Resenha sobre o livro As esquerdas latino-americanas em tempo de criar
As esquerdas latino-americanas em tempo de criar
Nils Castro, Ed. Fundação Perseu Abramo
A foto, em uniforme de futebol, ao lado de Che Guevara e de Alberto Granado, seu parceiro na célebre viagem de moto, não deixa dúvidas quanto às credenciais do autor para discutir os rumos da esquerda na nossa América. Nascido em 1937, o panamenho Nils Castro deu aulas em Cuba logo após a vitória da Revolução e, mais tarde, em seu país, participou do governo anti-imperialista do general Omar Torrijos. Acompanhou os sandinistas da Nicarágua na vitória e na derrota e hoje, aos 75 anos, escreve livros e participa de articulações continentais, como o Foro de São Paulo.
As esquerdas latino-americanas perpassa a luta pelo socialismo em boa parte do continente e o retrocesso neoliberal que se seguiu ao fracasso, total ou parcial, das diversas empreitadas revolucionárias. O ponto forte são as lições – fruto de experiências vividas na própria pele – apresentadas como aporte ao projeto estratégico dos socialistas em um contexto no qual a esquerda se mostra suficiente vigorosa para conquistar o governo pela via eleitoral, mas ainda distante de reunir o apoio das massas necessário para impulsionar mudanças sociais profundas.
Diante do impasse, o autor recomenda paciência e pé na terra. De nada adianta criar novos mártires, adverte, se os esforços transformadores não proporcionarem resultados concretos e duradouros. Apesar dos limites impostos por uma correlação de forças desfavorável à revolução, ele acredita que vale a pena aproveitar a chance do exercício do governo não só para promover as melhorias demandadas pelo eleitorado popular, mas também para acumular energias capazes de viabilizar, no futuro, metas de maior alcance. Na prática, a luta por reformas resumiria a agenda revolucionária do momento.
Outro foco importante, na perspectiva do autor, é a rejeição ao dogmatismo, às fórmulas prontas, à luta fratricida entre companheiros. Aos socialistas do século XXI, o autor – gato escaldado – recomenda “frentes amplas, plurais e abrangentes”, criatividade para se contrapor às ideologias da direita e, sobretudo, uma atitude mental de abertura e tolerância. “Em um mundo crescentemente complexo, entre esquerdas já não cabe discutir para descartar o opositor, mas sim para melhorar o conhecimento da realidade que desejamos mudar e para compartilhar alternativas.”
Igor Fuser
Doutor em Ciência Política e prof. da Faculdade Cásper Líbero.