A ONU: única esperança
A ONU hoje é um enorme organismo pesado e esclerosado, incapaz de resolver o conflito ameaçador do Oriente Médio, que eclodiu após uma resolução sancionada por ela há mais de 60 anos, sob o voto encorajador de esmagadora maioria das nações. É evidente o compromisso da ONU com o cumprimento da sua resolução primordial da partilha da Palestina: um fato histórico inelutável e irreversível, criado pela própria ONU.
Enquanto demora paralisada, a ONU permite o desenvolvimento de um explosivo e terrível quadro de tensões políticas e confrontos bélicos na região que pode muito bem degenerar num incêndio planetário de proporções ainda não vistas.
Israel usa a força implacavelmente porque, no sentimento do seu povo, que não é só do governo e não é absolutamente infundado, está em jogo a sua sobrevivência. Entretanto, a desproporção de força e de destruição no enfrentamento com o Hamas é gritante, é devastadora, e o sofrimento do pobre povo palestino comove o mundo. Esta comoção vai isolando os israelenses numa vasta e crescente massa da opinião pública, que acaba por confundir o repúdio a essa força implacável com uma condenação do sionismo e, na sequência, finda por descambar para o velho antissemitismo.
E o que podem fazer os cidadãos do mundo em defesa da Paz, da Justiça e da Humanidade? Podem clamar pela ONU, a única esperança. Não há mediadores efetivos no momento: os Estados Unidos estão politicamente paralisados pela sua radicalização interna e desacreditados pelo seu afrontoso viés pró-Israel; o Egito cresceu e conseguiu a passageira trégua de hoje, mas não tem uma estabilidade interna tranqüilizadora, ainda está num compasso político indefinido, com as ruas cheias de protestos. A ONU é realmente a única e verdadeira esperança; há que clamar forte por ela, pela sua responsabilidade: usar a capacidade de alastramento das redes sociais eletrônicas, ampliar ao máximo a manifestação das organizações judaicas e islâmicas que lutam pela paz, convocar por todos os meios a ONU para intervir e cumprir a sua missão precípua. A começar pela aprovação do reconhecimento pleno do Estado Palestino agora este mês. A Autoridade Palestina saiu enfraquecida deste último confronto e não falta quem diga que este foi um dos propósitos dos radicais que não querem a paz.
Há elementos políticos novos no Oriente Médio que certamente preocupam os israelenses: o avultamento da Irmandade Muçulmana nos países árabes e, principalmente, o crescimento do poderio bélico iraniano. É preciso convencer Israel de que o melhor e mesmo único caminho para neutralizar essas novas forças que o ameaçam não é a guerra mas a intervenção da ONU e a paz com a Palestina.
O Brasil foi há tempos desmoralizado pelos Estados Unidos, junto com a Turquia, na tentativa de compor um acordo com o Irã. Mas o Brasil não é carta fora deste baralho; apoiou o pedido de reconhecimento da Autoridade Palestina e pode influir junto aos BRICS no sentido de uma decidida posição conjunta.
Enfim, tudo isso pode ser um sonho infantil de político frustrado que terminou sua carreira presidindo a Comissão re Relações Exteriores do Senado. Mas não posso deixar de falar sobre um assunto tão importante para o mundo, para o Brasil e para toda a Humanidade. E só sei falar neste diapasão visionário. Ainda confio na ONU, apesar de tudo, porque preciso confiar.
*Roberto Saturnino Braga, ex-senador (PT/RJ), autor de O curso das ideias, editado pela EFPA e membro do Conselho Curador da FPA.