Parece não haver divergências na esquerda e no centro políticos do país quanto ao papel dos investimentos no processo de desenvolvimento econômico e social. Também não parece haver muitas divergências quanto à existência de problemas de natureza estrutural no financiamento e quanto à necessidade de definir mais claramente o projeto de nação e desenvolvimento que queremos e podemos construir. As divergências começam justamente quando se começa a discutir aqueles problemas estruturais e o projeto nacional de desenvolvimento.

Todos sabemos das crescentes demandas de financiamento à indústria, infraestrutura, educação, ciência, tecnologia e inovação. Todos parecemos saber da urgência de reduzir juros, balancear o câmbio, reduzir o peso da dívida e dos superávits primários, e buscar novas fontes de investimentos de longo prazo. No entanto, nem todos parecemos saber da extrema concentração e centralização da nossa economia por corporações transnacionais e nacionais, que constituem um sério problema para qualquer projeto de desenvolvimento, para o prática de preços civilizados e para a competitividade da indústria nacional. É impressionante o silêncio a respeito, mesmo da esquerda e de pessoas que se dizem de formação marxista.

Além disso, nem todos parecemos saber das prioridades que um projeto articulado de industrialização, incluída aí a recuperação e ampliação da infra-estrutura energética, de transportes, saneamento e comunicação, deve comportar. Há evidências de que damos pouca atenção ao debate sobre essas prioridades, que deveriam ainda incluir o papel das indústrias básicas, como siderurgia, química, metal-mecânica e eletromecânica, e das indústrias de alta tecnologia, como química fina, eletrônica, biotecnologia, aeronáutica, nanotecnologia e novos materiais.

E que parecemos não nos importar que os investimentos continuem no patamar genérico de 20% ou 22% do PIB, e que as rodovias estejam recebendo mais recursos do que as ferrovias e o sistema portuário. Nem que “nossas indústrias” multinacionais, como a automobilística e a químico-farmacêutica, tenham aumentado o volume de sua produção, em boa parte com base nas importações de suas plantas em outros países.  Ou, ainda, que não tenhamos um programa efetivo que distinga os projetos de investimentos realmente importantes para o adensamento das cadeias produtivas, daqueles projetos que deveriam ser restringidos, por já haver ocupação extra da capacidade produtiva, ou que deveriam ser proibidos, por serem altamente poluentes ou danosos à população e à natureza.

Nesse sentido, o sistema financeiro desempenha papel estratégico em todo o processo de desenvolvimento e as medidas adotadas pelo governo estão no rumo correto, para forçar o rebaixamento dos juros e aumentar a concorrência no setor. No entanto, os instrumentos estatais com que conta o governo têm limites em sua capacidade de competir com um setor que também é extremamente oligopolizado. Se o governo não buscar, com certa urgência, outros instrumentos, estatais e privados, que fragmentem o setor bancário e financeiro e implantem um sistema de verdadeira concorrência, corre o risco de perder a queda de braços em curso, mesmo a médio prazo.

Portanto, os investimentos não só precisam crescer consideravelmente, seja para atender à ampliação do mercado interno, seja para aumentar a participação dos manufaturados no mercado externo, como precisam crescer naqueles setores de infra-estrutura, da indústria e das finanças que jogam papel decisivo para puxar todos os demais setores, e para intensificar a concorrência com os setores monopolizados ou oligopolizados.

O que exige sairmos da economia para a economia política, detectando os setores sociais concretos, de cunho nacional, que podem dar suporte prático às políticas de investimento industrial e devem ser estimuladas pelo governo para assumirem tal papel. No entanto, parecemos navegar no escuro nesse terreno, Apesar de todas as medidas adotadas pelo governo para incentivar o crescimento das médias e pequenas empresas, as exigências dos setores financeiros, inclusive estatais, para financiar investimentos, são de tal ordem que a maior parte dessas empresas desiste logo nos primeiros passos. E a falta de conhecimento sobre a existência ou não de um programa de investimentos prioritários também não auxilia essas empresas em sua elaboração de projetos.

Algo idêntico ocorre com a atração de investimentos estrangeiros. Em geral, não há qualquer pressão para que as empresas estrangeiras com projetos de investimento no país se associem a alguma empresa nacional, de modo a transferirem tecnologias e possibilitarem a futura independência dessa empresa nacional. A esmagadora maioria dos investimentos estrangeiros no Brasil não tem qualquer participação de empresas brasileiras, o que aumenta apenas a participação estrangeira na economia nacional, e incrementa a dicotomia entre o nosso produto interno bruto e o produto nacional bruto.

Portanto, só nesse breve sumário temos uma pauta carregada para complementar a discussão sobre os investimentos para o desenvolvimento brasileiro, tanto mais complexo quanto maior for a decisão de combinar o desenvolvimento econômico com a redistribuição da renda e com outros objetivos do desenvolvimento social.