No PT, Lula fala de seu novo governo
Presente à abertura da reunião do Diretório Nacional do PT no sábado, 25/11, o presidente Lula expôs em seu discurso a importância do segundo turno das eleições, que possibilitou o debate político e o retorno ao debate e à campanha daqueles que haviam se afastado.
Presente à abertura da reunião do Diretório Nacional do PT no sábado, 25/11, o presidente Lula expôs em seu discurso a importância do segundo turno das eleições, que possibilitou o debate político e o retorno ao debate e à campanha daqueles que haviam se afastado. Lula apontou os principais eixos de seu novo governo e os desafios a serem enfrentados, tanto no campo econômico/social como no político. Leia a íntegra do discurso de Lula.
“Quero cumprimentar meus queridos companheiros,
Companheiros governadores eleitos, companheiros dirigentes do partido, lideres no Senado e na Câmara, todos os membros do diretório e deputados federais eleitos;
Quero cumprimentar os companheiros dos movimentos sociais, que tanto ajudaram a gente, cumprimentar os ministros que estão aqui, a Dilma Roussef (Minas e Energia), Valdir Pires (Defesa), Guido Mantega (Fazenda). Eu estava dizendo que o Guido é o economista mais popular que esse país já teve, com a camisa para fora das calças. Nelson Machado (Previdência), Luiz Marinho (Trabalho), o nosso embaixador Tilden Santiago (Cuba).
Queria dizer para vocês da alegria de estar aqui, nesta reunião do Diretório Nacional, e poder conversar um pouco com vocês sobre o nosso futuro.
Não vamos falar do passado, porque todo mundo já sabe o que aconteceu nesses primeiros quatro anos de mandato. Todo mundo já sabe da dificuldade que enfrentamos. Todo mundo já tem dimensão da guerra que foi feita contra o governo. Todo mundo sabe que nós precisamos no 2º mandato, tentar evitar que estas coisas se repitam.
É por isso que eu quero falar do futuro. Um futuro em que eu assumo a Presidência da República com um conjunto extraordinário de governadores, espalhados pelo Brasil inteiro, da base de sustentação do governo. Ou companheiros que trabalharam juntos conosco no 2º turno.
Eu assumo o 2º mandato como presidente da República com a certeza e a convicção de que, não sei em quantos momentos da nossa história o povo formou a sua própria opinião. No 2º turno, embora tenha sido trabalhoso, embora eu quisesse descansar, quando terminou o 1º turno, o povo, na sua sabedoria, permitiu que houvesse o 2º turno.
Hoje, digo sempre, que agradeço a Deus que houve o 2º turno, porque pôde deixar as coisas mais claras para sociedade brasileira. O retorno de muita gente que estava insatisfeita e descontente, que estava magoada e sentida. E uma volta, eu diria, estupenda, de dezenas e centenas de companheiros, que fazia muito tempo que a gente não via. De repente, essas pessoas resolveram desfraldar as suas bandeiras, as suas camisetas e vir para a rua, que o momento era aquele.
Quem participou da campanha do 2º. turno, percebe, claramente, que houve duas campanhas. No primeiro turno, era uma campanha em que a gente ia às manifestações e era um negócio morno, porque as pessoas estavam naquela de que já ganhou. Mas no 2º. turno, quando o pessoal se deu conta de que os adversários estavam vivos, de que os adversários não eram falsos candidatos, o povo resolveu assumir a sua responsabilidade histórica. Colhemos o resultado, que eu diria, marcante para a vida deste país e para nossa futura administração. Tenho certeza que, hoje, o cenário político é bem diferente do cenário que nós tínhamos antes de ganhar as eleições. O 2º. turno permitiu, – e o Tarso tem trabalhado comigo nas conversas com os partidos políticos -, permitiu que a gente pudesse trazer para vocês, aqui, quase que a certeza que teremos um outro clima político no Brasil dentro do próprio Congresso Nacional. Eu estou convencido disso, meus queridos amigos deputado Arlindo Chinaglia (líder do governo na Câmara) e senadora Ideli Salvatti (líder do PT no Senado), de que nós poderemos construir um outro clima, e ele está sendo construído.
Um segundo governo aumenta a nossa responsabilidade, porque nós tomaremos posse no dia 1º. de janeiro e não vamos poder mais nos comparar com o governo passado. Nós, agora, vamos ter que nos comparar conosco mesmos, e não ficar citando dados de comparação com outro governo. Se bem que nós ainda temos quatro anos para chegar aos oito deles, mas como em quatro nós já batemos os oito deles, nós temos agora que nos comparar e começar a descobrir o que fazer.
Eu tenho dito, publicamente, que participei e participarei mais diretamente das conversas políticas. Eu penso que, o fato de eu ser presidente da República não impede que eu tenha que participar, senão de todas as reuniões, mas de várias reuniões do Diretório do PT, de me reunir com a Comissão Política do PT, do PCdoB, do PSB, e dos outros partidos que sustentam a aliança política. Nós temos que fazer conversas sistemáticas para que a gente não se procure apenas em época de crise. Não tem nada pior… Quando a gente vai na porta de fábrica, apenas em época de campanha, entregar panfletos, o peão grita pra gente “agora, né, agora precisa, vem”. Nós precisamos transformar essa relação política numa atividade do nosso cotidiano. A gente não pode esperar acontecer uma desgraça para a gente procurar os partidos políticos. Podemos sistematizar isso direitinho para que a gente tenha uma relação mais respeitosa, uma relação institucional, uma relação mais de companheiros. E construir esse companheirismo na diversidade que é o resultado eleitoral do país.
Se tem uma coisa que nós, quando olhamos os números, ficamos chateados, porque não elegemos mais pessoas, é o fato de que o povo, na sua sabedoria, permite que o Congresso seja a cara da sociedade que está espalhada nas ruas no dia da eleição. Podemos reclamar que perdemos uma eleição aqui, que perdemos ali, mas o dado concreto é que o Congresso Nacional que tomará posse no dia 1º será a cara do povo brasileiro no dia da eleição. Portanto, nós temos que estabelecer com esse Congresso a melhor relação possível. E eu, diretamente, junto com meu coordenador político, quero participar. Não quero ficar sabendo das coisas pela imprensa e nem quero permitir que as coisas aconteçam sem que eu tenha uma participação mais direta.
Quero olhar com muito carinho tudo aquilo que nós fizemos que não deu certo, e não fazer mais. Corrigir os nossos defeitos e aprimorar as coisas que deram certo, pois muitas coisas precisam ser aprimoradas. Vocês têm acompanhado pela imprensa, que nos últimos dez dias ou quinze dias, eu tenho trabalhado junto com a Dilma e outros ministros, no sentido de garantir que o país tenha um crescimento mais vigoroso, um crescimento, eu diria, mais ousado, no próximo período. Porque o país está travado há 20 anos. Acho que na primeira parte do meu governo, nós conseguimos criar as condições para darmos o segundo passo. Eu sempre me preocupo quando discuto economia, porque eu acho que nesse assunto, se deixar vazar, muita coisa que a gente discute, não faz. Tem que dizer que vai fazer, no dia que anunciar, porque senão os adversários que não querem que aconteça serão maiores.
O país está travado. Eu tenho utilizado esta palavra sistematicamente. Precisamos encontrar um jeito de destravar o país em todas as áreas. Temos feito reuniões e reuniões de 3 horas e 4 horas. Às vezes, um companheiro ministro diz “olha, presidente, não é preciso participar de toda a reunião, fica um pouco e vai embora”. Mas é importante participar para saber onde é que o carro pega e que nós brigamos muito tempo e tem condições de sair… Tem decisões políticas que vamos ter que tomar e pode descontentar um e outro, mas vamos ter que tomar se quisermos destravar o nosso país. Nós temos consciência de que, desde os anos 80, esse país cresce pouquíssimo. Temos consciência de que o Brasil tem potencial de crescimento, agora, é preciso desamarrar esses nós de marinheiro que deram em um monte de área do pais.
Não estou preocupado, neste instante, em montar governo. Fiz questão de dizer logo para imprensa não ficar falando. Porque todo dia tem um ministério nos jornais. Fiz questão de dizer “eu que vou escolher, não estou sabendo”… Eu não tenho pressa, não vou discutir isso agora.
