Eleições na Venezuela: vitória eleitoral e derrota política
O desfecho das eleições para a Assembleia Nacional da Venezuela, realizadas neste domingo, 26, pode ser resumido em uma frase: uma vitória eleitoral e uma derrota política para o governo de Hugo Chávez. O presidente venezuelano pretendia fazer destas eleições um plebiscito. A contagem de votos ainda não foi concluída, mas o percentual até agora apurado já confirma a conquista da maioria pelos partidários de Chávez, mas não da maioria absoluta.
O desfecho das eleições para a Assembleia Nacional da Venezuela, realizadas neste domingo, 26, pode ser resumido em uma frase: uma vitória eleitoral e uma derrota política para o governo de Hugo Chávez. O presidente venezuelano pretendia fazer destas eleições um plebiscito. A contagem de votos ainda não foi concluída, mas o percentual até agora apurado já confirma a conquista da maioria pelos partidários de Chávez, mas não da maioria absoluta.
Ausente da vida parlamentar desde 2005, quando decidiu boicotar as eleições legislativas, alegando falta de garantias, a oposição retornará às cadeiras da Assembleia Nacional. Na época do boicote, o pleito não foi anulado e a coalizão do governo se transformou praticamente no único ator atuante na Assembleia Nacional venezuelana. O erro será reparado nesta eleição, em que os opositores ao governo chavista conquistaram 61 das 165 cadeiras. Como na Venezuela o regime é unicameral, legislatura formada por apenas uma câmara, o resultado da eleição impõe que a base governista negocie com a oposição para aprovação de projetos de leis.
Supondo que estes sejam os números finais, o doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP), Valter Pomar, disse que a aliança governista (Partido Socialista Unificado da Venezuela e Partido Comunista da Venezuela) venceu porque, embora sem a maioria dos votos, conseguiu a maioria dos parlamentares. Por outro lado, disse que a base de Chávez teve uma derrota política, já que não obteve a maioria qualificada, necessária para realizar alterações constitucionais. “Isto significa que os partidos governistas terão que governar com os meios institucionais e legais de que já dispõem, que são enormes”, disse.
Para o doutor em História, ex-secretário de relações internacionais do PT, o resultado não representa problema para governabilidade de Hugo Chávez. “Isto significa que, para continuar aprofundando as mudanças, será necessário primeiro consolidá-las. Fazendo uma brincadeira com as palavras, o recado é: façam benfeito, com os meios institucionais de que já dispõem, antes de pensar em mudanças mais profundas”, afirmou. Pomar disse que em um contexto de ampliada participação popular, como foi o pleito deste ano (62%), aliança PSUV-PCV obteve meios suficientes para governar, apesar da força da oposição e dos erros do governo.
Com a superação dos riscos desestabilizadores da década de 1960, os venezuelanos defendem a democracia. Na avalição do autor de “A Venezuela que se inventa”, Gilberto Maringoni, a vitória dos dois lados nesta eleição confirma o fortalecimento do sistema democrático. “A eleição teve uma clara divisão e proporcionará uma situação nova no parlamento. Sem a maioria absoluta, Chávez terá que negociar suas propostas, como qualquer democracia faz”, disse Maringoni, que também é doutor em História.
A participação no pleito deste domingo foi a maior nos 12 anos do governo chavista, o que para Maringoni, num regime de voto facultativo, é relevante. “Mas, essa maioria eleita pode oscilar ao longo dos cinco anos de mandato dos parlamentares, uma vez que há eleições presidenciáveis”, afirma.
Relações internacionais
Na avaliação do doutor em História da USP, Gilberto Maringoni, a situação econômica da Venezuela, em especial a crise econômica de 2008, mudou a vida dos venezuelanos e mesmo assim, não influenciou na popularidade do líder Hugo Chávez. “A Venezuela tem sua base de exportação no Petróleo e com a crise houve queda no PIB do país. Este ano teve queda no primeiro trimestre e depois no segundo recuperou. Mas o país não se recuperou completamente. Isso resultou na mudança de vida da população e o aumento da criminalidade”, contextualizou.
No que se refere à relação da Venezuela com o Brasil, o país que mais se beneficiou economicamente dos 12 anos de governo Chávez, o historiador afirma que as relações internacionais não são pautadas pelas afinidades ideológicas. “Essa ideia que a imprensa constitui de que a boa relação entre Chávez e Lula, por exemplo, leva ao êxito da relação comercial entre estes dois países é equivocada. Não pense que o escritório do IPEA foi criado em Caracas porque Chávez é bonzinho ou amigo do Lula”, disse.
A Venezuela não tem produção industrial própria, depende diretamente de importação, segundo o historiador, o que beneficia os países vizinhos produtores, com o Brasil. “Nós exportamos desde automóveis até alimentos e talheres. O metrô de Caracas está sendo construído por empreiteiras brasileiras. Então, só louco não vai querer ter uma boa relação com a Venezuela”, disse.
Perda da hegemonia
A vitória do governo e da oposição na Assembleia Nacional da Venezuela tira a hegemonia do presidente Hugo Chávez. Depois de reformar as Forças Armadas, nacionalizar centenas de empresas, fazer modificações no Judiciário, convocar a Assembleia Constituinte e convocar plebiscitos, ele terá que negociar para fazer modificações profundas no país.
Mas, para o doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP), Valter Pomar, esta é uma relação sem flexibilidade. Ele defende que a mudanças feitas já são profundas. “Isso vai depender de quem vai dirigir a oposição e depende de qual vai ser a leitura hegemônica, no interior do PSUV, acerca deste resultado eleitoral. Agora, atenção: não acho que exista espaço para negociar com a oposição acerca de ‘modificações profundas’. O que falta, para usar uma palavra brasileira, é gestão. É consolidar administrativamente, socialmente, economicamente. Neste sentido, acho que o resultado eleitoral pode ser útil, pode servir como um ‘freio de arrumação’”.