Periscópio Internacional 24 – Um olhar sobre o mundo
PERISCÓPIO INTERNACIONAL 25
Um olhar sobre o mundo
Cristina Kirchner enfrenta produtores rurais
Referendos nos departamentos de Beni, Pando e Tarija na Bolivia
Uma nova chance para uma saída política para a insurgência colombiana
Fernando Lugo compõe seu governo
Barack Obama será o candidato do Partido Democrata
Últimas viagens para o exterior do Presidente Bush
União Européia restringe imigração ainda mais
Maioria dos eleitores irlandeses diz não ao Tratado de Lisboa
Campanha eleitoral violenta no Zimbabwe
Comitê Internacional do Fórum Social Mundial ampliou prazos
Cristina Kirchner enfrenta produtores rurais
A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, vem enfrentando pressões do setor agrário do país a mais de três meses devido a um imposto que foi introduzido pelo seu governo sobre as exportações de bens agrícolas.
Esta mobilização em determinados momentos levou ao desabastecimento de alimentos nas grandes cidades e também contribuiu para o aumento dos preços. Porém, a oposição dos agricultores vem sendo enfrentada pelo governo, pois o setor agrário tem auferido grandes lucros e os recursos provenientes do imposto podem inclusive servir para complementar a renda na agricultura nos momentos de queda nos preços.
Os recursos deste imposto também são fundamentais para investir, no fortalecimento da infra-estrutura do país como a geração de energia, por exemplo, que não consegue atender a demanda crescente numa conjuntura de retomada da produção industrial devido, principalmente, à falta de investimentos durante o governo neoliberal de Menem.
Além da dificuldade política que qualquer governo progressista tem para lidar com os grandes proprietários rurais, a oposição ao atual governo central na Argentina, particularmente a UCR, tem forte base neste setor. Aliás, ao contrário da maioria dos países latino americanos na Argentina nunca ocorreu a definição sobre a hegemonia política entre o setor agro-exportador e o setor industrial urbano, fonte de muitos conflitos e de golpes militares no passado não tão distante.
O presidente brasileiro, Getúlio Vargas, estabeleceu um imposto semelhante sobre a exportação de café após a crise de 1929 para financiar o processo de industrialização, estabilizar os preços e enfrentar a recessão. O Brasil naquela época foi um dos países do mundo que superou as conseqüências desta crise com maior rapidez.
Cristina Kirchner tem contado com forte apoio do movimento sindical nesta discussão, particularmente, da CGT de forte tradição peronista. A CTA, mais à esquerda no movimento sindical enfrenta dificuldades para se posicionar, pois a Federação Agrária, que representa pequenos produtores rurais, é sua filiada e está engajada nas mobilizações contra a medida do governo.
Agora ela foi remetida para discussão e decisão do Congresso Nacional e se for transformada em lei, deverá amenizar as mobilizações.
Referendos nos departamentos de Beni, Pando e Tarija na Bolivia
Concluiu-se no dia 22 de junho a seqüência de três outros referendos em departamentos bolivianos sobre a proposta de autonomia após o primeiro realizado em Santa Cruz no mês de maio. (Leia mais no Periscópio 24).
Embora estes referendos não tenham base legal e tampouco sejam reconhecidos pela corte eleitoral do país, os departamentos de Beni, Pando e Tarija também realizaram os seus e o resultado foi praticamente igual ao de Santa Cruz: aproximadamente 80% dos que votaram foram a favor da autonomia. Mesmo com 30% de abstenção em média, estes resultados significam que um pouco mais de 50% da população apóia mudanças neste sentido.
A resposta política do governo de Evo Morales, já em seguida ao referendo de Santa Cruz, foi a de encaminhar a proposta aprovada no Senado, onde a oposição tem ligeira maioria, de realizar um referendo revogatório para confirmar ou não a continuidade dos atuais mandatos presidenciais e também dos governadores. Apesar de esta proposta ter sido aprovada no Senado por iniciativa dos partidos de oposição da direita, os governadores em questão agora rejeitam a idéia.
Se não houver um processo de negociação que de fato defina uma relação federativa no país, haverá um aprofundamento do impasse e com conseqüências imprevisíveis. A descentralização federativa poderia ser definida no marco da nova Constituição, mas que a direita não aceita, pois ela inclui a perda de uma série de privilégios da minoria branca e rica e instaura uma série de direitos para a maioria da população originária e pobre.
A situação no país é muito tensa e o presidente algumas vezes tem dificuldades de se deslocar para algumas regiões onde a direita é mais forte. Ele teve que cancelar recentemente uma atividade em Sucre e alguns indígenas que não souberam a tempo deste cancelamento foram agredidos e humilhados por grupos de jovens de classe média, sem interferência das autoridades locais, em mais uma clara demonstração de que a tensão política atual tem origem nas questões de classe e etnia. (Leia mais em: www.alainet.org).
Uma nova chance para uma saída política para a insurgência colombiana
O serviço secreto colombiano, vez ou outra, “vaza” notícias à imprensa sobre supostos contatos dos presidentes Hugo Chavéz da Venezuela e Rafael Correa do Equador com as FARC que constariam dos registros do Lap Top de Raúl Reyes, um de seus comandantes, que foi apreendido quando ele foi morto em março pelo exército colombiano em território equatoriano.
Esta provocação tem sido respondida com inteligência e firmeza pelos dois presidentes, propondo que as FARC libertem todos os reféns em seu poder e que negociem sua integração à vida política da Colômbia. É exatamente o que não interessa a Álvaro Uribe, presidente do país, embora ele não possa dizê-lo, pois a luta contra este grupo guerrilheiro, levada adiante com violência pelo seu governo, lhe rende pontos junto à opinião pública interna e apoio financeiro internacional por intermédio do “Plan Colombia”.
Este “plano” foi inaugurado ainda durante o governo Clinton nos EUA para apoiar a erradicação da plantação de coca na Colômbia, mas serviu principalmente para combater a guerrilha das FARC. A rigor o objetivo principal está longe de ser atingido, pois a produção de cocaína praticamente se manteve estável durante estes anos todos e os dados divulgados recentemente pelo Sistema Nacional de Monitoramento (Simci) da Colômbia revelam que as áreas cultivadas aumentaram 25,7% de 2006 para 2007.
Correa questionou “que futuro tem uma guerrilha que combate um governo democraticamente eleito, que não tem nenhum apoio popular no século XXI? Por favor, basta, deixem as armas, vamos ao diálogo político e diplomático para encontrar a paz”. Disse ainda que está disposto a negociar com as FARC para libertar os reféns mesmo sem a anuência do governo colombiano.
Aliás, as relações diplomáticas entre Equador e Colômbia foram rompidas após a injustificada invasão do território equatoriano pelo exército colombiano e até hoje não foram restabelecidas.
O fato novo que surgiu do lado da insurgência foi a recente morte do comandante máximo das FARC, Manuel Marulanda, aparentemente por problemas de saúde. Ele foi substituído por Alfonso Cano, o que poderia ser um reforço para uma solução negociada, uma vez que não há solução militar para nenhum dos dois lados.
Fernando Lugo compõe seu governo
A posse de Fernando Lugo como presidente do Paraguai está prevista para ocorrer no dia 15 de agosto e ele já apresentou praticamente todo o seu futuro ministério.
O Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA) ao qual pertence o vice-presidente Federico Franco terá quatro ministérios importantes: agricultura e pecuária, indústria e comércio, justiça e trabalho e obras públicas e comunicações cujos titulares serão respectivamente Candido Vera, Martin Heisecke, Blas Llano e Efrain Alegre.
O Ministro da Educação se chama Horácio Galeano Perroni. Ele é um colorado que já foi ministro nos anos 1990. Depois se aliou a Lino Oviedo, mas não deixou o partido quando este o fez. O ministro da defesa será o general de divisão, Luis Nicanor Bareiro Spaini.
A ministra da saúde pública será Esperanza Martinez, o Secretário de Assuntos Sociais será Pablino Cáceres e Miguel A. Lopez Perito assumirá a Secretaria Geral da Presidência. Estes provêm do Movimiento Tekojojá.