Primeiro eu quero consolidar a nossa relação com os partidos políticos. Quero consolidar a nossa relação com o movimento social. Estava marcada uma reunião com todo o movimento social, para a terça-feira, mas não vai ser possível, porque vocês não podem. Não querem trabalhar na terça, só eu que quero. Mas, podem ficar certos que a relação será outra com os partidos, com os movimentos sociais, com o movimento sindical, e com as entidades da sociedade civil espalhadas por esse mundo afora.
Se juntarmos esforços, poderemos destravar o país e fazer a economia crescer. Não podemos nos contentar com o crescimento de 3,5% ou 4%, com o Bolsa Família, com o Luz para Todos ou o trabalho com os quilombolas… Precisamos fazer muito mais. Agora não temos mais desculpa, porque todo mundo já sabe um pouco mais do que quando nós entramos. Todo mundo já está mais preparado, já está mais calejado. Estamos fazendo um levantamento para saber a dimensão da União nos Estados, coisa que não temos a exata dimensão de uma máquina poderosa como essa.
Até essa discussão se vai ter mais PT, ou menos PT, se vai ter mais PMDB ou menos PMDB… Esse é um problema que a gente vai discutir no momento em que precisar discutir. A gente não pode aceitar que essas divergências, que alguém coloca na nossa boca, a gente passa a respondê-las. Eu todo dia vejo ministro sair, vejo ministro entrar, partido vai ter tanto… Tenho feito reunião com as bancadas, e tenho dito, “por favor, só deixem o líder falar com a imprensa, porque se só um falar a chance da gente errar é muito menor”.
Nós, o conjunto do governo, estamos convencidos, hoje, que as condições estão dadas e que nós podemos fazer um pouco mais. Para fazer um pouco mais, o Guido tem trabalhado mais que o normal. Eu tenho dado muitas tarefas aos companheiros Guido, Paulo Bernardo e Dilma, e outros ministros. Se nós provamos no primeiro governo que era possível a gente manter a responsabilidade fiscal, manter uma economia séria, com as dificuldades que a gente tinha, e fizemos a política social que fizemos, é possível crescer um pouco mais e fazer mais política social.
Por isso, nós criamos a idéia de que o desenvolvimento é a distribuição de renda e a educação de qualidade. Isso vai acontecer. Pode estar certo de que nós vamos fazer o que estiver ao nosso alcance, mudar o que tiver que mudar, brigar com quem tiver que brigar, para que possamos fazer jus à renovação da confiança que o povo brasileiro nos deu no dia 29 de outubro.
Não haverá adversidade que não possa ser superada. Não haverá dificuldade que a gente não possa tentar resolver com uma boa conversa, com uma boa reunião. A disposição é total. Sem querer evitar que tenha oposição, porque a oposição é importante para a democracia. Vocês viram que essa semana foi aprovado, no Congresso Nacional, o 13º salário para o Bolsa Família. Quando a coisa é feita de forma ridícula como foi feito isso, ninguém precisa brigar, porque eles sabem que aquilo foi de uma grosseria tão grande, que a própria imprensa fez o papel que tinha que fazer: mostrar o quanto as pessoas agem de forma pequena com coisas grandes. Obviamente, que nós temos consciência de que essa adversidades vão acontecer, mas vamos tentar diminuí-las ao máximo.
Nós não temos mais como deixar os Estados e municípios travados como eles estão. O Estado do RS, e eu estou vendo o Raul aqui na minha frente, e hoje o Estado é de uma situação extremamente delicada. Capacidade de investimento zero. É preciso pensar o que temos que fazer, qual política vamos adotar para não permitir que um Estado como o Rio Grande do Sul seja vítima de uma situação tão delicada. Estamos pensando nos outros Estados. Eu tenho conversado com outros governadores e prefeitos, cuja capacidade de investimento é praticamente zero, e uma boa parte vai chegar no final do ano sem ter o dinheiro para pagar o 13º. salário. Ou seja, se nós não destravarmos isso, como vamos crescer?
