Para além das cotas – Reforma Política ou reforma do sistema eleitoral?
Hoje o grande tema nacional é a chamada “Reforma Política”, que ocupa espaço nos noticiários, nos debates parlamentares e partidários e também nas rodas de conversa. Discute-se voto em lista aberta ou fechada, “distritão”, financiamento público de campanha, participação das mulheres, etc.
Não pretendemos debater estes itens aqui porque consideramos ter um grande grau de consenso no PT quanto a alguns destes temas, apenas reafirmamos nossa posição quanto a eles.
Somos a favor do voto em lista fechada, do financiamento público de campanha, da alternância de gênero na composição das listas, etc. Como se vê, em grande grau de consenso com as demais posições de esquerda.
Porém aqui consideramos que há um erro de premissa. O que se discute neste momento no Congresso Nacional é apenas uma reforma do sistema eleitoral, com incursões nas estruturas partidárias. Para nós a Reforma Política deve compreender não apenas a mudança do sistema eleitoral ou partidário, mas a reforma dos processos decisórios e, portanto, da forma como se pensa, constrói e exerce o poder.
Elencamos abaixo o que para nós representam os eixos fundamentais desta Reforma Política de caráter democrático e popular que ajudará a modernizar o Estado brasileiro.
• Fortalecimento da democracia direta, notadamente nos governos locais;
• Fortalecimento da democracia participativa;
• Aprimorando a democracia representativa: sistema eleitoral
• Democratização e fortalecimento dos partidos políticos;
• Controle social do processo eleitoral.
• Democratização da informação e da comunicação;
• Transparência no Poder Judiciário
Com a aprovação de regras que fortaleçam estes princípios, estaremos fortalecendo a estrutura de um Estado realmente democrático, onde as cotas seriam mais um elemento de inclusão política, já que o exercício do poder será democratizado.
Porém não cabe neste texto debatermos todos estes princípios básicos de uma verdadeira Reforma Política. Nosso papo aqui é debater ferramentas de combate e superação do racismo na política.
Porém, considerando que a riqueza do momento nos impõe a tarefa de intervir nos debates sobre a conjuntura, vamos fazer breves considerações sobre dois itens: o fortalecimento da Democracia Direta e a democratização e fortalecimento dos partidos políticos.
Já de princípio vamos fazer uma declaração herética. Acreditamos que o fortalecimento da democracia direta (coisa diferente de democracia participativa) nos governos locais, com ferramentas efetivas de participação cidadã e controle social, contribuirá muito mais para o combate ao racismo na política que apenas o estabelecimento de cotas raciais.
É no bairro, na cidade, lutando por melhorias efetivas de vida que cada pessoa toma contato com o exercício cotidiano da política, e é neste ambiente que se dá a luta por políticas públicas inclusivas. Considerando que o Brasil é majoritariamente negro e feminino, teremos um incremento grande da participação destes setores na política.
Aliado a este movimento deveremos ter uma reforma na estrutura e funcionamento dos partidos que facilite o ingresso de novos militantes e ao mesmo tempo dê-lhes efetivos canais de intervenção na estrutura partidária.
É muito pertinente neste momento em que estamos em processo de reforma dos estatutos do partido não só os militantes do combate ao racismo, mas o conjunto do PT debater estes temas.
Claro que não esgotaremos este assunto num artigo. Nosso objetivo é apenas suscitá-lo, trazê-lo à tona. Por isso elencaremos alguns itens fundamentais, sem prejuízo de outras reformas, para começarmos a superar o racismo institucional na sociedade como um todo e o racismo internamente ao PT em particular.
Militância e organização de base. Incentivar a formação de organizações de base no PT onde os militantes possam debater, conversar, participar de atividades de formação, desfrutar de atividades de lazer, para que cada . Quer sejam núcleos de filiados, grupos de discussão, organizações temáticas, etc. Quer com vínculo formal a alguma instância ou não.
Orçamento Participativo. Com o objetivo de democratizar a distribuição dos recursos do partido bem como monitorar sua aplicação, é urgente implantarmos o OP dentro nas finanças do PT. Matéria, aliás, já aprovada no último congresso do partido, cabe agora implantar de fato.
Vigoroso programa de formação. Disseminar um amplo programa de formação, de âmbito nacional, baseada nos moldes da “Jornada de Formação”. Anterior a isto deve ser feita uma revisão em TODO o material de formação do PT para a inclusão da questão racial e das lutas do povo negro.
Todo apoio ao Combate ao Racismo no PT. Apoiar e financiar todo um sistema de combate ao racismo no PT partindo dos setoriais em todos os níveis bem como apoiando a luta antirracista em cada comunidade, em cada bairro, em cada cidade. Que em cada lugar onde haja um militante petista, haja um militante da luta antirracista.
Com estes instrumentos, porém não só eles, estaremos dando um grande impulso no combate ao racismo no Brasil e em nosso Partido. O debate está apenas começando e esperamos que ele seja franco, aponte divergências e defina convergências, mas sobretudo que seja fraterno como cabe ao debate em um partido “Socialista, Democrático e de Massas”. Estaremos aqui em outras oportunidades defendendo nossos pontos de vista sobre os outros temas e esperamos que outro/as companheiros/as façam o mesmo.
*Vera Gomes é membro da Comissão de Ética do Diretório Nacional do PT e do Coletivo Nacional de Combate ao Racismo; Cuca Falcão é membro do Diretório Regional do PT da Paraíba e do Coletivo Estadual de Combate ao Racismo.