uma ordem internacional de caráter mais multipolar e para uma institucionalidade internacional que reflita estas mudanças.
A segunda reunião ministerial do Fórum Celac-China está prevista para janeiro de 2018, no Chile.
O cenário pós-atentados na União Europeia
Uma semana após os atentados em Paris, multiplicam-se as análises e artigos sobre os acontecimentos e suas consequências. Em linhas gerais, a grande imprensa construiu narrativas dos fatos a partir de duas perspectivas: a liberdade de imprensa e o extremismo religioso. Embora seja clara a condenação absoluta aos atos de terror, análises mais criteriosas desconstroem as simplificações e apontam elementos mais significativos para a compreensão do problema. Dentre os vários fatores a serem considerados, podemos destacar: as disputas geopolíticas entre as grandes potencias no Oriente Médio e seus aliados regionais, tendo como consequência massacres e violências cotidianas contra as populações civis; o grande contingente de imigrantes de ex-colônias europeias e seus descendentes nascidos na Europa, historicamente marginalizados; a deterioração da coesão social com a redução de políticas de proteção social, agravado pelas consequências das medidas de austeridade contra a crise econômica.Embora estes fatores não expliquem diretamente os atentados terroristas, formam o caldo de cultura no qual têm fermentado não só o extremismo de grupos religiosos muito minoritários, mas também o crescimento do apoio popular a grupos radicais de extrema direita, como a própria Front National, na França, que foi o partido mais votado no país nas eleições de 2014 para o parlamento europeu. Desse modo, uma das consequências preocupantes dos atentados em Paris é justamente a capitalização política por parte da extrema-direita que já vem se fortalecendo nos últimos anos. Outro efeito temido é o aumento da vigilância generalizada por parte do Estado e a potencial violação de liberdades civis em nome do combate ao terrorismo.
Funcionários do alto escalão se reúnem na sexta-feira, 16, em Bruxelas para preparar novas políticas que serão apresentadas na Cúpula da UE em 12 de fevereiro, que deve ser dominada pela agenda de combate ao terrorismo. Dentre as possíveis medidas, está em discussão a aprovação do chamado registro de nomes de passageiros (PNR), sistema de armazenamento de informações pessoais e dados de viagem de milhões de cidadãos. A UE já oferece estes registros para o EUA por meio de acordos bilaterais, mas a aprovação do mecanismo no bloco tem sido bloqueada pelo Parlamento Europeu desde 2013. Além disso, deve aumentar a pressão pela reintrodução de algum tipo de controle de fronteiras e a revisão do espaço de Schengen, que constitui a zona de livre circulação de pessoas e representa um marco no processo de integração europeia.
Breves comentários sobre a Nigéria
Enquanto o mundo se mobiliza legitimamente em solidariedade a Paris, os atentados nas periferias do planeta, como o assassinato de dois mil nigerianos (números divergem entre 2 mil e 3 mil) na primeira semana de 2015, pelo Boko Haram, são pouco noticiados.
No Brasil, a narrativa veiculada pela imprensa, que reproduz a cobertura da mídia estadunidense e europeia, explica a violência na Nigéria a partir do caráter extremista do grupo, que teria ligações com a Al-Qaeda e a intenção de implantar um Estado fundamentado na lei islâmica.
O Boko Haram surgiu na província de Borno em 2002, a partir de ideias islâmicas puritanas, com a simpatia da população urbana pobre e com apoio político do ex-governador da região em sua disputa com o governo nacional. O grupo também contaria com simpatizantes dentro do exército nigeriano e do governo central. Assim como em outros casos, tensões sociais, poucas oportunidades econômicas e interesses políticos forneceram o contexto para o florescimento do extremismo religioso. O Boko Haram atraiu atenções em abril do ano passado, quando sequestrou mais de 200 meninas, que seguem sob poder do grupo. Estima-se que desde 2009 tenham assassinado cerca de 10 mil pessoas.
Não há muitas informações sobre suas conexões e apoiadores, mas sua radicalização tem sido explicada a partir de dois fatores: o descontentamento de elites do norte com a ascensão do atual presidente Goodluck Jonathan (o que foi considerado uma quebra no acordo de exercício rotativo da presidência por representantes das regiões norte e sul do país) e, sobretudo, o interesse de atores regionais e internacionais, incluindo multinacionais da indústria do petróleo, nas ricas reservas na divisa com o Chade, região hoje sob domínio do Boko Haram, o que tem atrasado a exploração do lado nigeriano da fronteira.
Atualmente o Boko Haram administra um território equivalente à Costa Rica, no qual vivem 1,7 milhão de pessoas.
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