Dois pesos, duas medidas

Em uma semana fraca na agenda do Executivo e Legislativo, o centro das atenções fica concentrado no chumbo grosso a ser trocado entre PT e PSDB em relação ao escândalo do propinoduto tucano, de um lado, e do mensalão, de outro. O PSDB acusou o golpe e tenta desviar o foco das graves acusações que pesam sobre o partido e que envolveram o alto tucanato. Sua resposta é a tentativa de derrubar o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. A reação dos petistas, em defesa do ministro, pode levar a um embate mais radicalizado e a uma resposta pública mais dura, de forma a repercutir mais enfaticamente o escândalo que atravessa gerações de governos do PSDB em São Paulo.

Enquanto a semana se desenrola sob a expectativa de uma decisão definitiva de Joaquim Barbosa sobre a situação de José Genoíno, a partir do recebimento do laudo médico sobre sua condição de saúde, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) acabou por suscitar um contraste absurdo. Ao fazer a troca do juiz de execução penal que cuida do caso no DF, em busca de alguém “mais duro”, encontrou sua solução perfeita em um juiz que, por acaso, é filho de um alto dirigente do PSDB-DF, o qual integrou o governo de José Roberto Arruda, no Distrito Federal, tendo sido considerado por muitos seu mais fiel aliado. Justamente o governo que foi flagrado na operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, que revelou o que se tornou conhecido como o “mensalão do DEM”. É bom lembrar que Arruda era egresso do PSDB, tendo sido líder do governo no Senado durante o governo FHC. Renunciou para não ser cassado, no escândalo do painel do Senado, e retornou à política como deputado federal e, depois, como governador, eleito pelo DEM e trazendo o PSDB para seu governo.

Também por acaso, a Caixa de Pandora completa 4 anos nesta semana. A 27 de novembro de 2009, a Polícia Federal expôs um farto conjunto de provas materiais do esquema de desvio de dinheiro público. O próprio José Roberto Arruda foi flagrado em vídeo recebendo dinheiro vivo – é a isso que se chama apropriadamente de “domínio do fato”. O contraste é que, até agora, Arruda continua livre, leve e solto. Ficha limpa, ele pode inclusive concorrer às eleições do ano que vem. Filiado ao Partido da República (de Waldemar Costa Neto e Anthony Garotinho), Arruda conversa sobre alianças para 2014, no DF, com o PSDB, o PPS e o DEM. Detalhe: ao contrário da AP 470, o processo do mensalão do DEM foi desmembrado. O único que responde atualmente em instância superior é um conselheiro do Tribunal de Contas do DF. Com isso, a maioria dos denunciados, a começar por Arruda, responde ao processo em primeira instância, não recaindo na Lei da Ficha Limpa, que exige condenação pelo menos em segunda instância.

Nesse sentido, os quatro anos de impunidade daquele que foi apontado como chefe do mensalão do DEM esbofeteiam o rigor seletivo de Joaquim Barbosa e o caráter da AP 470 como julgamento de exceção. A agenda congressual e a movimentação dos partidos Na Câmara, a proposta de marco civil da internet continua sem acordo, trancando a pauta de votações. A possibilidade de outras prisões serem decretadas sobre condenados do mensalão (inclusive parlamentares) reacende o debate sobre o processo de cassação de mandatos. Debate, por sua vez, travado até que o Senado vote a PEC que institui o voto aberto, que se arrasta sem consenso, mas que pode ser votada nesta terça (26), com a pressão redobrada pelos novos pedidos de cassação de parlamentares. O PT do Rio de Janeiro pode sacramentar sua saída do governo Sérgio Cabral (PMDB-RJ). O PSOL realiza seu 4º Congresso Nacional (de 29 a 1º de dezembro, no Distrito Federal) e pode já definir o nome de seu pré-candidato a presidente. O PSB abre a temporada de caça a ideias para compor seu programa de governo, em uma plataforma virtual (literalmente).
Análise: Antonio Lassance, Doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília