José Dirceu foi o segundo convidado do entrevistaFPA, novo programa da Fundação Perseu Abramo conduzido por Marcio Pochmann

Por Cecília Figueiredo

“Não se iludam vou continuar sendo o Zé Dirceu do PT”, disse o ex-ministro da Casa Civil no governo Lula, José Dirceu, em entrevista à tevêFPA. A afirmação refere-se ao julgamento de Dirceu na Ação Penal 470 no Supremo Tribunal Federal (STF), marcado para esta quarta-feira, 11. Tranquilo, Dirceu afirmou também que este “é mais um capítulo, não o último, porque ainda cabem recursos”.

A entrevista à tevêFPA, que bateu recorde de acessos, foi conduzida pelo economista Marcio Pochmann, presidente da Fundação Perseu Abramo (FPA), na manhã desta terça-feira, 10, e transmitida em tempo real pela Internet.

Acompanhado pelo filho, Zeca Dirceu, e por assessores, no auditório da FPA, o mineiro de Passa Quatro, que também é membro do Grupo de Conjuntura da FPA, respondeu às dezenas de perguntas enviadas por internautas, fez balanços da conjuntura política nacional e internacional, e advertiu como elementos-chave para o avanço da democracia que o Brasil passe por “reforma política, tributária e do judiciário”.

Personagem histórico da luta pela democracia no Brasil, Zé Dirceu valorizou as manifestações da juventude, iniciadas em junho, como um “novo desafio”. “Lógico que a juventude brasileira tem novos sonhos e esse é o desafio futuro dos novos políticos”. O ex-ministro reconhece os avanços no campo social para o combate à pobreza, nos últimos dez anos, mas acredita que é preciso “reequilibrar o poder”.

Para isso, Dirceu defendeu a reforma política, como medida para haver um reequilíbrio eleitoral e superar a crise por que passa a democracia representativa. “As campanhas no Brasil são muito caras, o sistema político é dominado pelo dinheiro, induz à busca por financiamento privado; existe um sistema muito desequilibrado”.

"Vou continuar sendo o Zé Dirceu do PT”, diz ex-ministro em entrevista à tevêFPA

Nesta terça-feira, 10, programa entrevista FPA ouviu Zé Dirceu

Balanço
Ao fazer um balanço dos últimos 10 anos do governo do PT, o ex-ministro avalia que o Brasil se mostrou à altura de vencer as desigualdades e se projeta como país capaz de avançar na gestão pública. “Nesta década se aprofundou muito a pobreza e desigualdade em várias partes do mundo, mas temos desafios novos no Brasil”.

Segundo o petista, os partidos de direita são os únicos a não reconhecerem esse progresso. “A direita brasileira está sem discurso no momento, está com o discurso no passado”, disse ele. “Ela não consegue pensar no Brasil como ele é. O Brasil é uma grande nação, e a direita brasileira não vê o Brasil como uma grande nação.”

Também falou sobre a necessidade de discutir o papel do Legislativo e criticou a omissão do Congresso ao não propor uma reforma política. Ele defendeu a proposta de plebiscito, feito pela presidente Dilma Rousseff, em resposta aos protestos de junho.

Ele também desmitificou velhos conceitos, utilizados pela elite econômica. Um deles, a respeito da carga tributária, que hoje está em 34,5%. “Se nós precisamos de recursos….. O problema não é que é alta, mas não está direcionada para educação, SUS e mobilidade – grandes demandas do País que foram gritadas nas ruas”. E defendeu a reforma tributária, para que haja investimentos em serviços públicos, como saúde e educação. “Não é justo que quem ganhe menos, pague mais”.

O ex-ministro reconhece os esforços que o governo tem feito para enfrentar a miséria, com programas como o Bolsa Família, e se diz confiante na questão dos royalties para saúde e educação. Outro exemplo desse esforço está no programa “Mais Médicos”.

Dirceu também ironizou com o discurso elitista contrário ao programa federal de investimento no SUS. “Eu percorri várias cidades do interior, que os prefeitos ofereciam R$ 10 mil, R$ 12 mil, além de casa, para fixar médico, e nem assim conseguiam fixar. Eles dizem que não adianta trazer médicos, pois não há infraestrutura”. Ele reconhece problemas na infraestrutura e necessidades de avançar na gestão, “temos que enfrentar, mas faremos com os médicos”.

Mente viva e coração tranquilo
Ao ser perguntado sobre como os últimos oito anos refletiram em sua vida, Dirceu demonstrou serenidade e não desviar do foco. “Vou continuar defendendo o PT e nossos governos. Meu objetivo central é o Brasil. Sempre foi assim, a política, o Partido, a democracia. Em 2015 dedico 50 anos da minha vida ao Brasil e 30 anos ao PT. Fui transformado em símbolo de todo o ressentimento contra os que mudaram o país, mas não perco o foco da luta. Nesse último período, não deixei de ser militante político. Estudei, trabalhei, aprendi muito, apesar de terem feito de tudo para que eu não pudesse trabalhar, mesmo sem nada que provasse algo contra mim. Aceitaram uma denúncia. Sou réu no STF e amanhã teremos mais um capítulo, não o último, porque ainda cabem recursos e vou recorrer às cortes internacionais”, completou.

"Vou continuar sendo o Zé Dirceu do PT”, diz ex-ministro em entrevista à tevêFPA

Sereno, Dirceu declarou que continua defendendo o PT e seus governos

Dirceu disse desconhecer alguém que tenha enfrentado campanha tão intensa, mas aposta que as mudanças promovidas no Brasil pelos governos Lula e Dilma, tiveram impacto nessa ação. “O ódio é contra nós [PT]. Mas me sinto muito seguro no meu futuro. Com humildade, mas muito forte; sou responsável por muitos erros, mas não os que me acusam”, disse o mineiro que veio para São Paulo, onde viveu parte da juventude num Brasil sob ditadura militar.

Corintiano, José Dirceu comemora obstáculos que superou, a versatilidade que o ajudou a sobreviver em momentos difíceis, mas acima de tudo ser brasileiro. “Queriam que eu deixasse o Brasil na época da ditadura e eu fiz questão de voltar, porque essa é a razão de minha vida. A minha natureza é natureza política”, declarou, ao advertir aos opositores: “não se iludam vou continuar sendo o Zé Dirceu do PT”.

Fotos: Marcio de Marco e Sérgio Silva

 

Acesse abaixo os links da entrevista na íntegra, dividido em quatro partes.