Há dois ministros provenientes dos partidos social democratas que fazem parte da “Alianza Para el Cambio” (APC) que são Rafael Filizzola do Partido Democrático Progressista (PDP) que assumirá o Ministério do Interior e Milda Rivarola do Partido País Solidário (PPS) que assumirá o ministério das Relações Exteriores. Este exercerá um papel estratégico principalmente devido às negociações do Mercosul e da intenção do novo governo de rediscutir aspectos do Tratado de Itaipu.
O ministro da fazenda será Dionísio Borda que já ocupou este cargo durante o atual governo de Nicanor Frutos entre 2003 e 2005, mas renunciou por conflitar-se com a maioria colorada no ministério atual.
A sua escolha foi bem recebida pelo setor empresarial. Ele foi responsável pelo ajuste da economia naquela época e que trouxe certa estabilidade econômica ao país. É considerado por muitos um neoliberal, mas o seu discurso atual é muito afinado com as propostas de Fernando Lugo de promover a reforma agrária no Paraguai onde 2% dos proprietários rurais detêm a posse de 82% das terras e de renegociar os preços da energia elétrica das Usinas de Itaipu e Yaciretá. Também já declarou que não renovará o acordo com o FMI que, por coincidência, vence no mesmo dia da posse presidencial e que o combate à ineficiência das empresas públicas paraguaias não passa necessariamente pela privatização delas.
Tudo indica que este ministério representa a correlação das forças partidárias da APC e uma opção por mudanças negociadas, pois lançam algumas pontes em direção à oposição. Não está claro como será a participação no governo dos movimentos sociais que também apoiaram a candidatura de Fernando Lugo e que foram fundamentais para a sua vitória e, além disso, também está indefinido como será construída a maioria parlamentar uma vez que o Partido Colorado, a UNACE do ex-general Lino Oviedo e o Partido Patria Querida, somados, têm a maioria de senadores e deputados.
Estes partidos ficaram com, respectivamente, 15, 9 e 4 senadores contra 14 do PLRA, um do PPS, um do PDP e um do Movimiento Tekojojá. De um senado de 45 cadeiras o novo governo terá 17 contra 28. Na Câmara de Deputados, a oposição, na mesma ordem ficou com 30, 15 e 4 cadeiras, um total de 49 contra 31 do governo, sendo que o PLRA tem 29 delas, o PDP uma, assim como o Movimiento.
O pedido de autorização para deixar a Presidência da República apresentado por Nicanor Frutos para assumir uma vaga no Senado é um sinal de que ele pretende liderar pessoalmente a oposição colorada, uma vez que alguns setores do partido o responsabilizam pela derrota. Ele aposta nas dificuldades que o novo governo enfrentará para tentar voltar ao governo em 2013.
Desta forma restariam as opções de eventuais acordos do governo de Fernando Lugo com setores da oposição por intermédio da UNACE e do PPQ ou ainda com os parlamentares colorados que seguem a liderança do ex-vice-presidente, Luis Castiglioni. Este rompeu com Nicanor Frutos, pois considera que a escolha de Blanca Avelar nas prévias coloradas para indicar o candidato a presidência foi por meio de fraude organizada pela cúpula do partido.
Barack Obama será o candidato do Partido Democrata
As primárias democratas terminaram em 3 de junho com a realização das últimas nos estados de Montana e Dakota do Sul com Barack Obama à frente de Hillary Clinton com 1.763 votos contra 1.640.
No mesmo dia, por intermédio de um rápido movimento articulado pela cúpula do Partido Democrata, dezenas de delegados natos ou “super delegados” como também são conhecidos, que ainda não haviam se posicionado publicamente, revelaram sua preferência e assim Obama reuniu o apoio de 395 deles contra 286 para Hillary Clinton.
Diante deste resultado, se a convenção democrata fosse naquele momento, ele teria um total de 2.158 votos contra 1.926 para Hillary Clinton, sendo que bastaria obter 2.118 votos para ser indicado candidato.
No dia 7 de junho ela fez um discurso reconhecendo a vitória de Barack Obama e se dispondo a trabalhar pela vitória democrata em novembro.
