PT, trintão, por Selvino Heck
Fui quase tudo no PT: militante de base mesmo antes de sua fundação, dirigente (presidente do PT/RS, membro da Executiva estadual por 15 anos, membro do Diretório estadual durante 28 anos, membro do Diretório Nacional em dois períodos), deputado estadual constituinte, candidato em seis eleições, coordenador de campanhas. Sem falar na presença em governos municipais e agora no governo Lula desde 2003.
Fui quase tudo no PT: militante de base mesmo antes de sua fundação, dirigente (presidente do PT/RS, membro da Executiva estadual por 15 anos, membro do Diretório estadual durante 28 anos, membro do Diretório Nacional em dois períodos), deputado estadual constituinte, candidato em seis eleições, coordenador de campanhas. Sem falar na presença em governos municipais e agora no governo Lula desde 2003.
Ou seja, fui quase tudo no PT nestes 30 anos. TRINTA ANOS, quase uma vida. Olho para trás e lembro das primeiras reuniões de fundação do partido na Igreja da Pompéia em Porto Alegre, em meio às greves dos bancários com Olívio Dutra, da ressonância das greves do ABC com Lula. Lembro de uma reunião de lideranças comunitárias na vila Santa Helena, onde eu morava, na Lomba do Pinheiro, conjunto de vilas populares na periferia de Porto Alegre, quando apareceram militantes do MR-8 ‘disputando’ as mesmas lideranças e todos os presentes disseram que iriam entrar no PT. Lembro do difícil primeiro ano, quando eu Presidente da primeira Comissão Provisória do PT de Viamão, Região Metropolitana de Porto Alegre, (município governado há quatro mandatos pelo PT) e era preciso organizar o partido, juntar algum recurso para as atividades e a burocracia, e todos eram pedreiros, serventes, funcionários públicos, donas de casa, muitos deles militantes até hoje, sem dinheiro e experiência política.
Eram tempos de muita alegria e entusiasmo. Fazíamos tudo ao mesmo tempo: organizar as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e a Pastoral Operária, lutar por água, saneamento, qualidade do transporte público nas Associações de Bairro, apoiar a Oposição Sindical da Construção Civil, fazer sair todos os meses o jornal O Lomba, militar no Núcleo do PT da Lomba do Pinheiro fundado em 1980. E discutir política, fazer cursos de formação, andar a pé por todas as vilas para convidar as pessoas a participar.
O PT surgiu assim, no esforço militante de base, na luta pela Anistia e pelas Diretas-Já. Ninguém tinha experiência política ou partidária. Todos eram igual noviços: primeiro partido, primeiras eleições, aprendendo no dia a dia. A luta interna não existia porque ninguém sabia ou conhecia tendências. Seguido aparecia alguém de diferentes grupos organizados tentando ‘ganhar’ algum militante. A nós interessava, do mesmo jeito que melhorar o transporte público ou ter um sindicato combativo, ter um partido que todos e todas construíssem junto, para não ter de votar a cada eleição em candidatos que não eram conhecidos ou não tinham compromisso com os problemas das vilas populares ou dos trabalhadores.
1980 não é 2010 nem poderia ser. O PT cresceu em número de parlamentares, em número de governos – governa até o Brasil -, em estrutura. Como tudo na vida, institucionalizou-se. Os tempos também mudaram. Pela primeira vez na história do Brasil, partidos completam 30 anos na legalidade. A democracia brasileira e latino-americana está se consolidando, embora ainda sua precariedade e limites. O Brasil passaram por diferentes governos e pelo neoliberalismo, o mundo atravessou crises profundas como a atual. As utopias de então, 1980, não necessariamente são as mesmas de 2010, até porque o Muro caiu.
Que dizer então hoje do PT trintão? Está a caminho da maturidade ou envelheceu? É capaz de superar suas próprias crises e eventuais desvios, rejuvenescer-se, continuar ligando o sonho da transformação à realidade e à vida do povo, mesmo sendo instituição e governo?
Permaneço no PT como muitos ou a maioria que o começou. Há os que abandonaram o barco, alguns com justas ou aceitáveis razões, por não o verem mais revolucionário como há 30 anos, outros tantos o largaram porque abandonaram idéias de mudança e resolveram cuidar da vida.
Permaneço no PT porque ainda acredito em partidos como necessários para promover a mudança, embora milite e tenha sempre um pé nos movimentos sociais e na educação popular, até mesmo no governo Lula, com a construção da Rede TALHER de Educação Cidadã e do Programa Escolas-Irmãs.
Permaneço no PT porque, olhando o cenário brasileiro, não vejo nenhum partido capaz, como o PT, de apontar o futuro, capaz de mexer com milhares de filiados, fazê-los sair de casa, capaz de promover debates e reflexões, fazer ainda chorar de entusiasmo e paixão algumas vezes, como no último Encontro Estadual do Rio Grande do Sul, quando Tarso Genro foi escolhido candidato a governador.
Permaneço no PT, porque ainda tem a condição, mesmo nas imperfeições, não poucas, de lutar pelo novo e diferente, ainda permite a divergência e a troca de idéias, ainda consegue de algum modo enfrentar seus erros e mazelas, como quando institui um Código de Ética à luz da crise vivida em 2005.
É o partido dos meus sonhos e da perfeição? Talvez não seja mais. Talvez nunca tenha sido. Errou e acertou. Cabe perguntar: mais erros ou mais acertos? A complexidade econômica, social, cultural de um país como o Brasil ou mesmo a natureza humana exigem manter os pés no chão. Nada e ninguém é perfeito, embora algumas coisas possam ser melhores que as outras.
Inegavelmente, hoje ninguém o nega, o PT tem prestado enormes serviços ao Brasil e ao seu povo. Lutou contra a ditadura. Trouxe ao Parlamento vozes lá nunca ouvidas antes. Levou aos governos práticas como o Orçamento Participativo, que revolucionam a coisa pública. Levou para o cenário político, como ninguém tinha feito antes, os pobres e trabalhadores que ao longo de séculos sempre foram condenados ao fundo do palco ou no máximo a serem os depositantes do voto nos coronéis de plantão.
É certo que todos e todas que ajudamos o Partido dos Trabalhadores a ser trintão fizemos e fazemos história. Por isso, longa vida ao PT e aos seus militantes corajosos, dedicados, sonhadores, generosos, revolucionários.
*Selvino Heck é assessor Especial do Gabinete do Presidente da República
Publicado no Portal PT, em 10/02/2010