O Novo Ciclo de desenvolvimento em curso no Brasil é bastante diferente de períodos de crescimento experimentados pelo país, inclusive o do “milagre (1967/79)”.

Sólidos fundamentos macro econômicos, tais como; equilíbrio fiscal; dívida pública e vulnerabilidade externa em declínio, maior resistência diante de crises financeiras internacionais, fortalecimento do mercado, maior indiferença do setor produtivo à postura ultraconservadora do Banco Central, geração crescente de fontes internas de recursos, elevação de investimentos estrangeiros diretos, obtenção de significativos saldos comerciais (exceto 2008), os quais, em conjunto podem sustentar o crescimento que vem sendo observado desde 2004.

Em outras palavras: o novo ciclo de crescimento virtuoso em curso no Brasil, pode ser ainda sustentado através de políticas anti-cíclicas.

Um das características principais do novo ciclo está na estruturação de amplo mercado de massas no Brasil – a inclusão social de cerca de 40 milhões de pessoas (20 milhões das classes D e E para C e de 20 milhões da classe C para B) e o aumento do poder aquisitivo das classes médias, que vem sendo observados desde 2004, estimulam investimentos de empresas privadas e estatais que pretendem conquistar novos segmentos de mercado interno e aproveitar de oportunidades concretas oferecidas principalmente pelo crescimento de países emergentes.

Este modelo pode avançar na medida em que políticas fiscais e monetárias forem capazes de reduzir juros reais e tornarem mais justo o sistema tributário, o que reunirá condições para complementar o processo de inclusão social através de ações concretas para melhorar a distribuição de renda e da riqueza, imprescindíveis para expandir, ainda mais, o mercado interno e consolidar o ciclo: inclusão social e distribuição de renda para estimular investimentos, o que é bem distinto dos movimentos de crescimento com distribuição de renda ou crescimento para distribuir renda.

Além disso, diferentemente de outros períodos de crescimento, cujo financiamento de investimento exigiu a tomada de empréstimos internacionais e/ou expansão monetária com fortes impactos inflacionários, o Brasil experimenta, desde 2003, a geração crescente de excedentes financeiros (aumentos de lucros das empresas; remuneração elevada das aplicações financeiras em benefício das instituições financeiras, dos Fundos de Pensão e dos rentistas de um modo geral, bem como da poupança das famílias) viabilizam um Novo Padrão de Financiamento baseado em fontes domésticas de crédito e do mercado de capitais. Para tanto os bancos oficiais (BNDES, BB, CEF, BNB, BASA) e o sistema da Previdência Complementar devem ser envolvidos pelo governo para viabilizarem a criação de fundos de investimentos capazes de canalizar aplicações financeiras especulativas, principalmente de grandes corporações nacionais; evitar excessivas remessas de lucros pelas multinacionais e suspender reduções das contribuições, seja dos participantes, seja dos patrocinadores, dos fundos de pensão, procedimentos observados nos 3 últimos anos.

Em síntese: tudo deve ser feito para consolidar um novo movimento, de maior importância para o Brasil: “são bastante nítidas convergências entre Iniciativas Estratégias Empresariais para melhor aproveitamento dos impactos das Políticas de Inclusão Social e de Elevação do Poder Aquisitivo tanto, das Classes E e D, quanto das C e B.”

De um lado, as principais políticas públicas: Bolsa Família; Segurança Alimentar; PRONAF; Lei MPE; PROGER; Assentamentos; Territórios da Cidadania; Moradia Popular; Financiamentos adequados para Imóveis de classe média; Luz para Todos, valorização real do salário mínimo; aumento do emprego; instalação de Farmácias e de Restaurantes Populares; Universalização do Saneamento Básico; Bancarização, criação do microcrédito, prioridades governamentais, como moradia popular, universalização da educação, entre outros, fortalecem e expandirem o mercado interno de consumo.

De outra parte, as principais estratégias empresariais: aumento da escala e aproveitamento de sinergias, de complementaridades e de externalidades; geração de novos produtos mais baratos com menores preços; melhorias ou adoção de processos tecnológicos capazes de reduzir custos e preços; implantação de logísticas de distribuição e de comercialização segundo características regionais; financiamentos a clientes e fornecedores, garantem investimentos e a consolidação do circuito: aumento a renda disponível devido à inclusão social, à elevação do nível de emprego e do poder aquisitivo da população de modo geral, e à valorização do salário mínimo, que viabiliza o crescimento do consumo, o que estimula investimentos, resultando em aumento da produtividade e novamente do emprego e da renda que promovem nova fase de expansão do consumo.

Ademais, os investimentos em infraestrutura e aumentos da escala de produção e da competitividade, resultantes da implementação do PAC – Programa de Aceleração da Economia – e da PDP – Política de Desenvolvimento Produtivo – e do Plano Safra, possibilitam aproveitar oportunidades e minimizar impactos das crises externas.