Por ora não há ainda sinais sobre quem será o escolhido para ser o candidato a vice-presidente na chapa democrata. Há uma “comissão de notáveis” tratando do assunto e os estrategistas da campanha deverão propor alguém que possa contribuir para superar as dificuldades de Obama com certas franjas do eleitorado como os trabalhadores formais brancos, judeus e idosos.
De todo modo, na prática a campanha já se iniciou e com vantagens nas pesquisas para Barack Obama na disputa contra o candidato republicano John McCain de aproximadamente 12% de acordo com recente levantamento feito pelo jornal Los Angeles Times em parceria com a Rede de TV Bloomberg.
É visível que a população americana está cansada com as políticas de George Bush. No plano interno com a economia e no externo com a Guerra do Iraque. Ele atingiu níveis de impopularidade inéditos para um presidente americano e a maioria da população quer mudanças. A candidatura de Obama se apresenta como a que pode proporcioná-las, embora a maioria da população ainda confie mais em McCain do que nele no que diz respeito à política externa de segurança.
Esta pesquisa também relevou que 89% dos que preferiam a candidatura de Hillary Clinton se dispõem a votar em Obama e apenas 11% em McCain. Esta é uma boa notícia para ele, pois além de favorecer sua campanha também deve reduzir a pressão pela escolha de Hillary Clinton como vice-presidente. (Leia a íntegra da pesquisa em: www.calendarlive.com/media/acrobat/2008-06/40351172.pdf ).
Últimas viagens para o exterior do Presidente Bush
O presidente americano, George Bush, realizou duas viagens para o exterior durante o mês de junho e que deverão ser as últimas de seu mandato de presidente dos EUA. Sua agenda foi totalmente belicista do começo ao fim.
A primeira viagem começou pela Slovênia onde participou da Cúpula Anual da União Européia. Ele aproveitou este momento para também se reunir com os governantes tchecos e poloneses para reafirmar a intenção de respectivamente instalar radares e uma bateria de mísseis nestes dois países conforme já anunciado anteriormente.
Esta instalação enfrenta forte oposição do governo russo, que a considera uma ameaça ao seu território e mais um passo para envolver ainda mais os países do ex-bloco soviético na aliança militar coordenada pelos EUA por meio da OTAN. No entanto, para frustração de Bush, surgiu a notícia alguns dias após a visita que o programa deverá sofrer adiamento por motivos técnicos, o que permitiria ao novo presidente americano a ser eleito em novembro simplesmente suspendê-lo.
Os demais países que visitou foram Alemanha, Itália, Santa Sé, França e Reino Unido para discutir a adoção de sanções mais fortes contra o Irã devido ao seu programa nuclear e no caso do Reino Unido para também pressionar o Primeiro Ministro Gordon Brown a não prosseguir com sua promessa de retirar as tropas britânicas do Iraque. A visita a Santa Sé foi para retribuir a recente ida do Papa Bento XVI aos EUA, uma vez que há cada vez maior afinidade entre o conservadorismo de ambos.
A segunda visita foi ao Oriente Médio começando pelo Kuwait, Bahrein e Emirados Árabes, passando depois por Arábia Saudita e Israel e concluindo com o Egito. Neste último houve um encontro com o presidente palestino Mahmoud Abbas e não passou despercebido que este ocorreu no Egito ao invés de se realizar em Ramallah na Cisjordânia ocupada por Israel.
A tônica dos encontros também foram as críticas ao Hamas, Hezbollah, Síria e, principalmente, ao Irã e a suposta ameaça que este último representaria para seus vizinhos. Negociou um pacote de armas no valor de US$ 11 bilhões com o Kuwait e Arábia Saudita e outro três vez maior com Israel.
Ou seja, Bush promove discórdia e problemas até o fim de seu mandato, além de despejar US$ 40 bilhões em armas numa região mais do armada e suficientemente conflagrada por conflitos.
União Européia restringe imigração ainda mais
Muitos europeus estão histéricos em função do tema imigração embora todos os números apontem para o fato de não ser uma questão tão relevante. Mesmo na Espanha que tem recebido o maior número de imigrantes nos últimos anos devido a sua localização geográfica e crescimento econômico superior à média européia, os imigrantes são menos que 5% do total da população e contribuem com três vezes em impostos do que eventualmente representam em termos de custos sociais.
