Recrudesce nos últimos tempos a campanha difamatória contra o MST e a luta pela reforma agrária, que é uma bandeira também da CUT e de entidades como Contag e Fetraf. Esta semana, houve mais uma movimentação de peças por parte da ultrareacionária CNA, desta feita através de uma suposta "pesquisa" feita pelo Ibope a pedido dos latifundiários.

Recrudesce nos últimos tempos a campanha difamatória contra o MST e a luta pela reforma agrária, que é uma bandeira também da CUT e de entidades como Contag e Fetraf. Esta semana, houve mais uma movimentação de peças por parte da ultrareacionária CNA, desta feita através de uma suposta "pesquisa" feita pelo Ibope a pedido dos latifundiários.

Embora nem sempre ande às mil maravilhas com os índices do Ibope, a Globo decidiu dar ampla divulgação para a "pesquisa" em seu Jornal Nacional. Para os incautos, o significado dos resultados foi o de que a reforma agrária, de modo geral, produz pobreza e atraso e, portanto, deve ser suspensa.

Foi de pronto classificada de ridícula pelo MST, em virtude de sua limitada área de abrangência – mil famílias em apenas nove assentamentos. De fato, segundo um profissional do mercado de pesquisas de opinião, a tal pesquisa, por partir de uma amostra intencional, ou seja, dirigida, carece de valor científico. "É como fazer pesquisa de popularidade do Lula só na porta da Volkswagen", exemplifica. A amostra do Ibope incluiu uma visita a uma comunidade conhecida como Caxangá, na região metropolitana do Recife, que nem assentamento é, e sim um ultrapassado Projeto Integrado de Colonização (PIC) criado na década de 1970 e que hoje é um apêndice da região urbana.

A fragilidade da "pesquisa" ainda se mostra através de um resumo divulgado na internet pelo próprio Ibope, o qual afirma que assentamentos visitados pertencem ao que o INCRA classificaria como de "estágio 7". O termo e a categorização simplesmente não existem, desmente o INCRA.

Se imaginarmos que só no Estado de São Paulo existem mais de 100 assentamentos, realmente surgidos da reforma agrária tal como compreendida atualmente, a visita a apenas nove assentamentos – ou melhor, oito – como universo de pesquisa faz o estudo da CNA realmente parecer ridículo.

Mais ridículo ainda em virtude do amplo Censo Agropecuário divulgado pelo IBGE dias antes e que comprova a pujança econômica e a importância social daquilo que é construído pela reforma agrária, ou seja, a propriedade rural familiar. O Censo analisou ao longo do ano de 2006 todas as propriedades rurais do Brasil, num total de 5 milhões e 200 mil, sendo que 4 milhões e 368 mil delas são propriedades familiares.

Ainda que não se saiba com exatidão quantas das propriedades familiares pesquisadas pelo Censo tenham origem em assentamentos da reforma agrária – o IBGE e o Ministério do Desenvolvimento Agrário estão fazendo o cruzamento dos dados neste momento – os resultados apontam claramente qual a vocação da agricultura familiar. E essa vocação contraria as alegações levantadas pela "pesquisa" da CNA e do televisivo Ibope.

Apesar de as propriedades familiares representarem apenas 24,3% das terras dedicadas à agropecuária no Brasil, mesmo sendo 84,4% do total de unidades rurais existentes, elas produzem a maioria de muitos alimentos essenciais que chegam à mesa do brasileiro: 87% da mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 58% do leite, 59% da carne suína e 50% das aves, sem falar em 30% da carne bovina e 21% do trigo, entre outros produtos destinados ao consumo interno.
Enquanto isso, explode nas grandes propriedades o plantio de soja, que se expandiu em todo o território 88% entre 1996 e 2006. Nas propriedades familiares, segundo o Censo, são produzidos 16% da soja brasileira, ficando a cargo das grandes propriedades a imensa maioria destinada ao mercado externo. As áreas destinadas à cana-de-açúcar cresceram 33%, boa parte destinada a virar combustível.

A importância da agricultura familiar – terras que não ultrapassam quatro módulos fiscais – no que tange a segurança alimentar do povo brasileiro já seria motivo suficiente para comprovar a importância do combate aos latifúndios e de destinar a terra a trabalhadores e trabalhadoras.

Mas não é só. Nos pequenos estabelecimentos agropecuários estão 74,4% dos trabalhadores rurais de todo o País, ou 12 milhões e 300 mil pessoas num universo de 16 milhões e 567 mil brasileiros no campo. Alternativa óbvia, portanto, à explosão demográfica dos grandes centros urbanos para a qual hoje está tão em moda propor e exigir soluções.

A CNA, através da frágil peça política que encomendou, afirma, no entanto que mais de 72% dos assentamentos não geram renda. Ora, o Censo Agropecuário do IBGE afirma que 69% das propriedades rurais familiares pesquisadas produziram receita média de R$ 13 mil nos 12 meses do levantamento. No mesmo período, segundo o IBGE, as pequenas propriedades geraram 47,13% (R$ 58 bilhões) da receita agrícola brasileira, apesar de, não custa repetir, ocupar apenas 24,3% das propriedades rurais do território.

Mas a CNA apela mesmo para a baixaria e demonstra todo o seu ódio aos pobres quando afirma que parcela significativa do dinheiro que circula nos assentamentos (49%) vem de programas de seguridade social. Os números não são esses. Segundo o Censo do IBGE, dos 5 milhões e 175 mil estabelecimentos pesquisados, pessoas que vivem em 2 milhões e 045 mil propriedades afirmaram ter receitas complementares à produção agrícola – e destes, 47% recebem aposentadorias e pensões e 34% são beneficiários de programas como Bolsa Família. Outros 31,6% recebem salários por atividades extras prestadas à iniciativa privada.

Previdência e programas sociais: recursos justos onde devem estar. Alavancar o consumo e produzir qualidade de vida, mesmo no seio das famílias que vivem nos centros urbanos, são desafios que passam e devem mesmo passar por programas de redistribuição de renda.

O Censo comprova que a maioria desses recursos, no universo rural, está beneficiando famílias do Nordeste, onde também a chegada da energia elétrica às propriedades cresceu 41,6% entre 1996 e 2006. Aliás, em todo o Brasil, a chegada da energia elétrica no campo cresceu 29% no período.

Não há erro nisso, ao contrário. O que falta é acelerar e aprofundar as mudanças.

Problema mesmo, apontado pelo Censo, é que a orientação técnica aos produtores ficou num péssimo patamar de apenas 22%, ainda assim na maioria das vezes para propriedades não familiares. Falha grave dos governos nas três esferas. Pior: quanto mais baixo o grau de instrução escolar do produtor, menor a assistência técnica.

O financiamento ainda era outro obstáculo grande segundo os números de 2006. 3 milhões e 63 mil propriedades abaixo de 100 hectares não obtiveram financiamento, sendo quase 30% deles por medo de contrair dívidas ou por entraves burocráticos.

O mais grave de todos os problemas foi revelado por manchetes no último dia 30 de setembro e, desta vez, infelizmente, com informações do próprio Censo: a concentração de terras aumentou no período de 10 anos.
Por tudo isso, reforma agrária já e fortalecimento da agricultura familiar, com garantia de assistência técnica e financiamento aos trabalhadores e trabalhadoras do campo.

Artur Henrique, presidente nacional da CUT

OPublicado no portal PT em 16/10/2009