Os barões da mídia estão fazendo de tudo para implodir a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), fixada em decreto presidencial para o início de dezembro. Na reunião desta quarta-feira (22) da sua comissão de organização, formada por dez representantes do poder público, oito das entidades empresariais e oito da chamada “sociedade civil”, eles nem sequer compareceram, numa nítida postura de desrespeito e arrogância. Além de esconder totalmente a convocação da Confecom nos jornais e telejornais, eles parecem apostar no seu esvaziamento e cancelamento.

Num primeiro momento, os donos da mídia se aproveitaram do corte no orçamento da Confecom – de R$ 8,2 milhões para R$ 1,6 milhão – para alegar dificuldades operacionais. O representante do Ministério das Comunicações, o assessor jurídico Marcelo Bechara, chegou a antecipar que o contingenciamento da verba “inviabiliza a conferência”, o que deve ter agradado os empresários. Como o recurso foi reposto por decisão do presidente Lula, que enviou projeto-lei ao Congresso, os empresários voltaram à carga para impor o temário e os critérios de participação no evento.

Visão excludente dos barões da mídia

Quanto ao temário, os barões da mídia, teleguiados pela Associação Brasileira das Empresas de Rádio e Televisão (Abert), defendem que a Confecom discuta exclusivamente o futuro da “era digital”. Eles rejeitam qualquer debate sobre monopolização do setor, desrespeito aos preceitos constitucionais sobre produção regional e diversidade informativa, inexistência de normas sobre o controle social, entre outros itens decisivos para a efetiva democratização das comunicações. Numa jogada inteligente, que parte do risco real de invasão estrangeira na produção de conteúdo, a Abert também se fantasia de nacionalista para exigir medidas de proteção à cultura nacional.

Já no que se refere aos critérios de participação, os empresários exigem uma composição que não representa a sociedade brasileira. Eles reivindicam uma reserva de 40% das vagas dos delegados e defendem uma conferência bastante restritiva, com apenas 300 participantes. No início, eles até propuseram 1/3 dos delegados, o que já gerou forte reação. “Será que os donos dos veículos de comunicação e das empresas de telefonia e internet representam 1/3 da população brasileira? Se isso fosse verdade, poderíamos comemorar a quebra da concentração de propriedade que marca a mídia no país, já que contaríamos com 60 milhões de operadores diferentes”, ironizaram Jonas Valente e Carolina Ribeiro, integrantes do Intervozes.

Governo rejeitará as chantagens?

Na reunião desta quarta-feira, sem a presença das oito entidades empresariais, o governo não se mostrou disposto a aceitar a chantagem dos barões da mídia na definição do regimento. Deixou implícito que realizará a Confecom mesmo com o boicote das corporações midiáticas. Também rejeitou qualquer limitação ao temário do evento e demonstrou simpatias com uma nova proposta de composição: 20% do poder público, 50% do setor de comunicação (na qual se daria a disputa aberta na eleição dos delegados entre os empresários e os meios alternativos) e 30% dos usuários da comunicação. Uma última rodada para fechar o regimento está agendada para 28 de julho.

Apesar da disposição manifesta de negociar com os empresários, não será nada fácil garantir sua participação na Confecom. Todas as reuniões da comissão organizadora têm sido tensas e longas, com os barões da mídia fazendo chantagens e ameaças. Evandro Guimarães, dirigente da Abert e funcionário da TV Globo, é o mais inflexível nas negociações. Da parte dos movimentos sociais, não se tolera qualquer recuo que descaracterize o objetivo do evento de apontar políticas públicas para democratizar os meios de comunicação. A batalha, como se previa, tem caráter estratégico.

Aumentar a pressão da sociedade

Segundo reportagem do TeleTime, agência especializada no setor, os barões da mídia temem que o evento reduza o seu descomunal poder econômico e político. “A Confecom deverá sair sem a presença dos empresários do setor. Essa posição, ainda tratada com reserva, mas confirmada informalmente por setores empresariais, parece ser o ponto final de uma série de acontecimentos cada vez mais complexos que cercam a organização dos trabalhos. Em essência, as empresas perceberam que, se continuarem a apoiar a organização da Confecom, endossarão um evento que será, inevitavelmente, de caráter crítico aos seus interesses”.

Nos próximos dias, a batalha de bastidores se acirrará. O lobby dos barões da mídia é poderoso. Conta com expressiva bancada no parlamento, atemoriza os mais vacilantes com o seu poder de manipular a “opinião pública” e tem seus agentes no Planalto. É preciso ver até onde o governo Lula está disposto a comprar a briga com este nefasto setor. Daí a urgência de reforçar a pressão social. Fóruns massivos, como o encontro paulista pela democratização da comunicação, em 1º de agosto, no Sindicato dos Engenheiros, ganham ainda maior relevância. A convocação da 1ª Confecom foi uma vitória dos movimentos sociais; não podemos deixá-la escapar pelos dedos.

Altamiro Borges é jornalista.

Publicado no blog do Miro em 24/7/2009