No entanto, o tema tem sido explorado pela direita como a razão dos problemas e preocupações que hoje afligem a maioria dos países europeus, entre eles segurança, desemprego e queda na qualidade do bem estar social. Políticos como Sarkozy na França e Berlusconi na Itália tem ascendido ao governo nas últimas eleições devido ao seu discurso xenófobo.
A medida mais recente foi a aprovação de uma legislação comunitária no Parlamento Europeu chamada “Diretriz de Retorno”. Esta regulamenta o tratamento a ser dado a imigrantes que não têm documentos em ordem ou autorização para permanecer em território europeu. Quando a legislação entrar em vigor daqui a dois anos, os imigrantes nestas condições poderão ser detidos por até 18 meses, ser expulsos e proibidos de retornar por períodos mínimos de 5 anos. Mesmo crianças desacompanhadas poderão ser expulsas e não necessariamente para seus países de origem.
A desculpa cínica dos que aprovaram esta proposta, aliás, duramente criticada por muitos governantes latino americanos como Lula, Chávez e Evo Morales, era que havia necessidade de uma regulamentação para o tema e que a partir de agora “ninguém ficará mais detido indefinidamente”.
A lei foi aprovada por 369 votos a favor incluindo 34 socialistas, principalmente alemães e espanhóis; 197 contra e 106 abstenções em sua maioria socialistas que queriam algum tipo de “Diretriz”, embora mais branda.
No entanto, ocorreram várias votações anteriores, em geral sobre emendas apresentadas pelos Socialistas, Verdes e pelo Grupo Unitário de Esquerda (GUE) que pretendiam “suavizar” um pouco a diretiva. Porém, mesmo estas emendas não passaram.
Uma delas simplesmente propunha rejeitar o texto da diretiva na íntegra. Nesta votação houve 114 votos a favor da rejeição incluindo os votos de 17 socialistas, 11 abstenções e 538 votos contra a rejeição incluindo a maioria dos integrantes do Partido Socialista Europeu.
Vários analistas políticos europeus vêm afirmando já há algum tempo que os socialistas estariam se aproximando do centro para ampliar sua votação e obter maiores consensos, mas não estão considerando que o centro também se moveu, mas foi para a direita.
Maioria dos eleitores irlandeses diz não ao Tratado de Lisboa
A maioria dos eleitores da Irlanda, 53,4% dos que compareceram para votar, disseram não ao Tratado de Lisboa da União Européia. Este Tratado foi aprovado pela Cúpula da União Européia em 2007 devido ao fracasso na tentativa de aprovar a Constituição Européia em 2005.
Tanto a anterior Constituição quanto o Tratado teriam que ser ratificados pelos países membros da UE para entrar em vigor. Porém, no caso da Constituição havia o entendimento em vários países de que ela deveria ser submetida a referendos devido ao seu peso jurídico. Quando a proposta foi derrotada nos referendos da França e Holanda, houve um recuo e a Constituição foi transformada em Tratado, pois este poderia ser submetido para aprovação apenas nos respectivos congressos nacionais e assim ser ratificado mais facilmente.
O que está em jogo nesta discussão é a redução do peso de cada Estado Nacional nas decisões comunitárias em detrimento de maior institucionalidade da UE. O Tratado prevê a redução do número de comissários, criação do cargo de ministro de relações exteriores a eleição de um presidente da União Européia. O quorum de votos necessários para aprovar decisões também seria reduzido.
Desta forma se tornaria mais fácil e rápido aprovar medidas e diretrizes relacionadas a integração européia, o que muitos consideram uma temeridade diante da crescente influência da direita na Europa e as tentativas de regredir vários aspectos do Estado de Bem Estar Social Europeu, como a recente discussão para ampliar a jornada de trabalho semanal para 60 horas. (Leia mais em: www.elpais.com ).
Na Irlanda houve o entendimento do poder judiciário de que o Tratado teria que ser submetido a um referendo, pois a simples ratificação pelo parlamento não seria suficiente.
Os partidos políticos irlandeses que fizeram campanha pelo “Não” ao Tratado foram os da esquerda, em particular, o Sinn Fein, para preservar a soberania do país.
Os demais membros da UE agora avaliam os passos a tomar. Jean-Pierre Bildunterschrift: Jouyet, secretário de Estado francês para Assuntos Europeus, alertou que o processo de aprovação nos demais países não deveria ser interrompido. Ele sugere que a validade do documento seja reduzida a 26 Estados e que se ofereça à Irlanda um acordo especial. Já o presidente do Partido Socialista Europeu no Parlamento Europeu, o alemão Martin Schulz, defende que o processo seja suspenso. Só assim o Parlamento poderia aumentar a pressão para que os chefes de Estado e governo europeus se pronunciem a respeito do futuro do bloco.
De qualquer maneira, não há um “Plano B” muito eficaz, até o momento. (Leia mais em: http://www.dw-world.de/dw/article/0,2144,3411142,00.html).
Oriente Médio
Ehud Olmert, o primeiro ministro de Israel tem conseguido se manter no poder apesar da impopularidade de seu governo provocada pela derrota militar que sofreu quando atacou o sul do Líbano em meados de 2006.
Agora ele está envolvido em acusações de ter recebido dinheiro de forma ilegal para financiar suas campanhas políticas e vem sendo pressionado por integrantes de seu partido Kadima para renunciar à presidência desta agremiação e consequentemente ao cargo de primeiro ministro. O Partido Trabalhista somou-se a estas pressões ameaçando colocar uma proposta de dissolução da atual coalizão de governo em votação no parlamento. No final chegou-se a um acordo dando um prazo de três meses para que as questões sejam esclarecidas e assim Olmert continuará no cargo, pelo menos, um pouco mais.
Ele tem promovido algumas iniciativas no plano externo para tentar recuperar algum nível de apoio popular. Porém, se avalia que em alguns casos, como a tentativa de negociar um acordo de paz com a Síria, não haja apoio suficiente nem no interior do seu governo para alcançá-lo uma vez que implicaria na devolução das Colinas de Golã tomadas por Israel durante a Guerra dos Seis Dias em 1967 e atualmente ocupadas por colonos israelenses. Estas negociações vêm sendo intermediadas pela Turquia.
Há outras duas negociações em andamento. Uma com o Hezbollah do Líbano, intermediada pelo governo do Yêmen em torno de uma possível troca de prisioneiros. A outra é com o Hamas, intermediada pelo Egito, e que levou ao cessar fogo e redução parcial do bloqueio da Faixa de Gaza.
Ao mesmo tempo, o governo israelense tem ameaçado o Irã de forma explícita prometendo bombardear suas instalações nucleares se este país atingir o estágio de produzir armas atômicas. Se isto ocorrer, a reação iraniana será, no mínimo, a de bloquear o Estreito de Ormuz por onde hoje passa grande parte do petróleo do Oriente Médio enviado à Europa e outros países ocidentais. Neste caso, o atual preço de US$ 140.00 por barril será considerado uma bagatela diante da elevação de preços que tal medida provocaria.
Fim da monarquia no Nepal
A Assembléia Constituinte do Nepal no dia 28 de maio decidiu por quase unanimidade abolir a monarquia Shah de quase 240 anos de existência e instaurar a República. O rei Gyanendra recebeu o prazo de 15 dias para deixar o palácio real em Katmandú que será transformado em museu.
Este prazo foi respeitado e quando a desocupação ocorreu descobriu-se que havia uma cortesã de 94 anos que vivia ali e que somente deixava o palácio para eventuais visitas a um templo budista. Ela havia servido o Rei Thribuwan, avô de Gyanendra e que governou entre 1911 e 1955. Foi permitido que ela continuasse vivendo no palácio.
Porém, este fato insólito demonstra o quanto tem que ser feito para que o país recupere o atraso econômico, social e político que, aliás, está também na raiz dos recentes conflitos no Tibet e nas tentativas de também promover mudanças no Bhutan, outro pequeno reino situado nos Himalayas.
