“Refundação”, “valores republicanos” e “revolução democrática” são as mais destacadas contribuições da tese “Mensagem ao Partido”. A “refundação” provocou tanta celeuma, que foi excluída da versão final da “Mensagem”. Os “valores republicanos” não provocaram igual celeuma, mas tampouco viraram sucesso de crítica e público. Já a “revolução democrática” emplacou.

Presente em resoluções anteriores do PT e figurante em mais de uma tese, a “revolução democrática” parece agradar quase todos os gostos: radical o suficiente (“revolução”), mas sem perder a ternura (“democrática”) jamais.

Por trás do que muitas vezes é tratado como slogan, existe uma visão acerca de qual deve ser a estratégia do PT. Visão que busca solucionar um problema anunciado, mas não resolvido, por outra tese: como combinar um programa de desenvolvimento do capitalismo com uma estratégia socialista, sem cair na social-democracia?

A tese “Construindo um Novo Brasil” apresentou assim o problema: “temos de criar o mercado interno que, com a integração da América do Sul, dê dinamismo ao capitalismo brasileiro e promova outro tipo de reforma. A partir daí poderão surgir outros temas em discussão, aparentemente proibidos hoje, como a propriedade social e o caráter da empresa privada. Cria-se uma perspectiva socialista, e não só de reformas dentro do capitalismo”.

A “Mensagem” tenta apresentar uma solução para estas questões. Neste particular, ambas as teses partem da mesma problemática. E não se diferenciam muito na “solucionática”.

Segundo a “Mensagem”, o segundo governo Lula teria o “potencial” de “começar a efetivar mais plenamente a revolução democrática no Brasil”. Ou seja: a revolução democrática seria um processo real, que já estaria em curso, cabendo efetivá-lo “mais plenamente”.

Este padrão de análise era muito comum na esquerda dos anos 1960: considerar que estaria em curso um processo objetivo chamado de “revolução brasileira”, cabendo à esquerda dirigi-lo. Aquela abordagem confundia as mudanças sociais profundas, causadas pelo processo de desenvolvimento capitalista ocorrido no Brasil, com um processo revolucionário. Esta confusão era motivada, em alguns casos, pelo duplo sentido do termo “revolução”.

Geralmente consideramos “revolução” um processo de curta duração e eminentemente político, no qual o poder passa de uma classe social para outra. Mas o termo “revolução” pode designar, também, um processo de longa duração, no qual a sociedade se transforma profundamente, mas sem que as classes dominantes sejam substituídas abruptamente do (ou ameaçadas de perder o) poder político.

Os dois processos podem estar presentes e vinculados no processo histórico de cada país. Longos períodos de “revolução no sentido amplo” preparam curtos períodos de “revolução no sentido estrito” da palavra, que por sua vez abrem novos períodos de “revolução no sentido amplo”.

Nos anos 1960, a confusão entre os dois sentidos do termo “revolução”
ajudava a radicalizar muitas pessoas. Hoje pode ocorrer o contrário. Afinal, se o processo “normal” de desenvolvimento é denominado de “revolução”, então a luta por reformas passa a ser enxergada como se tivesse, em si mesma, um conteúdo também revolucionário (no sentido estrito do termo).

Noutras palavras, algumas pessoas começam a achar que a luta por reformas democráticas é capaz de resolver o problema que, na história, só as revoluções no sentido estrito conseguiram resolver: transferir o poder de uma classe social para outra. Erro cometido pela “Mensagem”.

*Artigo enviado em 15 de maio de 2007
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