A política da cultura e a cultura com política – notas sobre novos atores e o debate acerca do “vazio da cultura”
Por Paulo Ramos
As mobilizações recentes têm feito alguns reconhecerem a confusão na qual outros há muito já se encontrava. Pudera. Afinal, muitas algumas coisas importantes mudaram, novas configurações de classe, “novos atores entrando em cena”, novas organizações. há uma rearticulação de valores, com negação de uns e emersão de outros. Bem como ocorre com renda, o crescimento da classe trabalhadora e uma nova configuração desta. Mas a confusão não começou aí, é um tiquinho mais antiga.
Para ilustrar o que falo, convido o leitor a revisitar e refletir sobre os debates sobre cultura e política que ainda neste ano ocupava revistas, jornais e blogosfera. Já havia um tanto de coisa velha recalcitrando e outras coisas novas a despontar.
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O que faz apegarem-se um marxista da Universidade de São Paulo e um Nobel de literatura defensor de Margareth Thatcher? As cenas atuais do debate acerca de cultura e política, suas formas elitizadas de pensar a produção artística e suas relações com a sociedade e com a política.
Recentemente houve um debate suscitado pela revista Carta Capital a respeito do cenário de produção e criação artístico-cultural no Brasil. De um lado, temos os críticos do momento atual, dizendo que existe um “vazio” cultural e que as coisas vão de mal a pior. De outro, há os menos catastrofistas que dizem que existem tantas coisas boas que é impossível acompanhá-las, ou que as coisas boas podem ser vistas hoje como puderam ser vistas no passado; basta procurá-las.
Do lado dos que desprezam a atualidade, eu diria que vemos o namoro com os grandes cânones, o flerte com as linhas consagradas, o reconhecimento de uma alta cultura – que não necessariamente “de elite” – e necessidade de uma releitura clássica. Já entre os meramente satisfeitos com o dia de hoje haveria os que estão atentos aos movimentos ligados a uma certa cultura popular, às novidades de mercado, ou a adesão à produção underground.
De minha parte, eu reconheço que há muita coisa hoje que pode dar aversão, desgosto ou desesperança no futuro – por exemplo, a canção Camaro Amarelo ser premiada como a melhor música do Ano pela Rede Globo de Televisão. Mas a década de transformação pela qual o Brasil passou deve levar-nos além dessa instintividade pelo pessimismo. Então, maior estranheza me causa ler um discurso catastrófico como se nada que é produzido hoje em dia prestasse; como se nada do que está posto no rádio, na TV, nos jornais, na internet etc. carregasse uma nesga de fertilidade inteligente.
Um dos argumentos colocados na discussão é uma réplica de Vladimir Safatle1, professor de filosofia da USP e colunista da Carta Capital, em que ele procura politizar a questão da cultura relacionando-a com a luta de classes. Como uma emenda ao soneto que não fora compreendido, ele levou um novo elemento à discussão, qual seja, a do uso mercadológico da ideia de “popular” pela indústria cultura. O que, sempre isso houve, desde Noel Rosa, pelo menos.
Mas ele não descarta o centro de sua argumentação. “É fato, porém, que a cultura brasileira há tempos não consegue criar continuidades, sequências de trabalhos que fazem a linguagem artística avançar e que fornecem aos novos artistas um horizonte de exploração.”
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Safatle, como acadêmico que é, não deve ter esquecido que linearidade, continuidade, sequências e coisas do gênero, não são palavras que interessam ao processo criativo. Muito menos ao gosto ou ao belo. Linearidade, coerência são coisas que importam ao especialista. Poderíamos perguntar até: quem é que precisa de linearidade?
Por outro lado, ainda, quem está dizendo que tais coisas não existem hoje em dia? Que linearidade e coerência são essas? Não foram os tropicalistas que se deram este nome para demonstrar ordenamento interno; foi um jornalista que os reuniu e fez o “bem bolado”.
Eu diria que dois elementos de sua argumentação correm grandes riscos de estarem equivocados: o central e o residual. Seja o de que não há linearidade (coerência etc), seja a relação estabelecida entre o que é produzido culturalmente e a política dos dias atuais. Ainda que estejamos passando por grandes transformações na sociedade brasileira, uma compreensão atual dos problemas políticos atuais não pode fazer uma alusão tão direta e empobrecida à Rússia Revolucionária.
Talvez valha a pena tentarmos uma busca por relações e diálogos criativos na cultura brasileira, pois as rimas tão precisas quanto previstas e coerentes de um verso alexandrino não são realmente a tônica de nossos dias. A haute culture não anda fazendo escola por aqui. Não foi um balé clássico que fez de Dois Filhos de Francisco um belo filme, mas o Cisne Negro pode inspirar um B.Boy do Hip Hop. Mario Quintana pode inspirar um M.C. e uma orquestra sinfônica pode tornar um pagode mais bonito.
Se buscarmos uma linearidade, que tal pensarmos em Tropicália – Jorge Ben Jor – Racionais MC’s – O Rappa – Paulo Lins – Ferrez – Emicida – Criolo – Caetano Veloso? Não vêm da Europa ou falam alemão, e ainda falam de coisas sujas, o crime, macumba… Além de falarem de amor, cotidiano, problemas sociais etc. As conexões não são mais com a Europa, a não ser que seja com o rap das periferias de Paris ou com o punk das periferias de Londres, com o Caribe, com a África.
Outra emenda de Safatle pode ser “o problema não é a universidade que não ouve hip-hop (o que está longe de ser verdade), mas a periferia que não tem o direito de conhecer John Cage”. Quem disse que não? Como sabe-se que não conhece? Aliás, quem e que conhece? Dito assim, parece como um fato consumado e ponto. Será que ele sabe o que já leu o Emicida (cuja principal referência, segundo o próprio, é o Mario Quintana)? E os caras do O Rappa, será que ele tem a vaga ideia de onde eles vão buscar elementos pra tanta sonoridade da poesia cantada. E os que estudam os criadores dos afrescos modernos do grafite que embelezam as ruas da cidade e espalham arte pelo espaço público? E os saraus que ocorrem nas periferias de São Paulo, estão a vista destes “analistas”? Argumentos como os que circulam entre Mario Vargas Llosa só fazem reincidir na invisibilidade de setores desprestigiados e pauperizados.
É preciso saber que “a poesia não se perde, ela apenas se converte pelas mãos no tambor”, como canta O Rappa2. As novidades, mesmo as da cultura, não precisam estar incrustadas no passado de cânones dos teatros municipais. Mas anterior a esta compreensão, é preciso da atitude de olhar para Brixton, Bronx para a Baixada Fluminense e reconhecer que há algo que se ver lá. Caso contrário, anterior a esta compressão e à superação desta inviabilidade, qualquer soneto produzido por uma compreensão colonizada sempre precisará de emenda, e todo pas de deux será um tropeço.
O que alguns críticos-críticos precisam fazer é perguntarem-se a respeito de suas próprias referências. Até mesmo porque a ideia de cultura tem sido reelaborada3, não é mais um conjunto de regras e padrões e estruturas fixas e rigidamente ordenadas; mas cultura passa a ser entendida como a capacidade de criticidade, de escolha e de criatividade.
O problema do “vazio” não está na cultura. O vazio é da crítica que, soberba, eurocentrada e colonizada, não consegue sair do dilema da luta de classes ancorada na institucionalidade do Estado ou nos modos de produção. Azar dos críticos, eles não verão a noção de espacialidade renovada que eles apresentam, não saberão das conexões com a África que percorrem desde o Ilê Aiyê – Jorge Ben Jor – Hip hop que edificam uma identidade diaspórica que é construída há tempos.
Existe um diálogo entre diversos níveis, entre Criolo e Chico Buarque, entre o Rap e o Jorge Ben Jor. Entre a chamada cultura clássica e o que há de mais atual e subalternizado. Este diálogo produz formas e conteúdos, é complexo na forma e inovador na ética. Está presente no cotidiano e se manifesta na política.
Mas os padrões dos analistas que se nos dispõem não conseguem chegar neste nível do “funcionamento” da sociedade. Eles precisam descolonizar seus olhares para verem que a cultura está preenchida por manifestações que não se enquadram nos seus modelos de análises. Transformações na realidade exigem revisão de parâmetros conceituais.
Tal perspectiva não dá visibilidade a todos os eventos, por mais próximos que sejam fisicamente. Por exemplo, em fins de 2011, Emicida foi premiado na MTV e para receber seu prêmio ao vivo levou consigo uma bandeira do MST e fez questão de envolver-se nela. Na mesma ocasião, solidarizou-se com os moradores do bairro do Pinheirinho, que estavam em processo de expulsão pelo governador Geraldo Alckmin. Da mesma época, outra artista, Gabi Amarantos, defensora da região Norte, fez questão de assinalar sua representatividade com o desenvolvimento promovido pelo Governo Lula. Ainda, a última premiada pela Rede Globo de Televisão no seu Reality Show para cantores premiou uma mulher negra lésbica, feminista engajada, conhecida e reconhecida em Brasília e do “povo do Rap”, ex-backing vocal do Rapper GOG.
É preciso reconhecer, portanto, que há mais matizes geradoras de significado e de política além daquelas ligadas aos meios de produção e as estruturas institucionais. E que isso não é uma coisa nova, pois mesmo os chamado novos movimentos sociais já adiantaram este corte fundamental, trazendo fatores identitários e territoriais para a produção de política.
Mas os analistas atuais não veem isso. Por isso, por enquanto, um filósofo da Universidade de São Paulo seguirá prostrado ante o vazio da (sua) cultura. Ele foi até a “realidade” da Rússia da Revolução Socialista para justificar sua leitura, justamente porque a realidade de Moscou de 1917 é mais próxima dele do que o Grajaú paulistano de 2013. Da mesma forma Wall Street (que tem por sua equivalente a Avenida Paulista) chega-lhe facilmente aos olhos, mas as manifestações engajadas das conexões entre maracatu e música pop não comporão seu cenário.
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O debate circulou, poderia dizer, entre as publicações de esquerda. Mas este descontentamento aparece na outra ponta do espectro. O ganhador do prêmio Nobel de literatura Mario Vargas Llosa esteve passando entre alguns canais nacionais e destilou sua desesperança. Cerca de dois anos atrás, setores conservadores pareciam estar indignados com a falta de indignação do povo brasileiro em relação à impunidade e à corrupção.
Perguntavam: Por que o povo brasileiro não vai para as ruas protestar?
Sim, pois, vejam, em outros países, violência policial, ausência de direitos e necessidade de políticas sociais causam revoltas, segundo noticia a imprensa brasileira: os tumultos na periferia parisiense em decorrência da morte de dois jovens4, em 2005; uma greve estudantil de 120 dias que derrubou um primeiro ministro na província do Quebec5, em 2012; a série de protestos em Londres, em 2011, pela morte de um homem negro de 29 anos6. Isso sem contar a chamada Primavera Árabe que provocou uma onda de virada nos regimes políticos no norte da África, os Indignados da Espanha e no Occupy Wall Street.
Muitos jornalistas tentaram responder a esta questão capciosa em vão. O grande problema que une os dois “inconformados” é o campo ao qual seus olhares estão dedicados: os problemas que inflamam as pessoas e as fazem ir para as ruas não estão conectados com Madrid, Nova Iorque, Paris.
A cada nova divulgação das estatísticas sobre homicídios no Brasil a mesma informação é dada: morrem por homicídio, proporcionalmente, mais jovens negros do que jovens brancos no país7. De cada três jovens assassinados por arma de fogo, dois são negros. Além disso, vem se confirmando que a tendência é um crescimento desta desigualdade nas mortes por homicídios, que a sociedade civil organizada (o movimento negro, em especial o movimento de juventude negra) vem a classificar como “extermínio” ou “genocídio”.
Existem hoje no Brasil, dezenas de coletivos, grupos, comitês contra o Genocídio da “População Negra”, “Juventude” e/ou “Juventude Negra”. Tais coletivos estão conectados pelas organizações que compõem tais agrupamentos, pelos problemas que procuram enfrentar e ainda mais: por uma linguagem própria que conecta-se a um imaginário forjado não necessariamente onde encontrar-se-ia a Alta Cultura.
“60% dos jovens de periferia sem antecedentes criminais já sofreram violência policial, a cada quatro pessoas mortas pela polícia, três são negras; nas universidades brasileiras apenas 2% dos alunos são negros; a cada quatro horas um jovem negro morre violentamente em São Paulo”. Este texto não é uma resenha de pesquisa publicada na Folha de São Paulo nem em uma revista semanal. É uma epígrafe do Rap “Capítulo 4, Versículo 3”, dos Racionais MC’s, do ano de 1998 (“Um nove nove sete, depois de Cristo”), mas os dados poderiam ser usados para descrever os dias de hoje e mesmo aqueles que conhecem as pesquisas não questionariam. Os dados que surgem na troca urbana acompanhada de graves e scratchs poderiam ostentar alguma manifestação frente à Secretaria de Segurança Pública de qualquer unidade federativa brasileira.
Tempos antes, no disco Escolha seu Caminho8, eles diziam: Se acomoda então, não se incomoda em ver/ Mesmo sabendo que é foda/ Prefere não se envolver/ Finge não ser você/ E eu pergunto por quê ?/ Você prefere que o outro vá se foder./ Não quero ser o Mandela/ Apenas dar um exemplo/ Não sei se você me entende/ Mas eu lamento que/ Irmãos convivam com isso naturalmente/ Não proponho ódio, porém/ Acho incrível que o nosso conformismo/ Já esteja nesse nível/ Mas Racionais, diferentes, nunca iguais/ Afrodinamicamente manter a nossa honra viva/ Sabedoria de rua / O RAP mais expressiva/ A juventude negra agora tem a voz ativa”.
