O adeus a Mandela e o Congresso do PT

O Congresso do PT coincide de ocorrer na semana de homenagens derradeiras a serem rendidas a Nelson Mandela.

Os funerais de Mandela começam no dia 10 e só se encerram no dia 15, quando o líder sul-africano será enterrado. A despedida inclui a exposição do heroi popular à visitação pública, no Estádio de Soweto, o legendário bairro da luta antiapartheid, e velório na sede de governo de onde Mandela presidiu a África do Sul, de 1994 a 1999. Os dois espaços simbolizam perfeitamente o salto vivido pelo Congresso Nacional Africano, o partido de Mandela, desde a mobilização das ruas até a conquista da Presidência da República.

Por trás da apoteose suscitada pela morte do ex-presidente sul-africano, a África do Sul e seu partido forjado na luta antiapartheid vive contradições que não desfazem seu passado, mas exigem um novo salto. O CNA já não conta com Mandela para essa tarefa.

Enquanto isso, o Partido dos Trabalhadores realiza a primeira etapa do seu 5º Congresso Nacional em Brasília, nos dias 12 a 14 deste mês. A tônica do encontro é o balanço da presidência Dilma Rousseff e a crítica ao sistema político-eleitoral brasileiro, que estimula a corrupção e dificulta o sentido programático da ação governamental, na medida em que exige supermaiorias muitas vezes incoerentes, do ponto de vista programático. É a oportunidade também, como o próprio Partido antecipa, de uma autocrítica da “burocratização” experimentada ao longo de sua vida institucional. A crítica ao sistema político e à burocratização contextualiza também o ato de desagravo, marcado para a sexta-feira (13), em “solidariedade aos companheiros injustiçados”, condenados no STF pela Ação Penal 470.

Um ponto central da crítica do PT ao sistema político brasileiro reside no financiamento empresarial de campanhas. O Supremo Tribunal Federal (STF), que foi palco de discursos inflamados de ministros que se alinham à velha estirpe dos udenistas, os quais, vez por outra, são citados naquela Corte como se nisso houvesse qualquer sinal de erudição, tem uma prova de fogo pela frente. A verve moralista terá que versar sobre a ação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que propõe declarar a inconstitucionalidade do financiamento de pessoas jurídicas (empresas e organizações em geral) a campanhas eleitorais. A OAB quer também que sejam estabelecidos limites mais baixos para o financiamento de campanha. O STF pode optar por promover uma mudança importante na política brasileira ou se acomodar ao papel condenatório, na medida em que devem ser expedidos, até esta mesma sexta, os mandados de prisão do ex-deputado Roberto Jefferson e do deputado Pedro Henry.

Caso tome decisão favorável à ação impetrada pela OAB, o Judiciário pode dar uma mostra de que é capaz de promover mudanças institucionais que o Congresso tem se esquivado de realizar. É mais um ponto a ser analisado profundamente por todos os partidos. Se as instituições políticas do Executivo e do Legislativo não forem capazes de protagonizar uma agenda ousada de reformas da política nacional, essa agenda pode se cumprir às avessas – no caso, pelas mãos do poder menos representativo de todos – quiçá, da pior forma possível.

Análise: Antonio Lassance, Doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília