O processo, que era para ser lento na medida do possível, se precipitou de maneira inevitável – e talvez imprevista.

Na noite da segunda-feira, dia 4, o ministro venezuelano de Comunicação, Ernesto Villegas, informou oficialmente ao país que tinha havido uma piora considerável no estado de saúde do presidente Hugo Chávez.

O anúncio foi feito por uma cadeia de rádio e televisão, tarde da noite, e foi devastador para as esperanças de milhões de venezuelanos, que já vinham de uma prolongada tensão desde que, em dezembro passado, tinham sido informados que o câncer que afetava seu presidente desde meados de 2011 havia retomado com força.

Na tarde do dia seguinte, terça-feira, houve, primeiro, um novo impacto: Nicolás Maduro, vice-presidente, nomeado candidato a sucedê-lo pelo próprio Chávez, participou de uma solene reunião da direção político-militar da Revolução Bolivariana. Estavam lá todos os ministros, os 20 governadores estaduais filiados ao movimento encabeçado por Chávez, muitos prefeitos – e, claro, os mais altos mandos militares.

A ausência do presidente da Assembléia Nacional, Diosdado Cabello, tinha plena justificativa: a morte de sua mãe naquele mesmo dia.
 
Ou seja: o tempo previsto, ou esperado, para preparar a difícil e delicada transição do chavismo com Chávez para o chavismo sem Chávez encolheu de maneira dramática.
 
E depois da tal reunião solene, houve outro pronunciamento de Nicolás Maduro, para comunicar o que todos temiam, esperavam e pareciam não acreditar: a morte de Hugo Chávez.
 
O tempo previsto – se é que alguém previu – para anunciar o desaparecimento do condutor máximo da Revolução Bolivariana, do Socialismo do Século XXI, foi cortado bruscamente. Aquilo que era óbvio, mas parecia adiável, aconteceu.

 

 Chávez morreu sem assumir seu novo mandato presidencial, e deixou um herdeiro que não tem seu carisma, e muito menos seu peso nas Forças Armadas, onde afinal reside o verdadeiro núcleo do poder.
 
Agora, tudo são suposições na Venezuela. De concreto, além da morte de Chávez, apenas a certeza de que as diferentes correntes do chavismo tratarão de se entender, até mesmo para não desaparecer em estilhaços ao léu.
 

O projeto bolivariano alcançou resultados indiscutíveis em termos de mudança na estrutura social da Venezuela. E tudo isso aconteceu girando ao redor de um só eixo: o próprio Hugo Chávez. Que, como todo líder, teve à sua volta, em diferentes ocasiões, diferentes integrantes de um núcleo duro.

 Ao longo de seus longos anos no poder, Chávez não construiu, ou não pôde construir, uma figura absolutamente leal para substituí-lo numa eventualidade qualquer – desde a mais funesta, que acabou ocorrendo, até uma eventualidade política.
 

Só recentemente, em dezembro passado, quando soube que o câncer que acabaria por matá-lo havia voltado e em condições extremamente agressivas, anunciou o nome que estava debaixo de uma vasta e meticulosa lupa desde alguns poucos meses, quando soube da própria fragilidade.

Chávez, com apoio dos cubanos, quis que fosse Nicolás Maduro, um dos nomes mais próximos nos últimos tempos. Nada garante, porém, que os outros nomes mais próximos tenham aceito essa escolha sem ressentimentos.

 

A partir de agora, cada movimento será decisivo, como num minueto impreciso que busca a precisão da sobrevivência. O que fará Diosdado Cabello, militar como Chávez, com grande influência nas Forças Armadas, presidente da Assembléia Nacional? E Elias Jaua, sociólogo bem formado e bem estruturado, vindo da extrema esquerda e um dos cabeças do radicalismo chavista mais radical? E Francisco Arias Cárdenas, também militar, um estranho militar intelectualizado, com forte influência entre os novos governadores saídos da caserna e eleitos em outubro passado? E finalmente, que fará o físico Adán Chávez, irmão mais velho do presidente morto e seu principal mentor ideológico?

 Essas são algumas das muitas, muitíssimas perguntas que os venezuelanos se fazem. Mas há outras, mais urgentes e prementes.
 
O que será da Venezuela? E de Cuba? E da Jamaica, da Nicarágua, da Bolívia e, em boa medida, da Argentina? E do Equador? E das conversações de paz da Colômbia? E da Aliança Bolivariana? E da Unasul, que Chávez e o então presidente argentino Nestor Kirchner, junto com Lula, tanto impulsionaram?
 

Como se comportarão as forças armadas venezuelanas? Qual será a atitude da Força Aérea, considerada a menos chavista das forças militares?

A América Latina não perdeu apenas um presidente forte, polêmico, muitas vezes contraditório. Não perdeu apenas um símbolo de transformações reais. Não perdeu um líder – discutido, sim, mas dono de uma liderança indiscutível.
 
Perdeu isso e muito mais. Quanto? O tempo dirá. Mas perdeu muito, muitíssimo.
 

Na noite da morte do presidente Hugo Chávez, um amigo venezuelano me escreveu: “Era um gigante”.

Pois era isso e muito mais. Agora é preciso ver o que fazer com seu legado.
 

E, principalmente, ver como assegurar à Venezuela e à nossa Pátria Grande o futuro que Hugo Chávez ajudou, com todos seus erros e acertos, com todas as suas conquistas e contradições, com todas as suas tragédias e esperanças, a planejar e sonhar. 

 

Leia também:

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Especial Venezuela: A Era Chávez, série de reportagens publicadas pelo Opera Mundi em outubro de 2012

 

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Atualizado em 6/03/2013, às 18h14