Observatório Nacional de Juventude: a evolução das políticas públicas
Conhecer os novos desafios da condição juvenil na sociedade contemporânea é essencial para fortalecer a Política Nacional de Juventude como uma política pública de Estado.
As políticas públicas de juventude no Brasil avançaram muito em pouco tempo. A formulação, nos últimos anos, de sínteses teóricas e políticas permitiram a constituição de consensos importantes que fizeram o Estado brasileiro descruzar os braços.
Conhecer os novos desafios da condição juvenil na sociedade contemporânea é essencial para fortalecer a Política Nacional de Juventude como uma política pública de Estado.
As políticas públicas de juventude no Brasil avançaram muito em pouco tempo. A formulação, nos últimos anos, de sínteses teóricas e políticas permitiram a constituição de consensos importantes que fizeram o Estado brasileiro descruzar os braços.
Até a década de 90, pode-se dizer que a preocupação dos atores políticos não saía do plano da atenção aos “problemas sociais” relacionados aos jovens, não resultando numa tentativa de realizar um entendimento mais aprofundado deste setor, nem na formulação de políticas específicas.
O reconhecimento dos jovens como “sujeitos de direitos” foi um avanço fundamental para superar a visão antes predominante nas ações governamentais. Vale um destaque especial para o papel cumprido pelo Projeto Juventude que aproveitou a janela de oportunidade aberta pelo Presidente Lula para inserção do tema na agenda de decisão do Governo Federal e organizou um amplo processo de debate envolvendo os principais atores políticos e especialistas, culminando na formulação das bases para uma Política Nacional de Juventude.
Resultantes daquele momento e dos processos que o caracterizaram, foram criadas novas estruturas institucionais com responsabilidade específicas sobre o tema.
A Secretaria Nacional de Juventude passou a existir como órgão articulador, para integrar todas as ações que os ministérios desenvolviam tendo os jovens como foco. Durante os últimos três anos, o governo vem implementando e aprimorando serviços, programas, projetos e ações em diferentes ministérios, já sob a égide da transversalidade do tema, conceito consagrado nos processos que pactuaram os consensos mencionados anteriormente.
O Conselho Nacional de Juventude é o canal permanente de diálogo entre o poder público e a sociedade civil sobre as questões juvenis; é justamente o espaço de controle democrático das políticas públicas.
Com a experiência acumulada, o Governo Federal está implementando para os próximos anos o PROJOVEM Integrado – que unificou seis programas existentes (Agente Jovem, Saberes da Terra, Consórcio Social da Juventude, Juventude Cidadã e Escola de Fábrica e Projovem) visando racionalizar as ações e recursos, elevando o potencial e a capacidade de atendimento. O salto é expressivo: esses seis programas federais atendiam, juntos, 467 mil jovens; com o novo programa serão atendidos 4,2 milhões, até 2010.
O Governo Federal avalia que esse conjunto de ações vem tendo um impacto positivo na vida de milhares de jovens em todo o país. Avalia também, por outro lado, que ainda há muito a se avançar, sendo necessário dar um salto na escala de atendimento, otimizar recursos, aumentar a eficácia dos serviços, reforçar a integração das ações entre os ministérios e criar novos programas e ações.
A perspectiva é consolidar a Política Nacional de Juventude como uma política de Estado, incidindo com mais força na agenda pública e, portanto, inserida definitivamente no contexto de um projeto de país.
Esta política nacional está só começando. É importante reconhecer que as políticas públicas de juventude não estão, em nenhum nível de governo, prontas e acabadas. Elas precisam de avaliação e aperfeiçoamento constantes e permanentes.
A idéia, conceitualmente superada, de que os jovens são um “problema” e devem ser tutelados por políticas de controle e prevenção continua viva em programas e projetos, sejam eles governamentais ou não. Esse tipo de abordagem conservadora coexiste atualmente com a noção emancipatória de que os jovens são sujeitos de direitos. Além disso, o interesse pela juventude ainda convive com o desconhecimento e o descaso.
Sabemos que grande parte dos meios de comunicação de massa cumpre um papel importante em pautar na agenda política, sem contestação, visões estereotipadas e estigmatizadas sobre os jovens. Para alcançar novos avanços e evitar retrocessos, não há outra fórmula: participação e conhecimento.
Contudo o atual desenho institucional, em que pese seu caráter de política em construção, aprofundou-se já em algumas trilhas interessantes: além da Secretaria, do Conselho e da integração dos programas, a Conferência Nacional de Juventude, a partir do sucesso da primeira edição convocada e organizada pelo Executivo, consolidou-se como a máxima instância de participação, sendo o instrumento para partilhar deliberações, facilitar o processo de negociação entre interesses divergentes e um espaço privilegiado de controle social das ações desenvolvidas pelo Governo.
Para além, um novo instrumento que aqui se propõe como indispensável ao desenvolvimento dessa política nacional de juventude é um centro de produção e sistematização de conhecimento acerca desse segmento populacional, o que ora chamamos Observatório Nacional de Juventude. Porque a produção e a disseminação de conhecimento sobre a realidade da juventude brasileira será fundamental para o fortalecimento da política pública. Definir novas áreas de atuação e avaliar as ações atuais é a base para definição do que é mais urgente e importante a ser feito.
As formulações atuais precisam ser aprofundadas ou mesmo questionadas, possibilitando a capacidade de criar um ciclo permanente de debates através da circulação permanente de informação de alta credibilidade.