Este é um desafio que está colocado para o governo hoje, não é para janeiro, não. Nós precisamos anunciar essas coisas que vamos fazer, antes de tomar posse, já com os problemas de 2007 e não de 2006. Hoje, são raros os municípios brasileiros que têm a capacidade de fazer investimento em saneamento básico. Mesmo alguns que poderiam fazer, não conseguem o dinheiro emprestado, porque não tem condições de endividamento. É um país que está assim, desde 1980, com a economia travada e, agora, está travada muito mais. No governo passado foi mais fácil, porque venderam 100 bilhões de patrimônio público, todo mundo pensava que ia consertar e não consertou.
Porque eu digo que nós poderemos destravar? (O Guido me olha com uma cara preocupada, ali, nervosa…) É porque, hoje, nós não temos o FMI dando palpite na nossa economia; a nossa divida pública externa é menor do que as nossas reservas; os economistas podem dizer quanto tempo, nesse país, a gente não teve reservas maiores do que a dívida pública. Hoje, até o problema de câmbio que nós vivemos, é por conta da quantidade enorme de reservas que nós temos.
Mas queremos mais. Então, quando eu digo “destravar a economia” é a gente ter coragem de fazer o que é preciso fazer, sabendo que determinadas medidas na economia criam atrito na sociedade. Mas nós temos a responsabilidade no país com o povo que nos elegeu, para fazer o que tiver que ser feito. Esse país não continuará travado, em tudo que é o travamento do país, hoje. Que vai, desde a economia, até uma certa burocracia instituída em 118 anos de República, que vai se aperfeiçoando cada vez mais. Isso é um desafio.
O segundo desafio é a relação política com o Congresso Nacional. O Arlindo já tem experiência. Todo mundo, aqui, na mesa, já tem experiência. Nós somos acusados, muitas vezes, no Congresso Nacional, de não conversarmos. O Arlindo não conversa com ninguém… eu ouço isso até da nossa bancada, viu, não é só dos de fora, não. Tem que ser feito. Eu posso dizer para vocês que vou conversar com todos os segmentos empresariais. Todos nós, sem distinção, vamos conversar com todos segmentos empresariais, dos trabalhadores e da sociedade. O governo vai estar muito mais próximo da sociedade. O Manuel de Serra (Contag) pode mandar para mim todas as pautas de reivindicação que tiver, e vai entregar pessoalmente, porque tudo que eu fizer não vai pagar a ajuda que vocês me deram na campanha.
Vamos continuar o trabalho de integração da América do Sul. Ele está apenas começando. Com a eleição de vários companheiros (Nestor Kirshner [Argentina] vai se reeleger, Hugo Chávez [Venezuela] vai se reeleger, certamente, agora, em 3 de dezembro). A gente vai poder construir, claramente, a Comunidade Sul-Americana de Nações. Não é uma tarefa fácil. Política internacional é sempre muito complicada, porque cada Estado tem seus problemas, mas nós vamos continuar trabalhando. Vamos continuar com uma política internacional forte. Vamos continuar visitando a África. E vamos continuar mostrando que o Brasil pode não ter condições de ajudar muito, mas pode ser um dos porta-vozes, em toda a esfera internacional, para ajudar os países mais pobres do mundo a dar um salto de qualidade. Até porque, não existirá a paz que todos queremos, se a gente não acabar com a miséria que está estabelecida no mundo. O desafio que está colocado para nós, nesse momento, é sabermos que, entre nós, não temos inimigos, temos diferenças. A gente tira essas divergências discutindo. O que nós precisamos é juntar a nossa energia para brigar lá fora. Brigar com quem quiser atrapalhar a gente de construir o nosso projeto e dar a ele a cara que nós planejamos.
Eu vou terminar, Marco Aurélio, dizendo que sou o mais otimista dos brasileiros, e não só porque sou o presidente da República. Eu fico olhando o horizonte e fico conversando com as pessoas. (Vocês devem ter percebido que eu tenho orelhas grandes, porque eu ouço muito, embora eu faça ouvidos de mercador, de vez em quando). Acho que o Brasil está pronto para dar um salto de qualidade.
