As comunicações
As Comunicações, ou meios de comunicação, são os canais por onde se veiculam para o público as informações de todo tipo, verdadeiras e falsas; pelas comunicações passam diariamente mentiras e verdades. Claro que é muito ruim que circulem mentiras, mesmo as que têm o caráter de equívoco, sem maldade. Mentiras, porém, cedo ou tarde se desfazem; mesmo as que são maldosas. A Humanidade tende para a verdade, tal como a matemática define o limite, isto é, algo cada vez mais próximo embora jamais atingido. Este é o lavor da Ciência.
A mentira propositada sempre porta um veneno. É um veneno, todavia, que não mata; desfalece a verdade, desacorda-a, mas ela torna à luz e à vida ao fim de certo tempo. Pior que a mentira é o segredo, o silêncio, que encobre e sufoca a verdade, e que frequentemente a leva para o túmulo.
A Grécia Clássica é sempre uma referência quando se invoca a Humanidade, e foi lá que surgiu a comunicação pública sujeita à controvérsia. E foi lá que surgiram as primeiras escolas, a Academia de Platão, o Liceu de Aristóteles, com o objetivo de ensinar, isto é, transmitir a verdade. E lá também apareceram, pela primeira vez, as escolas de retórica que ensinavam como distorcer a verdade, como apresentar a mentira, ou a verdade distorcida, de forma convincente: eram os sofistas, muito bem pagos e muito combatidos pelos filósofos, estes que se empenhavam em ser os verdadeiros amigos da verdade. Este grandioso embate de comunicações diretas, ao vivo, em gigantescas assembléias de milhares e milhares de pessoas, foi a essência da primeira democracia.
O ideal da comunicação perfeita e livre continua sendo, e será sempre, a condição essencial da democracia.
Os mil anos da Idade Média exterminaram a democracia aniquilando a comunicação, impondo o segredo do poder, o anúncio emanado tão-somente do Poder, da força, enclausurando a verdade, a ciência e a informação nos mosteiros completamente isolados.
A Democracia só ressurgiu quando a verdade e a comunicação acordaram do seu monástico sono secular, depois que se formaram as primeiras universidades e que Gutemberg prensou os primeiros livros. E a história do florescimento e da frutificação da Democracia esteve intrinsecamente ligada ao desenvolvimento das comunicações. Daí a importância da “Liberdade de Imprensa” entre os princípios fundamentais da Democracia.
Entretanto este princípio fundamental começou a ser violentado e flagrantemente violado pelas próprias empresas do setor que, na busca da lucratividade capitalista impulsionada pelas crescentes economias de escala, foram se devorando umas às outras, produzindo oligopólios e monopólios que agrediam violentamente a liberdade de informação através da eliminação dos concorrentes. Enquanto farisaicamente defendiam e defendem na teoria o princípio de Liberdade de Imprensa, amesquinham-no na prática, através da eliminação de fontes alternativas e independentes de informação, e da construção de poderosíssimas redes empresariais que interligam jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão pelo mundo a fora. E vão fabricando e procriando, nesse processo, o pensamento unificado, a “verdade” do seu interesse com feição de ciência.
Estou a bater nessa tecla já tão percutida sob a indignação da última notícia da nossa imprensa, que é a morte do Jornal do Brasil. Não que seja o desaparecimento deste jornal, em si mesmo, digno de grandes lamentações, pela forma como ele se apresentava ultimamente, ou, melhor dizendo, moribundamente. Mas pelo que foi em outros tempos, pelo que significou na vida cultural do País, especialmente do Rio, mesmo exibindo seu ideário político bem conservador. Refiro-me ao Jornal do Brasil do tempo em que existiam o Correio da Manhã, a Última Hora, o Diário de Notícias, o Diário Carioca, O Jornal e outros. Havia jornal diário para todos os gostos e pensamentos políticos, até o do Partido Comunista, a Imprensa Popular. Não que houvesse “liberdade de iniciativa” no setor, isto é, que qualquer um que quisesse pudesse lançar um jornal; mas havia, sim, diversidade, bem maior, muito maior do que hoje, e não era tão impossível projetar um diário novo.
Então, que história é essa de “liberdade de imprensa” tão apregoada? Que falsidade, que hipocrisia é esta?
Curioso é que a população tem consciência dessa falsidade ideológica, talvez pela freqüência com que essa questão (a falsidade) é denunciada pelos grupos políticos mais alvejados pela mídia. E não é demasia percuti-la mais e mais, numa busca permanente da verdade democrática.
O povo tem consciência e a manifesta através do desprezo que dedica aos estratagemas da mídia nas tentativas de construir uma opinião majoritária a favor dos seus interesses. A mídia tudo tem feito para desmoralizar o nosso Presidente, apresentando-o como uma pessoa inculta e despreparada. A mídia tudo tem feito para favorecer o candidato oposicionista à Presidência. De forma mais ou menos aberta ou da maneira mais sutil, penetrando pelo subliminar coletivo, a mídia tem se esforçado na defesa de suas posições políticas, da empresa privada e do mercado livre, mas o resultado que obtém é o inverso do que pretende: quanto mais ataca as figuras de Lula e de Dilma mais elas crescem nas pesquisas e mais as privatizações são repudiadas.
Eu quero ver nesse fenômeno um amadurecimento político dos brasileiros, que o tempo de prática democrática vai produzindo e que o próprio mundo vai reconhecendo. Mas os cientistas sociais têm um belo campo de pesquisa no esquadrinhamento da questão relativa à influência da nova mídia nesse processo. Refiro-me à internet, este meio de comunicação que reduz enormemente a exigência de capital para sua implementação e que revoluciona o sistema tradicional, abrindo um grau de liberdade completamente desconhecido daquele poder dominante que tanto clama quanto agride a Liberdade de Imprensa fechando suas fontes.
Obviamente as limitações deste campo ainda são muito grandes mas certamente se reduzirão num futuro não muito longínquo, com o aumento do grau de universalização do seu uso e com o aprendizado dos usuários no distinguir o que é sério do que é irresponsável na veiculação feita hoje pela internet.
Leia também:
– Livro: O curso das ideias – A história do pensamento político no Brasil e no mundo, escrito por Saturnino Braga (editado pela EFPA)