Aqui, é necessário chamar a atenção: enquanto a participação do PIB dos Estados Unidos no PIB global caiu, em 10 anos, de 50% para 30%, o que diminui os efeitos da crise externa sobre os países emergentes, tais como as crises observadas na década de 90, a China, em particular, e Ásia de um modo geral constituem o novo epicentro do crescimento mundial. Esta Regia implementa ousados programas de inclusão social em seus mercados (a China pretende atingir 1 bilhão de pessoas até 2030 no mercado de consumo, hoje estimado em 300 bilhões de pessoas como resultado de crescimento acelerado observado nos últimos 10 anos) e, na medida em também países do Oriente Médio e da África, estão priorizando ações de inclusão social, podemos projetar significativas oportunidades para um país como Brasil, em especial, para agronegócios, biocombustíveis, matérias-primas (commodities), indústrias de média e até de alta tecnologia, serviços (tecnologias da informação, logísticas, saúde, etc.), além da exploração do petróleo e gás na camada pré-sal. Logo, mesmo que a crise financeira dos USA, Europa e Japão, transmitam impactos negativos consideráveis sobre a economia brasileira, o país reúne oportunidades superiores às ameaças externas.
Será fundamental, no entanto, promover mudanças de postura do BACEN, para evitar, mais uma vez, a interrupção do novo ciclo de investimentos de longo prazo, de que as empresas que tenham projetos para conquistar mercados no país e no exterior. Ademais, devem ser considerados os impactos inflacionários que são proporcionados pelas altas taxas de juros: “as empresas oligopólicas elevam seus preços para manter as margens de lucros e compensar aumentos de custos de capital de giro devido ao juros praticados pelo BACEN, o que, inclusive, pode sancionar impactos inflacionários em setores oligopolizados ou monopolizados”(1) Logo, quanto mais alto o patamar de juros reais, maiores as possibilidades de postergação de investimento estratégicos de longo prazo.
Em outras palavras: o BACEN, ao acreditar que elevações de juros racionalizem expectativas dos empreendedores sinalizando menores vendas; dos trabalhadores sinalizando que a redução do nível de emprego impedirá aumentos de salários; do governo para a necessidade de reduzir gastos públicos. O BACEN estima que o Brasil deve crescer no máximo 4,5% ao ano e manter uma taxa natural de desemprego em torno de 8% da população economicamente ativa para evitar pressões inflacionárias de demanda. É, portanto, uma metodologia perversa para controlar a inflação(2).

Diante da gravidade da crise internacional e de seus impactos no Brasil, o BACEN vem recorrendo, recentemente, à diminuição de depósitos compulsórios e de elevações das disponibilidades de recursos para redescontos, com objetivo de elevar a liquidez e o crédito para exportações, além de vender divisas de suas reservas para evitar excessivas desvalorizações do Real.

Este procedimento é contraditório com a manutenção da taxa básica de juros, mas ao mesmo tempo, aponta para a necessidade de mudanças de postura do BACEN no que diz respeito à compatibilização entre o controle da inflação sem prejuízo do novo ciclo de crescimento econômico em curso. Ou seja, na medida em que o BACEN reconhece a importância da flexibilização dos depósitos compulsórios e dos redescontos para elevar o nível de liquidez da economia e restabelecer o crédito diante da crise exterior, é legítimo sugerir significativas mudanças de postura na fixação das taxas de juros. O Banco Central do Brasil deve e pode ser aperfeiçoado para, em parceria com o IPEA o BNDES, e até mesmo BB e CEF, realizar estudos prospectivos de oferta por setor para identificar concretas possibilidades para estimular a capacidade de produção. O BACEN poderá, portanto, evitar a paralisação de decisões de investimentos que visam expandir e modernizar a capacidade instalada de cada setor como resposta aos próprios de sinais de evolução da demanda: seja através de reduções das taxas de juros, seja através da flexibilização seletiva, e orientada, dos depósitos compulsórios e dos redescontos, os quais constituem instrumentos de fundamental importância, não apenas para minimizar problemas de liquidez e restabelecer fluxos de crédito, mas também para estimular investimentos, o que, contribuirá, inclusive, para diminuir déficit fiscais e onerosos encargos para a dívida pública, aumentando a capacidade de investimentos governamentais.

Manoel de Medeiros, doutor pelo IE-UFRJ, 1º Lugar no Prêmio IPEA-CEF(2007), Novembro/2008

Notas:
1) “O IPA industrial subiu 1,13% abaixo do 1,71% apurado em julho, mas ainda assim uma variação que deve ser acompanhada com cautela, na avaliação do economista Gian Barbosa, da Tendências Consultoria Integrada. A desaceleração do IPA industrial na margem foi inferior à do IGP-10 e o núcleo ainda está com um número forte”, afirmou. Segundo cálculo da Tendências, o núcleo do IPA industrial, que exclui alimentos e combustíveis, passou de 1,4% em julho para 1,1% neste mês – sinal de que a desaceleração de preços ainda está bastante concentrada em commodities, salientou Barbosa. É o quinto mês consecutivo em que o núcleo do IPA industrial sobe acima de 1%. Em poucas palavras: o BACEN do Brasil pode estar atirando no próprio pé – as empresas pertencentes a setores oligopolizados repassam aumentos de custos financeiros, principalmente capital de giro, para preços visando manter suas margens de lucro. Assim, aumentos de juros afetam empresas que se localizam em setores concorrentes”.

2) O modelo utilizado pelo Banco Central para estimar o PIB Potencial (4,5% ao ano) e a taxa natural de desemprego (8% da PEA), é baseado na curva de Phillips e nas expectativas racionais dos agentes econômicos, nem que seja impostas pelo BACEN. O modelo não considera as assimetrias de informações e de poder de influência de cada segmento social. No caso do Brasil o BACEN utiliza o boletim Focus através de indicadores analisados pelos bancos como subsídios para estabelecer as taxas de juros (raposa no galinheiro), enquanto alguns Bancos Centrais, que conquistaram autonomia operacional, utilizam indicadores sobre o comportamento do nível emprego e projeções de investimentos para expansão da capacidade instalada por setor.