Campanha eleitoral violenta no Zimbabwe
O primeiro turno das eleições presidenciais foi realizado em 29 de março. O resultado oficial anunciado mais de um mês depois colocou o candidato da oposição Morgan Tsvangirai do Movimento pela Mudança Democrática (MDC) em primeiro lugar com 47% dos votos e o atual presidente do país Robert Mugabe com 44%, embora a apuração paralela da oposição apontasse a vitória já no primeiro turno com 50,3% dos votos.
Quando este resultado foi anunciado e a data do segundo turno foi marcada, os membros da oposição expressaram dúvidas se deveriam concorrer ou não diante das chicanas e intimidações que vinham sofrendo desde a campanha do primeiro turno e que se acirraram durante o período em que não houve a proclamação do resultado. (Leia mais no Periscópio 24).
Entretanto, apesar de todas as dificuldades, o MDC decidiu participar. O preço foi a morte de 85 de seus membros e centenas de presos. Houve muitas pessoas ameaçadas que tiveram que fugir de suas casas. O próprio candidato da oposição foi detido quatro vezes, numa delas por mais de oito horas, sob a alegação que estava fazendo “campanha ilegal” e o secretário geral do MDC ficou preso por duas semanas ameaçado de traição, podendo inclusive ser condenado a morte.
Mugabe aumentou a temperatura na última semana ao fazer várias declarações que jamais entregaria o poder à oposição e poucos dias antes da eleição, Tsvangirai anunciou que não participaria mais do processo, pois não poderia pedir às pessoas que arriscassem suas vidas para comparecer às seções eleitorais e votar no MDC.
Esta não foi uma posição unânime entre os integrantes de seu partido, mas estava claro que o atual governo não permitiria que Mugabe fosse derrotado. Embora ele tenha apoio de menos de 50% da população, ainda conta com quase 40% dos votos, bem como apoio do exército e dos veteranos da guerra da independência, força suficiente para se manter no poder pela fraude eleitoral ou pelas armas.
Os países vizinhos que poderiam pressioná-lo para aceitar um processo democrático e livre, particularmente, a África do Sul, preferiram se omitir. No caso sul africano há ainda muita gratidão pelo apoio de Mugabe à luta contra o apartheid e como a União Européia e os EUA impuseram sanções econômicas contra o Zimbabwe devido à desapropriação das terras dos fazendeiros brancos durante os últimos quatro anos, bem como pela falta de democracia na condução do processo eleitoral, poucos governantes da região se interessam em colocar “água no moinho” dos ex-colonizadores.
O segundo turno foi realizado e o nome de Morgan Tsvangirai foi mantido na cédula apesar de sua desistência. Conforme previsto, Mugabe recebeu mais de 70% dos votos, embora a abstenção tenha sido maior que 50%. A apuração, ao contrário do primeiro turno, foi feita em menos de dois dias e o juiz eleitoral ungiu-o com a faixa presidencial assim que ela terminou.
EUA e Inglaterra declararam não reconhecer o resultado e que ampliarão as sanções atualmente implementadas. A Unidade Africana que se reuniu no Egito entre os dias 30 de junho e 1 de julho adotou uma resolução sobre a situação do Zimbabwe recomendando a conformação de um governo de “unidade nacional”.
Esta foi uma posição inusitada, pois não é costume desta organização se imiscuir no que considera assuntos de ordem interna dos países membros, porém, na prática, é também uma posição inócua diante da violação sistemática dos direitos humanos no Zimbabwe, bem como da deterioração do quadro político e econômico do país.
Preparação da reunião do G-8
A reunião de cúpula dos chefes de estado do G – 8 está prevista para se realizar entre os dias 7 e 9 de julho na ilha de Hokkaido no Japão.
Em meados de junho houve uma reunião preparatória dos ministros de finanças do grupo, onde as principais preocupações foram quanto a subida desenfreada dos preços do petróleo, a desvalorização do dólar americano e o crescimento inflacionário mundial, obviamente conectado a primeira questão.
