O PT não surgiu por acaso (de Zumbi dos Palmares à Revolução de 1930)

Há um fio condutor entre a luta de índios e negros no Brasil Colônia e a luta atual dos trabalhadores brasileiros, urbanos e rurais, contra opressão e a exploração do capitalismo desta etapa. De fato, há uma identidade entre a valentia e o heroísmo de Zumbi dos Palmares, no século XVII, o idealismo ingênuo de Tiradentes e dos Inconfidentes, o carisma e a capacidade mobilizadora de Antonio Conselheiro (cem anos depois) e o papel que o PT e Lula desempenham em tempos e espaços atuais.

Ao longo destes 500 anos não foram poucos os movimentos, reunindo excluídos e explorados, que se moviam exercitando sua independência de classe. Quanto mais independentes eram, ou se tornaram no curso das lutas, os movimentos de massas – mesmo aqueles que surgiram sob a direção de elites locais com arroubos regionalistas -, mais cruel e impiedosa, foi a ação repressiva. Isso ocorreu na repressão aos quilombos, na Cabanagem (Pará), em 1835, no Levante Malê, em 1825, e em Canudos, em 1896, para citar alguns exemplos.

A repressão das classes dominantes foi ganhando formas diferenciadas, até chegar à sofisticação contemporânea da grande mídia, que busca massacrar diariamente os que representam a ideologia e os objetivos históricos da classe trabalhadora, sem que, por isso, as elites tenham jamais renunciado aos mais atrozes métodos de repressão contra trabalhadores grevistas, movimentos de sem-teto, sem-emprego, sem-terra etc.

Esse longo processo de aprendizado da classe trabalhadora foi-se concentrando e se desenvolvendo a partir do fim da escravidão e do surgimento de um capitalismo nativo, com o simultâneo crescimento das cidades e da concentração da mão-de-obra negra nos grandes centros urbanos. A chegada da mão-de-obra estrangeira, especialmente os operários especializados vindos da Europa, semeou doutrinas de esquerda ainda pouco conhecidas entre os brasileiros, especialmente a anarquista e a anarco-sindicalista.

A concentração populacional majoritária no meio rural era um elemento dificultador, mesmo porque o alcance dos meios de comunicação era incomparavelmente menor em relação à realidade atual. Além do que, a experiência política e a vivência cultural do campesinato na metade inicial do século passado eram bastante rudimentares. O coronelismo reinava absoluto no campo.

Ao final do século XIX, surgem os primeiros sindicatos e as primeiras greves hegemonizadas pelo anarquismo. Isso rebate positivamente na intelectualidade e na camada de jovens oficiais militares nos anos 20. A Semana da Arte Moderna (1922), à fundação do Partido Comunista Brasileiro (1922) e o levante cívico-militar de 1924 que deu origem à Coluna Prestes era o prenúncio cultural e político da Revolução de 30.

1930 poderia ser considerado o marco da “revolução burguesa no Brasil” não fossem dois aspectos, um de caráter objetivo e, outro, subjetivo, que se entrelaçam: primeiro, não foi feita a reforma agrária e, segundo, a esquerda de origem tenentista não se propôs a dirigir o levante popular contra Washington Luis e sua base de sustentação apoiada no esquema de rodízio oligárquico do poder, chamado “café com leite”, que vivia aguda crise face à depressão econômica mundial de 1929.

Independentemente disso, a Revolução de 30 teve um caráter nacional e popular, inclusive com a tomada do poder local pelo povo em algumas regiões do país, à revelia da repactuação entre as elites que se forjava às costas dos anseios populares.

*Artigo enviado em 26 de fevereiro de 2007
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