Mesa 2 – Aborto – Mídia e Corpo – Sexualidade
A Mesa 2 – Aborto, Mídia e Corpo, Sexualidade foi coordenada pelo diretor da FPA Flávio Jorge com as intervenções de Nalu Faria (psicóloga, militante do SOF – Sempreviva Organização Feminista e da Marcha Mundial das Mulheres), Rachel Moreno (psicóloga, especialista em sexualidade e fundadora do Observatório da Mulher) e Simone Diniz (médica e pesquisadora da USP) sobre evidências em saúde materna e gênero e saúde materna).
Igrejas e o aborto– Nalu Faria apontou a dificuldade das mulheres em assumir que fizeram abortos, como está apontado na pesquisa, ainda que outras fontes indiquem que a prática é muito mais comum na população feminina. Ela destacou a resposta “conheço alguém que já fez” como o indicador desta dificuldade das pessoas abordarem o assunto, e segundo ela, “há uma grande ação a ser feita para as mulheres poderem falar disso.”
Ela destacou ainda o peso da influência das igrejas na decisão das mulheres em realizar o aborto, ao citar o resultado sobre as entrevistadas que se declararam católicas ou pentecostais, sendo que as católicas recebem menos apoio e tem mais interferência de terceiros e a pentecostais tomam a decisão e tem apoio de outros.
Outra manifestação desta influência transparece no resultado em que a maioria das mulheres e dos homens entrevistadas/os concordam que as igrejas estão certas em interferir na legislação do aborto. Para entender essa interferência, Nalu resgata o contexto da sociedade brasileira no momento em que a pesquisa foi realizada – em 2010 ano eleitoral, e mostra que o discurso antiaborto de grupos religiosos ganhou muita visibilidade cotidiana nos púlpitos das igrejas e até na grande mídia. As pessoas com menos renda e escolaridade, público-alvo destes discursos conservadores, acabam reproduzindo os conceitos, até por não terem outras fontes de informação. Essa realidade representa um retrocesso nas conquistas das feministas em incluir o aborto como problema de saúde pública e direito das mulheres em decidir sobre seus corpos na pauta da sociedade.
Nalu mostra que há necessidade imediata de disseminar a realidade do aborto para essa sociedade, para rebater o discurso hipócrita de punição contra as mulheres por decidirem por suas vidas.
Estereótipo da mulher vendido pela mídia – A psicóloga Rachel Moreno, fundadora do Observatório da Mulher, falou sobre Mídia e Corpo e apresentou os padrões de beleza estabelecidos pelo mercado e sua relação com o resultado da pesquisa em relação ao grau de satisfação da mulher em relação ao próprio corpo. Segundo Rachel, mulher brasileira pode acabar com auto estima rebaixada e, consequentemente, com expectativas rebaixadas por não conseguir atingir a imagem estereotipada daquela que seria um padrão de beleza a ser alcançado.
Para a psicóloga, ao ingressar no mercado de trabalho, a mulher passa a conviver num ambiente de trababalho normatizado, controlado e regrado. Exige-se da mulher que sua aparência seja seu cartão de apresentação. Rachel Moreno disse estar feliz com os resultados da pesquisa relacionados à mídia, porque as próprias mulheres não aprovam o uso que é feito de seu corpo para representar e vender o que quer que seja. "A pesquisa mostrou que as mulheres defendem a necessidade de controle da mídia, seja pelos próprios veículos ou por órgão externo, ou mesmo governamental", finalizou.
Violência no parto e no atendimento pós-aborto – Simone G. Diniz, médica e professora do Departamento de Saúde Materno-infantil da Faculdade de Saúde Pública da USP, enfatizou que a importância da pesquisa por ter apontado percepções atuais da mulher brasileira em relação a questões consideradas mitos. Em relação à sexualidade, a médica ressaltou o movimento de se separar sexualidade de reprodução sexual. Ela citou dados da pesquisa, nos quais as mulheres apontam a maternidade, por exemplo, para justificar sua satisfação em ser mulher. Inversamente, o fato de não engravidar também é apontado pelos homens para sua satisfação em ser homem.
O destaque da pesquisa, segundo Simone Diniz, é o ineditismo em relação à violência sofrida pelas mulheres nos serviços de saúde público e privado – no momento do parto e no atendimento pós-aborto. A existência dessa situação é sabida, segundo ela, porém nunca havia sido apurada junto às mulheres que sofreram esse tipo de violência. Os dados, segundo ela, são de grande importância para os gestores públicos.
Em relação ao aborto, Diniz enfatizou que os números apurados na pesquisa comprovam a subnotificação no país. Os dados apontam, segundo ela, para a necessidade de humanização do parto e do atendimento ao aborto. Mulheres continuam a morrer por não terem tratamento adequado. "Alguma coisa está errada no nosso discurso", disse ela, apontando a necessidade de abordar as contradições do discurso religioso, de buscar mais aliados.