Porém, não foram levantadas alternativas, além da manifestação de preocupações. Provavelmente, preferirão deixar tudo para ser resolvido por meio das forças de mercado. Mesmo a proposta de criar um fundo de US$ 10 bilhões até o final de 2008 para combater as mudanças climáticas não teve consenso e dificilmente o fundo contará com mais de 50% deste valor.
Não se espera grandes conseqüências desta reunião e os governos de alguns países em desenvolvimento como o Brasil, Índia e África do Sul, normalmente convidados a participar de parte dela estavam analisando se valia a pena comparecer. Acabaram decidindo por ir e colocar suas visões sobre o temário diretamente.
Conferência da FAO
Depois de três dias de debates, representantes de mais de 180 países que participaram da conferência da FAO – órgão da ONU para alimentação e agricultura – em Roma, chegaram em 5 de junho a um acordo sobre o texto final da conferência.
O documento pede uma “ação urgente” contra a crise dos aumentos de preços dos alimentos e diz que a comida não deve ser usada como “uma arma” política ou econômica. O encontro também reafirmou as metas da ONU de reduzir pela metade a fome no mundo até 2015.
A divulgação do texto final foi adiada por várias horas devido a desentendimentos que se intensificaram no último dia de negociações. Antes da entrevista coletiva que encerrou o encontro, alguns países que tinham ressalvas ao acordo se manifestaram.
O resultado da conferência foi apenas “um pouco mais do mesmo”, pois não conseguiu aprovar nada que não fossem intenções genéricas. Aliás, há quem ironize que é melhor parar de realizar as conferências da FAO antes que se abandone a idéia da erradicação da fome no mundo porque cada uma delas aprova um compromisso mais distante para atingir este objetivo.
Destacou-se o discurso do Presidente Lula na abertura do evento. Ele defendeu os biocombustíveis e denunciou os “lobbies” pró-petróleo. Segundo ele, estariam por trás da oposição ao etanol e da acusação de que este seria responsável pela alta dos preços dos alimentos quando, na verdade, é a própria subida do preço do petróleo que contribui para que tudo se torne mais caro, por ser a fonte de energia e de insumos de praticamente toda atividade econômica. (Leia o discurso na íntegra em: www.mre.gov.br). Leia mais em: www.bbc.co.uk.
Comitê Internacional do Fórum Social Mundial ampliou prazos
Com o objetivo de garantir maior participação dos movimentos sociais e organizações na construção dos objetivos do Fórum Social Mundial 2009, o Comitê Organizador de Belém e a Comissão de Metodologia do Conselho Internacional decidiram ampliar o período de recebimento das contribuições para o dia 25 de Junho.
Os nove objetivos anteriormente listados para o FSM 2007 em Nairobi e agora submetidos à consulta para 2009 são:
1.Pela construção de um mundo de paz, justiça, ética e respeito pelas espiritualidades diversas, livre de armas, especialmente as nucleares;
2.Pela libertação do mundo do domínio das multinacionais, do capital financeiro, da dominação imperialista e de sistemas desiguais de comércio;
3.Pelo acesso universal e sustentável aos bens comuns da humanidade e da natureza, pela preservação de nosso planeta e seus recursos, especialmente da água e das florestas;
4.Pela democratização do conhecimento e da informação e pela criação de um sistema compartilhado de conhecimento com o desmantelamento dos Direitos de Propriedade Intelectual;
5.Pela dignidade, diversidade, garantia da igualdade de gênero e raça e eliminação de todas as formas de discriminação e castas (discriminação baseada na descendência);
6.Pela garantia (ao longo da vida de todas as pessoas) dos direitos econômicos, sociais, humanos, culturais e ambientais, especialmente os direitos à alimentação, saúde, educação, habitação, emprego e trabalho digno;
7.Pela construção de uma ordem mundial baseada na soberania, na autodeterminação e nos direitos dos povos;
8.Pela construção de uma economia centrada nos povos e na sustentabilidade;
9.Pela construção e ampliação de estruturas políticas realmente democráticas e instituições com a participação da população nas decisões e controle dos assuntos e recursos públicos.
O Fórum, pela primeira vez, realizado na região amazônica poderá trazer uma contribuição muito importante, especialmente, para as questões ambientais que são muito sensíveis e importantes nesta região.