Afinal de contas, as soluções oferecidas pela política pública são formuladas a partir de como determinados problemas são estruturados e reconhecidos pelas autoridades públicas.
Aprofundando esta questão na literatura das ciências políticas destacam-se dois modelos sobre a definição da agenda governamental: o modelo de Múltiplos Fluxos desenvolvido por John Kingdon (2003) e o modelo de Equilíbrio Pontuado, de Frank Baumgartner e Brian Jones (1993). Ambos buscam responder as razões que levam alguns problemas a se tornarem importantes para um governo e transformarem-se em políticas públicas.
Para o modelo de Equilíbrio Pontuado os processos das políticas públicas se caracterizam por períodos de equilíbrio que são pontuados por períodos de mudança. Esta aconteceria quando um problema vence o “monopólio da política”, no qual uma situação é tratada somente dentro das comunidades técnicas, grupos de poder e subsistemas políticos (conselhos, grupos de trabalho), restringindo o surgimento e a difusão de novas idéias, propostas ou atores numa condição de realimentação negativa (GOMIDE, 2008).
Assim, para que um problema chame a atenção do governo e da classe política, rompendo a situação de equilíbrio, é necessária a construção de um novo entendimento ou de uma nova imagem pública por meio de informações empíricas ou apelos emotivos, permitindo que o problema seja comunicado de forma simples e direta para seu acesso à agenda de decisão (TRUE, 2007). Portanto, a política publica efetiva-se na medida em que são criados mecanismos de superação da inércia conceitual, levando sempre novas questões a agenda de decisão.
No modelo de Múltiplos Fluxos de Kingdon as políticas públicas seriam formadas por quatros processos sucessivos: o estabelecimento de uma agenda; a consideração das alternativas objetivas de solução; a escolha dominante entre as soluções possíveis; e por último a implementação da decisão (CAPELLA, 2005).
Para Kingdon a agenda das políticas públicas se forma ou modifica quando há uma convergência entre três fluxos decisórios: os problemas; soluções ou alternativas; e a política. Segundo o modelo, o reconhecimento de um problema pode se dar em função de: a) uma crise, evento dramático ou símbolo; b) um indicador, pois tanto a magnitude de um dado como sua mudança chama a atenção das autoridades; e c) acumulação de informações e experiências da execução das políticas existentes, cuja prática proporciona o relevo de novos problemas.
Quando indicadores (taxa de gravidez precoce, custo de um programa, evolução da evasão escolar, nível de desemprego juvenil) são reunidos contribuem para evidenciar um problema ou situação que merece a atenção das autoridades e da sociedade.
O outro modo está na busca por feedbacks sobre programas em desenvolvimento pelo governo. O monitoramento dos gastos, o acompanhamento das atividades de implementação, o cumprimento (ou não) de metas, possíveis reclamações dos usuários e o surgimento de conseqüências não-atencipadas são mecanismos que podem trazer os problemas para o centro das atenções dos formuladores de políticas e das decisões.
Do ponto vista da estratégia política, a criação de órgão especializado na produção de diagnósticos e na geração de conhecimento é indispensável para a atual Política Nacional de Juventude. A forma como os problemas são definidos, articulados, concentrados a atenção ou o foco, pode determinar o sucesso de uma política pública reforçando uma percepção preexistente ou a desconstruindo. Dessa forma, constroem-se as opções de soluções e alternativas objetivas.
Quatro idéias centrais deverão nortear a constituição do Observatório:
Primeiro, um órgão institucional com responsabilidade de gerar conhecimentos deve ter autonomia, pluralidade técnica e credibilidade acadêmica para que tenha condições de produzir analises e avaliações prospectivas sobre os assuntos e questões relevantes que envolvem a juventude brasileira e as políticas públicas.
Segundo, este órgão deve atuar em cooperação permanente com outras instituições governamentais (IBGE, IPEA, INEP, DATASUS, universidades), organismos internacionais, ONG’s e pesquisadores independentes, formando uma ampla rede de interação e aprofundamento de reflexões que auxiliem as decisões da Secretaria Nacional de Juventude e do CONJUVE.
Terceiro, o Observatório Nacional de Juventude deve ter autonomia financeira e independência acadêmica, sendo capaz de formar uma comunidade geradora de alternativas às políticas públicas de juventude composta por especialistas, pesquisadores, assessores do executivo e legislativo, servidores públicos, analistas pertencentes a grupos de interesses, entre grupos que compartilham uma preocupação em relação ao tema, e principalmente, sendo capaz de abrigar pontos de vista bastante diversos entre si.
Quarto, ser subordinado hierarquicamente à Secretaria Nacional de Juventude, tendo o seu corpo de coordenadores aprovados pelo Conselho Nacional de Juventude e com condições de atuar sem ingerência ou restrições políticas e acadêmicas na produção de estudos, mas considerando que é um espaço de produção de insumos para as políticas públicas pautados por critérios de viabilidade técnica, financeira (custos toleráveis) e política (aceitação pública).
Por fim, o Observatório Nacional de Juventude, o CONJUVE, a Conferência Nacional e a Secretaria Nacional de Juventude deverão ser os alicerces no qual se sustentará e dinamizará as políticas públicas de juventude em que as idéias ascendam à pauta de decisão governamental e se consolidem na agenda nacional. O que está em jogo não é pouca coisa: é o presente e o futuro de toda uma geração.
*Edson Pistori e Carlos Odas são assessores da Secretaria Nacional de Juventude.