– Welcome, Mr. Obama. What about Cuba?

Ilusão de Obama se acredita que será recebido de outra maneira na reunião de Trinidad-Tobago. Ele pode falar da crise, da nova postura do seu governo diante do Iraque e do Irã, de tanta coisa, mas não conseguirá fazer com que sua atitude na relação com Cuba deixe de ser central.

A posição norte-americana sobre Cuba representa, na sua síntese, a posição imperial dos EUA em relação à América Latina. Quando sentiu que estava diante de um processo realmente revolucionário, que não apenas derrubava uma das tantas ditaduras que Washington apoiava na região, mas que o novo poder em Havana reivindicava de forma radical a soberania do país, como avançava na construção de uma sociedade justa, começando pela reforma agrária.

Até ali movimentos anti-ditatoriais e/ou nacionalistas sempre tinham sido derrubados ou cooptados. Mesmo os mais fortes, como os de Perón e de Getúlio ou até a Revolução Boliviana de 1952. Quando se deu conta que perdia o controle sobre um país que havia sido sua mais importante neocolônia, os EUA iniciaram uma ofensiva para tentar impedir que o poder revolucionário se consolidasse.

Valeram-se os EUA de todos os instrumentos de que podiam lançar mão: dos ataques com fósforo branco – iniciados antes mesmo da vitória de Fidel e seus companheiros, sobre territórios liberados da região oriental da Ilha -, a atentados ao líder da Revolução, ao envio de comandos terroristas, ao armamento da oposição direitista, ao armamento de grupos contrarrevolucionários na cordilheira central do país, ao e à calunia informativa e à tentativa de bloqueio econômico e diplomático.

Valiam-se os EUA de uma máxima segundo a qual “Sem cota, não há país”, isto é, sem que o poderoso vizinho do norte comprasse a safra de açúcar, o país não sobreviveria. A burguesia cubana fechava suas casas e ia aos EUA como quem vai de férias, esperando que o novo governo caísse, sob o impacto do boicote estadunidense.

Paralelamente, Washington desatava a maior ofensiva contra um país no continente, que incluiu a tentativa de invasão, em 1961 e o bloqueio naval em 1962. Ao mesmo tempo os EUA levaram a OEA a decretar o isolamento de Cuba no continente, com a ruptura de relações de todos os governos com a Ilha – menos o México, que manteve apenas relações diplomáticas -, fechando assim o cerco econômico, ao mesmo tempo que Washington dividia a cota de açúcar cubanos entre os países subservientes.

Passaram-se mais de 4 décadas e 10 presidentes norte-americanos, e Cuba sobreviveu e rompeu de fato o bloqueio, tanto em relação aos outros países do continente – Costa Rica, o último, acabou de restabelecer relações com Cuba -, como o próprio intercâmbio – e turismo, cultural, comercial – foi sendo restabelecido. Cuba manteve sua dignidade e sua soberania, ao mesmo tempo que construía a sociedade mais justa do mundo, para o que foi indispensável afetar profundamente os interesses dos EUA no país.

Foi isso que os EUA nunca perdoaram em Cuba – sua independência e seu papel de exemplo, ao romper com a dominação imperialista sobre a Ilha e construir os embriões de um novo tipo de sociedade, o socialismo. Cuba propõe a normalização de relações, sem nem sequer requerer a devolução de Guantánamo, como é absolutamente justo que ocorra, apenas que cada país respeite o tipo de sociedade do outro e tenham relações recíprocas de igualdade e respeito.

O problema para Obama é que, se quer provar nos fatos que tem uma atitude distinta com a América Latina, terá que prová-lo pelo término do bloqueio e a normalização de relações com Cuba. Pelo caráter que tem de sobrevivência da guerra fria e de expressão mais acabada da prepotência imperial nas relações com o continente, Obama não poderá ficar apenas na flexibilização da circulação de pessoas, do envio de dólares, do comércio já existente, mas terá que avançar para reuniões diretas com os dirigentes cubanos e o restabelecimento do último governo da América que resiste a ter relações normais com Cuba.

Da resposta à saudação com que todos receberão Obama em Trinidad-Tobago, dependerá a abertura de um novo período nas conturbadas, violentas e até aqui prepotentes relações dos EUA com a América Latina.

*Emir Sader é professor de sociologia na UERJ e dirige o Laboratório de Políticas Públicas da mesma universidade.

Publicado no Blog do Emir, em 08/04/2009