Sem pretensão de estabelecer a tão procurada relação de causa e efeito, coerência ou linearidade, vinte e poucos anos depois, a chamada juventude negra evocada nos versos acima e que precisava de uma “voz ativa”, possuiu diversas organizações Brasil afora, é tema em Conselhos Nacionais de participação Social e é até objeto e sujeito das políticas públicas, nomeando mesmo um plano nacional da Secretaria Nacional de Juventude, o Juventude Viva – Plano de Prevenção à Violência contra a Juventude Negra.
Racionais MC’s não falam por todos, mas está arraigado no imaginário juvenil de mais uma geração até9. Não apenas pela sua origem social, mas pela capacidade de traduzir e ecoar cotidianos, expectativas e outros sentimentos. O grupo está na esteira por onde correm as maiorias das pessoas do Brasil e as minorias dos direitos políticos e sociais, mesmo que os dias atuais sejam de maior esperança para estes. Crescimento da renda per capita dos brasileiros pode ser interpretado como o centro da problemática dos estratos sociais ascendentes. O rap tem acompanhado isso. Mas, outras questões tomam maior espaço. Tanto na produção artística quanto na realidade dos números e pesquisas oficiais.
Entre 1995 e 2005 a população carcerária do Brasil saltou de pouco mais de 148 mil presos para 361.402, o que representou um crescimento de 143,91% em uma década. A taxa anual de crescimento oscilava entre 10 e 12%. O panorama de crescente aumento do encarceramento tem tido espaço na reflexão do grupo Racionais MC’s. No disco de 1998, a canção “Diário de um detento” era uma das principais canções. “São Paulo, dia 1º de outubro de 1992, 8h da manhã./ Aqui estou, mais um dia/ Sob o olhar sanguinário do vigia./ Você não sabe como é caminhar com a cabeça na mira de uma HK” iniciava a letra escrita por um ex-detento e que descreve uma das tragédias ocorridas no Brasil e protagonizadas pela Polícia Militar de São Paulo no penitenciaria do Carandiru da capital paulista.
Enquanto isso, nas ruas, os dilemas dos trabalhadores que estão fora da formalidade, entre diversas formas de opressão, seus traumas gerados pelos desafios cotidianos, produto das desigualdades raciais, pelo sistema de justiça ou pela precariedade dos trabalhos. “Quatro minutos se passaram e ninguém viu/ O monstro que nasceu em algum lugar do Brasil/ Talvez o mano que trampa de baixo de um carro sujo de óleo/ Que enquadra o carro forte na febre com sangue nos olhos/ O mano que entrega envelope o dia inteiro no sol/ Ou o que vende chocolate de farol em farol/ Talvez o cara que defende o pobre no tribunal/ Ou que procura vida nova na condicional/ Alguém num quarto de madeira lendo à luz de vela/ Ouvindo um rádio velho no fundo de uma cela/ Ou da família real de negro como eu sou/ Um príncipe guerreiro que defende o gol”.
E como seriam encaradas as relações advindas do consumismo, da possibilidade se ser integrado à sociedade por meio das relações de mercado, com uma certa estabilidade financeira, também estão lá: “Não é questão de luxo/ não é questão de cor/ É questão que fartura alegra o sofredor/ Não é questão de preza, nego/ A idéia é essa: miséria traz tristeza e vice-versa/ Inconscientemente, vem na minha mente/ a loja de tênis e o olhar do parceiro feliz/ de poder comprar o azul, o vermelho, o balcão, o espelho, o estoque, a modelo”10.
As dimensões de classe são muito marcadas nas palavras destes artistas, tão bem quanto às dimensões de raça; diriam alguns que estão conectadas as demandas por e distribuição e reconhecimento de setores subalternizados das sociedades contemporâneas. Seja de modo deliberado ou ocasional, a conexão com a luta política acaba por ser demonstrada em alguma ocasião ou outra.