O PT sabe que sua responsabilidade aumentou nesse período. Sair da encalacrada que nós saímos, nos dá, não liberdade, mas obrigação de sermos muito mais exigentes conosco mesmos. Cobrar muito mais de nós mesmos. N´so precismos nos fiscalizar mais, porque eu sei o sofrimento deste povo mais humilde conosco, que, mesmo assim, não nos abandonou. Então, nós, mesmo com todos os defeitos que o ser humano tem, temos obrigação moral e ética de respeitar este povo. Quando muitos imaginavam que estava tudo perdido, este povo assumiu para si a responsabilidade de ganhar essas eleições.
Eu penso que o PT também aumenta a responsabilidade. Eu vi um exemplo de relação entre os partidos políticos, causado pelo Humberto Costa e pelo companheiro Eduardo Campos (Pernambuco), que eu acho que deve ser um modelo de relação que nós precisamos estabelecer. Todo mundo sabe que nós tivemos problemas no Paraná. Nós não fizemos aliança com o Requião. O Requião procurou o PSDB e também não deu. Nós conversamos com o senador Osmar Dias no meu gabinete e também não deu. No último comício em Curitiba, sem combinar com os companheiros do PT-PR, eu não podia sair de lá sem ter pedido o voto para o Requião, mesmo sabendo que isso poderia causar problemas na minha relação com alguns partidos aliados (o Osmar é do PDT). Agora, vou chamá-los para conversar, para discutir, porque não tem porque não fazer este tipo de relação. Não vai ter pessoas que eu não chame para conversar. Vocês vão ter surpresas, quando virem na televisão que eu estou chamando todo mundo para conversar. Se a pessoa tiver problema contra, que seja, mas que eu vou chamar para conversar, discutir com eles o futuro desse país, mostrar para eles o que queremos fazer. Não dá para a gente passar mais quatro anos nessa coisa maluca, nessa guerra sem fim que nós passamos os primeiros quatro anos.
Eu quero que vocês tenham tranqüilidade. Primeiro, não aceitem essa bobagem de provocação, de que o PT vai ser menor no governo. A verdade é que nós temos 70% dos cargos de confiança que nós não mexemos. Deixamos o cara lá. Essas criticas são feitas exatamente para que a gente fique inibido e deixe eles lá.
Lógico que sabemos que a sociedade brasileira é plural. O governo tem que ser plural. Nós temos que respeitar os funcionários de carreira, porque também não é justo o cara estar 20 a 30 anos, lá, se matando de trabalhar, imaginando um dia crescer na empresa e, depois, entra o governo e coloca gente estranha para trabalhar. Não é justo e temos que ter cuidado com isso e valorizar o funcionário de carreira que tem competência.
Estamos preparados e eu, pelo menos, estou convencido que vamos fazer um segundo governo, que até o PT vai gostar.
Depois, devo dizer a vocês uma coisa, gente. Durante a campanha foram dizer “é, porque não tem vermelho… O Lula tem que sair do PT…” Como é que eu posso sair do PT, se o PT não sai de mim? É uma coisa que está entranhada.
Agora, o PT tem uma dimensão muito grande. Aumentou. Se a Ana Júlia, o Déda, o Jacques Wagner, o Binho, forem atrás de dinheiro como faz o nosso Wellington, não vai sobrar dinheiro para nós fazermos política. Ô baixinho pidão, viu! Esses companheiros vão ajudar de forma extraordinária. Eu tenho alertado que, certamente, alguns deles vão enfrentar muitas dificuldades. O partido tem que estar aberto e despojado para ajudar os companheiros no início. De nossa parte, nós vamos ajudar todos os governadores de todos os partidos que estão tomando posse, que vão ter mais dificuldade. E eles sabem disso, mas eles podem me ajudar muito.
Se antes eram três, agora são cinco. Gente poderosa. Gente muito importante, com a experiência do Wellington, com a pompa do nosso companheiro Jacques Wagner, que conseguiu derrubar uma hegemonia instalada, desde 1964, na Bahia. Que teve um truncamento de dois anos com a entrada do Valdir, mas depois voltaram. A vitória do Wagner foi o fato mais importante da política dessas eleições. Eu sou testemunha de que só ele acreditava. Ele chegava para mim e falava “vou ganhar no primeiro turno”. Na hora de ir embora ele perguntava “você não acredita, né”. Ele ia embora e eu dizia, “eu não acredito”. E ganhou. Como a Bahia é um Estado religioso, acho que o mais religioso do Brasil (com aquela quantidade de igreja que tem), significa que a fé do Wagner valeu. Valeu a “fuerza del pueblo” imbatível.
