“Se a solução dos dois Estados falhar, Israel enfrentará uma luta tipo União Sul-Africana. E, uma vez que isso aconteça, será o fim do Estado de Israel”. São palavras de Ehud Barak, quando primeiro-ministro israelense, em 2007.

“Se a solução dos dois Estados falhar, Israel enfrentará uma luta tipo União Sul-Africana. E, uma vez que isso aconteça, será o fim do Estado de Israel”. São palavras de Ehud Barak, quando primeiro-ministro israelense, em 2007.

Há 20 anos que, sob inspiração de presidentes americanos, se tenta chegar a um acordo para a criação de um Estado palestino ao lado do Estado de Israel. Não se andou nada devido à firme decisão dos vários governos israelenses de tornar impossível esse objetivo. Na última tentativa, patrocinada pelo presidente Obama, sequer se iniciaram as negociações de paz, boicotadas pela recusa de Israel em interromper mais uma vez, ainda que temporariamente, a implantação de novos assentamentos em terras árabes.

Diante desse fracasso e como já haviam renunciado à resistência armada, só restava aos palestinos uma última cartada: obter para si o reconhecimento internacional de um Estado independente e viável, dentro dos limites estabelecidos pela ONU desde 1967. É o que irão solicitar à Assembléia Geral da ONU, em setembro.

Isso é inaceitável pelo atual governo de Tel-aviv. Desde os Acordos de Paz de Oslo, em 1993, que lançou as bases para a negociação do futuro Estado palestino, Israel tem agido contra tal idéia, estimulando a criação de novos assentamentos em terras árabes. Dessa maneira, vem aumentando sem cessar a área ocupada na Cisjordânia e Jerusalém Oriental, expulsando os árabes das suas propriedades, num processo que se não for detido acabará por inviabilizar, de fato, a criação do Estado palestino.

Caso o reconhecimento da Palestina seja aprovado pela Assembléia Geral da ONU e o governo Israel persista em combatê-lo, ficará provada urbi et orbi sua oposição à idéia de dois Estados na Palestina. E as conseqüências, segundo o líder empresarial israelense Idan Ofer, serão pesadas: “Nós estamos nos tornando rapidamente uma União Sul-Africana. O impacto econômico das sanções será sentido por cada família em Israel”.

Em reunião com dirigentes dos maiores grupos econômicos de Israel, Dan Gillerman, ex-embaixador do país na ONU, repetiu Ehud Barak e Idan Ofer: “Na manhã depois do anúncio antecipado do reconhecimento do Estado palestino, um dramático e doloroso processo de sul-africanização começará.” Ou seja, Israel se tornaria um estado pária, sujeito a sanções internacionais, inclusive o boicote da importação de seus produtos. Seu caso seria levado à Corte Internacional de Justiça, o país poderia ser condenado, não só por violar leis internacionais, mas também por efetuar ações criminosas num Estado ocupado pela força, reconhecido pela ONU.

Como os empresários sul-africanos no passado, também os empresários israelenses atualmente pressionaram seu governo para entregar os pontos. Sugeriram que fosse aceito o Acordo de Genebra de 2003, no qual personalidades de alto nível israelenses e palestinas negociaram uma solução, dentro da idéia dos dois Estados, aprovada por estadistas de todo o mundo, porém, recusada por Israel. Mas a coligação de direita que está no poder prefere outro caminho. Com apoio dos Estados Unidos, tenta convencer, especialmente os países da Europa, a opor-se ao reconhecimento palestino.

Alega que isso representaria a “deslegitimação” de Israel. Argumento difícil de ser justificado. Na verdade, o que seria deslegitimado seria a ocupação ilegal pelos israelenses do território que pertence de direito aos árabes.

Como parte dessa campanha, Dennis Ross, enviado especial do governo Obama, apregoou que, se os árabes desistirem de pleitear o reconhecimento pela ONU, Netanyahu estaria disposto a renegociar um status final para a Palestina, em condições extremamente “generosas”. Afirmação de escassa credibilidade, considerando que até agora o governo do primeiro-ministro tem se comportado com extrema dureza em relação aos palestinos.

No velho estilo policial do “good cop, bad cop”, depois das belas palavras de Dennis Ross, vieram as ameaças do ultra-direitista ministro das Relações Exteriores, Avigdor Lieberman. Ele declarou que, caso as Nações Unidas reconhecessem o Estado da Palestina, Israel anularia os Acordos de Oslo. Em outras palavras: retomaria Gaza, tiraria os poderes da Autoridade Palestina, que deixaria de existir, e sepultaria de vez a solução dos dois Estados.

Susan Rice, embaixadora dos EUA na ONU, também entrou de sola, ameaçando com a retirada dos subsídios americanos à Autoridade Palestina (representam um quarto do orçamento).

Apesar das pressões americanas e israelenses, a reivindicação dos árabes tem todas as chances de vingar; 100 países já reconheceram o estado palestino. A França, o Reino Unido e outros países europeus elevaram a delegação geral palestina a “missões e embaixadas diplomáticas”, um status normalmente reservado aos países independentes. Na Assembléia Geral da ONU, a votação pró-Palestina deve ser esmagadora. Ainda no ano passado, uma resolução recomendando negociações de paz com volta aos limites de 1967 foi aprovada por 164 a 7. O mundo inteiro ficou de um lado e os EUA, Israel, a Austrália e algumas ilhotas da Oceania, do outro.

Não sabemos se esse placar se repetirá na votação do reconhecimento. O poder de pressão dos EUA é muito grande, possivelmente muitas nações cederão a ele e acompanharão a rejeição israelense. Antes de ser discutido pela Assembléia Geral da ONU, o caso deve passar pelo Conselho de Segurança. Aí, quem ficará numa saia justa será Barack Obama.

Se votar contra as aspirações palestinas, seu governo perderá de vez o prestígio que lhe resta em todo o mundo árabe. Governos aliados, especialmente a Arábia Saudita, com seu petróleo, e o Paquistão, com suas armas atômicas, ficarão em dificuldades diante dos seus povos para justificar a manutenção da amizade com os americanos.

Se votar pelo reconhecimento, terá contra si a maioria do Congresso americano e a maioria dos financiadores tradicionais do Partido Democrata, entre outros poderosos interesses. Fugir deste dilema é fundamental para Obama. Eis por que ele está fazendo de tudo para convencer Netanyahu a fazer logo uma proposta de paz realmente séria, capaz de convencer os palestinos a desistirem.

Luiz Eça é jornalista.