Valter Pomar
A reafirmação do socialismo como objetivo estratégico do PT só ganha sentido prático se for plasmada numa estratégia de poder e num programa de reformas que aponte para a superação prática das relações capitalistas realmente existentes em nosso país.
Trata-se de alterar o padrão/modelo de desenvolvimento vigente há décadas no país (orientado ao lucro, externamente dependente, pró-monopolista e latifundiário, antidemocrático), construindo no seu lugar um novo padrão de desenvolvimento, em que o crescimento econômico se articule com democracia, superação da dependência e da desigualdade.
É preciso recordar que o desenvolvimento capitalista em nosso continente, inclusive onde assumiu formas mais avançadas, sempre esteve acompanhado da ampliação da desigualdade, da dependência externa e da falta de democracia política.
Se nosso objetivo é superar o neoliberalismo, mas sem voltar aos limites do desenvolvimentismo conservador e do populismo, então teremos então que enfrentar vários desafios.
O primeiro deles é lutar pela democratização profunda de nossas sociedades. Isto significa muito mais do que eleições periódicas. O sistema político existente na maioria dos países de nosso continente segue produzindo enormes distorções, suscetível a todo tipo de manipulação por parte da burguesia e dos partidos conservadores. O controle social sobre a atividade política e estatal é extremamente reduzido. Para a maioria da população, sobra apenas eleger periodicamente seus “representantes”. Os meios de comunicação, geralmente estão em mãos de monopólios privados, interferem de maneira descarada em prejuízo da democracia.
O segundo desafio é ampliar o alcance e a qualidade das políticas sociais públicas, inclusive criando novos direitos sociais. Antes da onda neoliberal, a cobertura do Estado em áreas como saúde e educação já era bastante reduzida. O neoliberalismo piorou ainda mais a situação, fazendo com que vários destes serviços fossem acessíveis apenas através do mercado.
Estamos diante do desafio de garantir, além do direito pleno à saúde, educação e alimentação, outros direitos básicos, como acesso a luz, as telecomunicações, ao saneamento básico, habitação, transporte público, à cultura e ao lazer como direitos universais.
Nosso terceiro desafio consiste na realização de reformas estruturais, que alterem a matriz de nossas sociedades. O latifúndio modernizou-se e segue funcional na lógica do capitalismo brasileiro, cada vez mais agressivo ao meio ambiente e às condições de vida dos trabalhadores rurais. Nas cidades, onde vivem 80% da população brasileira, a violência urbana explode, cresce o apartheid social e são negados os direitos básicos da maioria. A combinação das reformas agrária e urbana deve dar conta de começar a enfrentar estes problemas.
O quarto desafio é a criação de um modelo econômico alternativo, que combine capacidade de crescimento, inovação, geração de emprego e renda, redistribuição de ingresso e riqueza. Estes objetivos, no atual estágio da economia internacional e nos marcos da correlação de forças vigente, exigem um trabalho em escala continental.
O quinto desafio é o de combinar a soberania nacional com a cooperação entre os distintos povos e países que abracem este projeto de integração continental. Desafio ainda maior se recordarmos que cada um de nossos países possui histórias particulares e correlações de força específicas, que correspondem a estratégias e programas também diferenciados.