Bem, companheiros, todas as reuniões que tenho tido com os partidos, agora, eu não tenho discutido ministérios. Até agora, nem com a comissão política do PT, nem com o PMDB, nem com o PL, nem com o PTB. Eu não vou discutir, eu não estou com pressa. Primeiro, eu quero resolver este problema do destravamento do país. O tempo e a energia será colocada toda para resolver isso.
Inclusive, o problema da Previdência. Toda vez que falam da reforma da previdência, eu fico com a orelha em pé. Eu sou daqueles que acham que, a cada vinte anos, a cada geração, a gente precisa rediscutir e deixar pronta para a próxima geração, no mundo todo. O dado concreto é que temos uma situação muito delicada na Previdência Social. Mas, toda vez que se fala em reforma, só se fala em aumentar o limite de idade. Ontem, eu fui na Mercedes Benz, onde há onze mil trabalhadores, e eles me pediram para reduzir a idade. Então, eu falei, “o Nelson Machado não passou por aqui”.
A verdade é que nós deputados, senadores, políticos, incluímos, talvez, a maior política de distribuição de renda deste país, que foi a inclusão dos trabalhadores rurais na previdência social. E eu era deputado constituinte quando nós aprovamos isso. E nós colocamos isso como déficit da previdência, quando isso é déficit do tesouro e não da previdência.
Precisamos discutir. Porque, aí, o estatuto do idoso atrapalha; porque a mulher vive mais que o homem, por isso não pode se aposentar antes. As pessoas querem mexer nas conquistas, sem levar em conta que a discussão é mais profunda. Nós precisamos desafiar os políticos brasileiros, os economistas, os especialistas em previdência social, para podermos discutir claramente como resolver esse negócio da política de seguridade social do país, sem jogar nas costas dos pobres a perda de seus direitos. Esse é o desafio que está colocado para nós.
Enquanto governo, que tem que pagar a folha de pagamento todo mês, nós sabemos que o rombo não pode continuar do jeito que está. Todo mundo sabe que a gente vai se endividando, mas um dia nós vamos ter que pagar. E quando tiver que pagar, a gente não tem recursos para isso.
Não teremos nenhum problema em discutir. Outro dia, por exemplo, fizemos uma grande reunião, porque saiu na imprensa que eu tinha divergência com os ambientalistas. O dado concreto é que pegamos o Ibama, que não tinha sequer funcionário para fiscalizar os parques que a gente transforma em reserva ecológica. A gente faz uma lei e depois não tem quem fiscaliza e a reserva ecológica vai se diluindo. O Guido sabe disso, e a Dilma sabe, que precisamos aparelhar a máquina de pessoas, rápidas, para a gente poder trabalhar. Nós estamos vendo agora esse negócio dos controladores de vôo. Ou seja, a quantidade de tempo em que não se contratou controladores de vôo, que você não tem sequer reserva para cobrir eventuais crises. Nós temos que dar um jeito nesse país.
Por último, eu queria dizer ao companheiro Emir Sader. Eu acho, companheiro, que você (deixa eu ver sua cara… não está preocupado, não…) É bom não ficar preocupado, viu. Eu acho que a sociedade brasileira, por unanimidade, ou na sua grande maioria, não pode aceitar que o cidadão que disse de nós petistas, o que disse, se dê ao luxo de querer castigar um companheiro que ousou defender a sua raça.