Repetimos que é necessária voltar os olhos para outros pontos, ou se me permitem o trocadilho, se orientar pelo Cruzeiro do Sul, e compreender o papel destes produtores de arte, de ética e de estética, bem como o poder que exercem sobre atores sociais que optam pela fazem política, como é o Hip Hop, por exemplo. Vale a pena ressaltar que o ano de 2012 foi marcado pelo ano de retorno do Grupo Racionais MCs. O seu principal hit é a canção-manifesto “Mil faces de um homem leal”, um biografia de Carlos Marighela, o mesmo que batizou a ação. A postos para o seu general/ Mil faces de um homem leal/ Protetor das multidões/ Encarnações de célebres malandros/ De cérebros brilhantes/ Reuniram-se no céu/ O destino de um fiel, se é o céu o que Deus quer/ (…) Maldito sonhador/ Bandido da minha cor/ Um novo messias/ Se o povo domina ou não/ Se poucos sabiam ler/ E se eu morrer em vão?/ Leso e louco sem saber/ Coisas do Brasil, super-herói, mulato/ Defensor dos fracos, assaltante nato/ Ouçam, é foto e é fato a planos cruéis/ Tramam 30 fariseus contra Moisés, morô?/(…) Que ousou lutar, honrou a raça/ Honrou a causa que adotou/ Aplauso é pra poucos/ Revolução no Brasil tem um nome/ Vejam o homem (…)/Indigesto como o sequestro do embaixador/ (…).
Pois bem, não bastasse Mano Brown fazer campanha para o PT, rappers disputarem eleições parlamentares (e serem eleitos como o vereador Anderson “4P” Silva, de Francisco Morato-SP, reeleito pela segunda vez em 2012), não bastasse Criolo fazer a defesa escancarada do Quilombo Rio dos Macacos e da população de Pinheirinho de São José dos Campos, Emicida ainda deu-se a reunir com dirigentes do MST e mostrando a todos sua cumplicidade com o movimento.
Algumas dessas análises catastrofistas entre cultura e política podem, portanto ter problemas em dois aspectos: no conceito de cultura e na leitura de contexto. Coerência, linearidade ou o que o valha talvez seja algo que falta num determinado com o qual um determinado tipo de conhecimento e saber esteja vocacionado a lidar. Mas os tempos são outros, os campos são outros, os atores e atrizes, idem.
Pensar a atualidade da relação entre a cultura, sociedade e política, passa por reconhecer as diversas formas de ação e de criação, passa pelo entendimento de que a construção do conhecimento subalterno importa incorporar mais vetores, variados vetores inscritos em uma gama de sociabilidades e vociferações.
Paulo Ramos é mestrando em Sociologia pela Universidade Federal de São Carlos, pesquisador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros desta Universidade, da Coordenação Nacional de Entidades Negras e membro do coletivo de Combate ao Racismo do PT-SP.
Uma versão preliminar deste ensaio foi publicado no Blog Vi o Mundo, em 17 de março de 2013: http://www.viomundo.com.br/politica/paulo-ramos-olhar-para-brixton-bronx-e-baixada.html
1- Escolho neste ensaio Vladimir Safatle por interlocutor pelo respeito as suas argumentações e pela sua representatividade; http://www.cartacapital.com.br/cultura/a-luta-de-classes-na-cultura
2- Regina Novaes desenvolve uma ótima análise sobre O Rappa e Juventude em JUVENTUDE, RELIGIÃO E ESPAÇO PÚBLICO: EXEMPLOS “BONS PARA PENSAR” TEMPOS E SINAIS, na Revista Religião e Sociedade nº 32 (1).
3- Claude Levi-Strauss já o fez emblematicamente há mais de meio século, demandado pela Organização das Nações Unidas, no artigo Raça e História.
4- Folha de São Paulo On line Onda de violência na França levanta questões sobre política social
http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u89356.shtml
5- Greve estudantil no Quebec – A luta continua http://www.brasildefato.com.br/node/9793
6- Tumultos em Londres: entre a violência juvenil e a revolta social. http://educacao.uol.com.br/disciplinas/atualidades/tumultos-em-londres-entre-a-violencia-juvenil-e-revolta-social.htm
7- Mapa da Violência 2012, organizado por Julio Jacobo Waiselfisz, publicado pelo Instituto Sangari.
8- O artigo SOBRE ANJOS E IRMÃOS – cinquenta anos de expressão política do “crime” numa tradição musical das periferias, do professor Gabriel Feltran (UFSCar) traz uma interpretação aprofundada sobre o grupo Racionais MCs, publicado na Revista dos Instituto de Estudos Brasileiros no. 56.
9- Poderíamos estender os argumentos para grupos e/ou estilos musicais de Recife, de Salvador, para indígenas fazendo Rap no Mato Grosso do Sul. Mas escolher este grupo é decorrência de preferências pessoais e acúmulo de trabalhos de pesquisas anteriores.
10- Algumas dimensões da produção dos Racionais mereceria “capítulos a parte”, como o machismo ou a relação com a polícia militar, por exemplo.