Luzes nos porões
Há confusões deliberadas ou não sendo difundidas no debate sobre a punição a torturadores no autoritarismo. Não há projetos que tratem da revogação da Lei de Anistia de 1979. O que está em debate é se é jurídico punir, é a responsabilização criminal dos autores de crimes contra a humanidade.
Há confusões deliberadas ou não sendo difundidas no debate sobre a punição a torturadores no autoritarismo. Não há projetos que tratem da revogação da Lei de Anistia de 1979. O que está em debate é se é jurídico punir, é a responsabilização criminal dos autores de crimes contra a humanidade.
Também é uma meia verdade que a Lei de Anistia foi a grande lei de reconciliação. O projeto de Anistia Ampla, Geral e Irrestrita foi derrotado por 8 votos em 22 de agosto de 1979 num Congresso com senadores “biônicos” e uma maioria fruto de um casuísmo do Pacote de Abril de 1977. Após a derrota do projeto da sociedade brasileira, Theotonio Vilela, usineiro da Arena convertido à democracia, timoneiro da Anistia, disse, frustrado: “A ditadura serviu-se da Anistia ao se conceder a impunidade”.
Mais de uma centena de juristas, juízes, procuradores federais e estaduais, advogados e mestres do Direito defendem a punição aos torturadores. A Corte Interamericana dos Direitos Humanos e as cortes supremas do Chile e da Argentina (com base em convenções e tratados de que o Brasil é parte) não reconhecem prescrição nem critérios de anterioridade para perpetuar a impunidade destes crimes.
Outro equívoco lamentável é associar a prática dos crimes contra a humanidade por aquelas pessoas naquele momento à instituições democráticas. Policiais federais participaram da barbárie e hoje a PF é uma instituição admirada e respeitada. As Forças Armadas estão integradas à democracia. Nas PMS e polícias civis há novas gerações que repudiam a tortura e a corrupção.
Não há como abafar o debate. Juízes brasileiros já condenaram o Estado a abrir arquivos militares. Procuradores federais acolheram ações declaratórias de famílias contra torturadores e requisitaram inquéritos sobre o desaparecimento de três argentinos no Brasil em 1980. Anistia não é amnésia. O direito à memória e à verdade é parte importante na formação do cidadão.
Com o Seminário Anistia e Democracia, Minas entra neste debate nos dias 21 (CREA) e 22 (Izabela Hendrix) de agosto, com serenidade.
Nilmario Miranda, jornalista, foi Ministro dos Direitos Humanos. É vice-presidente da Fundação Perseu Abramo.