Economistas: Mesmo com a crise, Brasil pode crescer se vencer desafios
Rio de Janeiro – Apesar do caráter duradouro e imprevisível da crise econômica global, o Brasil reúne condições para crescer e se desenvolver nos próximos anos. Esse crescimento, no entanto, dependerá da manutenção dos rumos da política macroeconômica brasileira, voltada nos últimos governos ao combate à pobreza, à geração de emprego e renda e ao fortalecimento do mercado consumidor interno. Esse foi o diagnóstico traçado por diversos economistas reunidos no seminário “A Crise do Capitalismo e o Desenvolvimento do Brasil”, organizado na segunda-feira (28) por PT, PSB, PCdoB e PDT no Rio de Janeiro.
Para Ricardo Carneiro, a atual política macroeconômica brasileira “incorpora a questão social como relevante para o projeto de desenvolvimento” a partir de alguns mecanismos: “O mais poderoso deles é a política de salário mínimo e de distribuição de renda. Essa é uma política absolutamente bem-sucedida e fundamental porque interfere no organismo do mercado de trabalho, reduzindo o leque salarial, e interfere também nas demais políticas do governo porque aumenta o caráter distributivo das transferências governamentais. O aumento de 56% do mínimo no governo Lula é a política mais importante no período, mais até do que o Bolsa-Família”, disse.
O fortalecimento salarial, segundo Carneiro, é o que explica a chegada de novos atores ao mercado de consumo: “Essa história de nova classe média é, rigorosamente falando, verdade. O país criou de fato uma classe C extremamente importante, que tem sido a base da diversificação do consumo e cujo aumento de renda permitiu que essa parte da população tivesse acesso ao crédito”, disse. Para ele, o crédito pode continuar a desempenhar o mesmo papel de dinamização econômica: “O que limita o crédito no Brasil é o tamanho da taxa de juros e do spread bancário. Não há nada que explique a taxa de juros no Brasil, a não ser o jogo do poder. Para continuar com o canal de crédito funcionando, é preciso baixar decisivamente a taxa de juros no Brasil”.
Tânia Bacelar afirmou que o Brasil “tem que estar com um olho na crise e outro no futuro”, e classificou a situação do país como “privilegiada” e somente possível após “os avanços que pudemos construir nos anos recentes, a partir da conquista da redemocratização”. Para ela, o grande desafio do Brasil nos próximos anos é a educação: “Eu vou divergir de quem acha que a gente avançou bastante. Ainda estamos longe de onde podemos chegar. A nossa educação fundamental é muito ruim, é uma das máquinas de gerar desigualdade no Brasil”, disse.
Outro desafio para o governo brasileiro apontado pela economista é promover uma real desconcentração dos investimentos produtivos, historicamente concentrados nas regiões Sudeste e Sul do país: “O pré-sal poderá cumprir esse papel desconcentrador, se o país souber distribuir os três segmentos de sua cadeia produtiva. Setenta por cento do setor eletro-metal-mecânico, que é o coração do fornecimento, está hoje no Sudeste. Outro setor é a indústria automotiva, que quer dobrar sua produção no Brasil nesta década, mas, quando olhamos suas preferências locacionais, elas estão quase todas de Belo Horizonte para baixo, apesar de o mercado do Nordeste estar muito dinâmico”.
Desvalorizar o real
O ex-ministro da Fazenda Luiz Carlos Bresser Pereira afirmou que “a crise pode ser uma oportunidade para o Brasil”, mas defendeu a desvalorização do real como forma de aumentar a competitividade dos produtos industrializados brasileiros no mercado internacional: “Entre 1930 e 1980, apesar de alguns momentos pontuais de crise, o Brasil manteve uma taxa de câmbio competitiva, o que permitiu ao país ter índices muito grandes de crescimento. Desde que fizemos o acordo com o FMI de 1992 e abrimos financeiramente o Brasil, a nossa taxa de câmbio se apreciou e, com altos e baixos, se mantém apreciada desde então. Isso é desastroso para a indústria nacional, estamos sofrendo desde os anos 90 um processo firme de desindustrialização”.
Segundo Bresser, que defende um câmbio de R$ 2,30 em relação ao dólar, o atual governo é o primeiro que entende a necessidade de interferir no câmbio: “É preciso colocar as taxas de câmbio e de juros no nível certo, e isso já começou a ser feito. Nós temos agora um novo Banco Central. Não é mais o BC do seu [Henrique] Meirelles, não é mais o BC dos banqueiros. É um BC que parece que é um banco nacional, afinal, e não um banco dos outros. A meu ver, a taxa de câmbio tem que ir para R$ 2,30 e lá ficar”, disse.
“Moeda vagabunda”
Para Maria da Conceição Tavares, as principais vantagens do Brasil para conquistar uma inserção soberana no mercado internacional são seus recursos naturais, seu grande mercado interno e sua baixa dependência externa: “Antes, eles espirravam e a gente pegava pneumonia. Desta vez, eles ficaram com pneumonia e nós com uma gripezinha. O grosso dos passivos externos do país está em reais. Saímos do dólar, que é uma moeda vagabunda”, disse, no seu estilo incisivo, para as gargalhadas dos colegas.
Ricardo Bielschowsky afirmou que o Brasil se encontra nos estágios iniciais de uma possível nova política de desenvolvimento, iniciada no governo Lula e em curso no governo Dilma. Essa política, segundo o economista, obedece a uma estratégia que tem três eixos como base: crescimento com redistribuição de renda, fomento de atividades baseadas em recursos naturais e construção de infra-estrutura e atividades em suas cadeias produtivas: “Um quarto eixo é transversal a esses três e tem a função de potencializá-los: a inovação e a criação de bens e serviços de alta capacidade tecnológica”, disse.