O Setor Industrial brasileiro vinha criticando o cambio excessivamente elevado, na relação real/dólar, a penalizar as nossas exportações e a favorecer as importações, principalmente as chinesas.

O Setor Industrial brasileiro vinha criticando o cambio excessivamente elevado, na relação real/dólar, a penalizar as nossas exportações e a favorecer as importações, principalmente as chinesas.

Cobrava medidas corretivas do governo. Adotado o câmbio flutuante em janeiro de 1999, quando o real sofreu o ataque especulativo em decorrência do contágio da crise russa, o país ingressou em um sistema que, a meu ver, é inegavelmente superior ao do câmbio fixo. Entretanto, é ilusório e até desonesto entender-se que a flutuação do câmbio se dê por conta de fatores, digamos, “naturais”. O governo tem poder de influenciar de maneira importante a flutuação: no processo de compra e venda de divisas, intrinsecamente ligado a função do Banco Central de cuidar dos meios de pagamentos; por meio da tributação das importações e exportações de forma a alterar os preços relativos do comércio exterior; na implantação de medidas que aumentam a competitividade de nossos produtos em campos como o da Ciência e Tecnologia, por exemplo, impactando assim no fluxo de nossa receita cambial; e, finalmente, em ações de estímulo produtivo que afetam as exportações, como é o caso do programa de exploração do Pré-Sal.

De qualquer forma, sempre deve ter parecido intrigante a um observador que o setor industrial brasileiro, tão crítico quanto ao elevado patamar do real face ao dólar, jamais teve sucesso em formular e fazer prevalecer politicamente uma política macroeconômica que garantisse que a administração do câmbio flutuante tivesse um viés pró-indústria nacional, principalmente no campo restrito da política monetária. Aí, até pouco tempo, prevalecera uma independência relativa do Bacen, bastante aplaudida pelo mercado financeiro: o Banco Central era dependente dos humores do dito cujo e independente do resto, e assim estava bem.

Os juros básicos brasileiros então ficavam altos, os mais altos do mundo, apesar de o Brasil ser um dos riscos menores do mundo; atraindo assim muito capital externo especulativo, o que valorizava nosso real. Os industriais reclamavam, mas ficava por aí. O governo, procurando apoiar a indústria, tem atuado por meio de várias medidas: crédito subsidiado do BNDES, programa Brasil Maior, isenções fiscais, etc. Tudo muito correto e muito aplaudido pelo setor industrial. Mas o nó cambial ficava lá, de lado, como que a dizer “não mexam comigo, que eu sou muito complicado”.

Pois bem, então, eis que veio a nova fase da crise internacional, versão 2011. Agora crise da dívida pública dos países do chamado primeiro mundo. Sem ter para onde ir, o capital especulativo, na dúvida, correu para se abrigar nos títulos americanos e então o dólar disparou. Daí o real desvalorizou e o câmbio chegou a 1,80. Como o quadro internacional ainda ficará por bastante tempo a apresentar-se instável, é de se esperar que a preferência pelo dólar ainda permaneça por algum tempo.

E então, neste quadro, não vejo uma ação politicamente forte do setor industrial em defesa de uma política cambial que, aproveitando-se da conjuntura internacional favorável, consolide um câmbio mais competitivo. Procurei no portal da CNI e só encontrei uma tímida referência ao tema no seu Informe Conjuntural de setembro.

Esta timidez talvez tenha relação com o fato de que muitos grupos industriais se endividaram em dólar e agora terão uma conta mais cara a pagar. Eram sócios dos especuladores. No setor comercial, então, parcelavam vendas “sem juros”, induzindo a milhões de famílias a se endividarem, criando uma cultura deseducadora da não poupança e esmagando o pequeno lojista.

Por outro lado, muitos grupos antes apenas industriais passaram a ser corporações multifacetadas com fortes braços – e interesses – financeiros, deixando de se guiar em sua ação política pela defesa da produção,mas sim, do rentismo.

Assim, quem defende a produção? Os trabalhadores, por certo. E quem, no governo, esteja livre da pegajosa liga de um setor – o financeiro – que sutilmente vai dominando o mundo. No campo empresarial, torna-se necessário separar-se o interesse rentista do interesse produtivo.

O recém lançado Movimento por um Brasil com Juros Baixos, sinaliza uma ampla aliança capital/trabalho em torno da bandeira dos juros baixos, o que é um grande objetivo. Mas a questão cambial e o desafio da consolidação do modelo industrial brasileiro como hegemônico sobre os interesses do capital financeiro especulativo e do capital primário exportador, são centrais para sabermos com quem o País pode contar para seguir no rumo do desenvolvimento com soberania e justiça social.

*Pedro Eugênio, deputado federal (PT/PE) e membro do Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo

 

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