Você, certamente, Emir, vai descobrir, agora, que tem mais companheiros do que imaginava que tinha. É na crise que a gente descobre quem é quem. Se houve um tempo na minha vida, Emir, que eu tinha dúvida, de quem era meu amigo, e quem não era, depois da crise, meu caro, eu tenho clareza a que lado eu pertenço, de que lado eu sou e quem é que está comigo em qualquer circunstância. E isso vai acontecer contigo. Você vai ver que maravilha, quanta gente boa vai aparecer para te defender. “Pensei que ele não gostava de mim…” As pessoas boas aparecem nos momentos críticos. É que nem visita de companheiro em hospital. Não tem nada mais gratificante do que receber uma visita quando estamos doentes. Não tem nada mais triste do que a gente ficar deitado numa cama e não aparecer ninguém para visitar a gente. Ou seja, o desprezo é mortal.
Acho que você, nesta campanha, fez um papel extremamente importante. Naquele ato no Canecão, o teu discurso fez o diferencial, para que muita gente na área intelectual voltasse ao seu leito natural e não acreditasse em pororoca. Algumas, a gente tem que trazer de volta ao PT. Não sei se o fato de algumas pessoas terem saído, ou terem ficado chateadas, quem sabe tenha sido um erro nosso. Nós temos que ter humildade de saber, o que deixamos de fazer, que fez com que algumas pessoas deixassem de ver o PT como viam. Nós temos que fazer uma análise para saber se fomos nós que erramos, não tem nenhum problema a gente ir atrás das pessoas e rever o nosso erro. Até porque, para governar esse país, é preciso muita gente. Às vezes, os que estão fora são mais importantes do que os que estão dentro.
E aí, um aviso que eu quero dizer a quem não foi eleito. Por favor, não permitam que o fato de vocês não terem sido eleitos deputado, ou governador, diminua a importância de vocês e façam vocês baixarem a cabeça. Não há nenhuma razão para isso. Eu estou vendo aqui, o Chico Vigilante, a companheira Arlete, o Humberto Costa. Companheiros de valor, que não ganharam. A gente não diminui vocês. Não diminui na relação comigo, não diminui na relação com o governo e, certamente, não diminuirá vocês na sociedade brasileira. Até, porque, a minha vitória se deve, um pouco, aos votinhos que vocês me arrumaram, mesmo perdendo a eleição. Porque a gente só lembra de quem ganha, é assim. Precisamos lembrar dos companheiros que perderam. Às vezes, é eleito deputado com cem mil votos, e a gente não sabe que só foi eleito, porque o que teve trinta somou na legenda para a gente se eleger. Por isso, que eu tenho como o Deda, a idéia de que o deputado não deveria ser dono do seu mandato. É o partido que lhe dá o coeficiente que deveria ser dono.
Companheiros, eu quero agradecer a vocês de coração, a lição que vocês deram a esse país no PED (Processo de Eleições Diretas do PT). Quando o nosso partido foi desafiado num momento critico, em que a desesperança batia na cabeça de muita gente. O PED foi como o médico que chega para fazer o primeiro socorro. Esse partido de forma extraordinária levou 300 mil pessoas a participarem de uma votação interna. Eu cansei de fazer reuniões com políticos que diziam para mim “você tudo bem, você tudo bem, mas o PT acabou, o PT acabou”. E o PT ressurge das eleições tão, ou mais forte, do que era antes das eleições.
Certamente, se não tivéssemos cometidos os erros que foram cometidos, chegaríamos muito mais fortes. Eu estou fazendo esses elogios todos ao meu partido, porque eu sei o que foi governar esse país com os problemas, sei o que foi o primeiro turno e o segundo turno. Acho que esse partido, realmente, se supera em momentos de crises.
Agora, presta atenção numa coisa, é quase um apelo que eu faço a vocês: O PT precisa voltar a ser exemplo nesse país. Eu sou um homem muito aberto, mas eu queria dizer para vocês: nós temos que olhar, quando a gente é governo, essa volúpia de gente que quer entrar no partido. Nós temos que olhar. Provavelmente, que vem junto muita gente boa. Mas junto com gente boa, a gente sabe que pode vir coisas não tão boas. Vamos nos cuidar. A gente precisa ser esse partido que as pessoas olham sabendo que a gente pode errar, porque a gente é humano, mas que em sua maioria é gente valente e pode fazer melhor. Estou convencido que a gente vai fazer mais e vai fazer melhor por esse país.
Muito obrigado, boa sorte e boa reunião.”